Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Democracia aperfeiçoou a publicidade criada na ditadura

O uso da mídia por governos é tão antigo quanto os políticos e os jornais, mas o modelo dessa simbiose mudou. Na ditadura militar (1964-1985), o regime usou fartamente a propaganda para exaltar o “Brasil grande”. Algumas agências de publicidade se agigantaram nos anos 70. Eram as produtoras de peças ufanistas ou revestidas de serviço público, como a do até simpático Sugismundo, desenho animado que ensinava que “povo desenvolvido é povo limpo”. O país não ficou mais higiênico com Sugismundo, mas as agências se deram bem. Os laços entre políticos e publicitários se estreitaram. O livro No Centro do Poder: a trajetória de Petrônio Corrêa, fundador da MPM e o maior articulador da publicidade brasileira, de Regina Augusto, conta um pouco da história.

Os publicitários souberam antever o fim da ditadura e várias agências deram auxílio a Tancredo Neves no processo de criar marcas da Nova República. Desde 1985 houve grande imbricação entre agências e governos e surgiram vários escândalos até o mensalão (2005) envolvendo a administração do PT e o empresário Marcos Valério.

A sofisticação do modelo se consolidou nos 16 anos de FHC e Lula: o que antes eram propagandas de utilidade pública (Sugismundo) se tornaram peças de exaltação quase no estilo “este é um país que vai pra frente” dos militares. FHC usou estatais na propaganda dos oito anos do Plano Real. Lula evoluiu para um acordo tácito com empresas que bancavam comerciais paraestatais. Anúncios com o slogan “sou brasileiro, não desisto nunca” eram pagos por empresários interessados em bajular o Planalto.

Quando a fonte é estatal

FHC e Lula romperam a marca anual de R$ 1 bilhão com propaganda (se forem incluídos gastos de estatais). O petista inovou: aumentou o cadastro dos veículos que podem receber as verbas publicitárias estatais. Quando Lula assumiu, 499 veículos de comunicação estavam habilitados a receber dinheiro de propaganda federal; em 2011 já eram 8.519 veículos.

O PT diz ter democratizado a distribuição das verbas, mas por que o Brasil precisa gastar mais de R$ 1 bilhão em propaganda ao ano? Será que veículos de pequeno porte pelo país afora conseguem se manter independentes quando a fonte de suas receitas é majoritariamente estatal?

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[Fernando Rodrigues, da Folha de S.Paulo]