Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Escândalo na BBC envolve novo diretor do NYTimes

O escândalo na emissora pública britânica BBC sobre alegações de abuso sexual envolvendo o falecido apresentador Jimmy Savile leva a algumas questões inconvenientes para o recém-nomeado diretor-executivo do New York Times, Mark Thompson. A BBC enfrenta inquéritos policiais e parlamentares para apurar se Savile, o excêntrico apresentador do lendário programa de música Top of Pops, da BBC, que morreu no ano passado com 84 anos, abusou sexualmente de um grupo de mulheres e meninas – algumas com apenas 13 anos de idade – ao longo de 60 anos. As investigações são consequência de uma reportagem explosiva divulgada no início deste mês pela ITV, emissora concorrente, sobre as alegações. Ex-executivos da BBC reconheceram que existiam boatos sobre Savile, mas descartaram a hipótese de terem feito vista grossa às indiscrições de celebridades.

No domingo (14/10), o ex-editor-executivo do New York Times Bill Keller escreveu uma coluna fazendo um paralelo entre Savile e o treinador de futebol americano Jerry Sandusky, que foi recentemente condenado a uma pena que equivale à perpétua por abusar sexualmente de crianças. “Caso a BBC tenha decepcionado e perdido a matéria, ou tenha tido a matéria, mas não tenha tido coragem de divulgá-la, trata-se de um constrangimento significativo, aprofundado pela questão dos amplamente divulgados boatos sobre o comportamento de Savile, ignorados por tanto tempo”, escreveu Keller.

Thompson passou a maior parte de sua carreira na BBC, onde entrou como estagiário, em 1979, e participou de programas populares, como Newsnight e Nine O’Clock News, até ser nomeado diretor-geral, posição que é considerada a mais importante na indústria de televisão britânica. O Newsnight, programa que é considerado o mais importante da BBC, estava fazendo no ano passado uma investigação por conta própria das alegações sobre supostos abusos por Savile, mas ela foi cancelada, o que levou a acusações de omissão proposital. A BBC negou que o assunto tivesse sido abandonado para esconder as alegações de abuso sexual. Atualmente, a emissora está investigando o assunto e cooperando com a polícia. Peter Rippon, editor do Newsnight, disse que a investigação sobre Savile foi abandonada depois que os promotores públicos desistiram do caso por falta de provas.

A interferência no programa Newsnight

Um artigo no NYTimes de sábado (13/10) destaca que Thompson estava no comando da BBC quando a investigação pelo programa Newsnight foi cancelada. Thompson, que assumirá o cargo de principal diretor do jornalão no mês que vem, deu a seguinte declaração: “Não tomei conhecimento, nem fui informado sobre a investigação do Newsnight, nem estive envolvido em decisão alguma para que não se completasse ou divulgasse a investigação. Não tenho motivos para por em dúvida a declaração do editor do programa, Peter Rippon, de que a decisão de não dar prosseguimento à investigação foi inteiramente sua e que foi tomada única e exclusivamente por motivos jornalísticos. Durante o tempo em que fui diretor-geral da BBC, nunca ouvi alegações ou recebi queixas sobre Jimmy Savile.” Não há provas que mostrem que Thompson tinha conhecimento da decisão do programa ou do suposto comportamento de Savile.

A BBC é uma organização com 22 mil funcionários em oito canais de televisão, 50 emissoras de rádio e um website bastante abrangente. Durante os anos em que ambos trabalharam na empresa, Thompson estava no setor de notícias e atualidades, e não no de entretenimento, onde Savile trabalhou até se aposentar, em 1994.

Mark Damazer, ex-diretor da Rádio 4 e Rádio 7 da BBC e atualmente diretor do St. Peter’s College, na Universidade de Oxford, não acredita que Thompson tenha interferido com o processo editorial do programa Newsnight. “As possibilidades de que Mark tenha interferido nas decisões do programa Newsnight de divulgar ou não a matéria são precisamente zero”, disse Damazer, colega de Thompson por muito tempo que saiu da BBC em 2010.

O tuíte de Murdoch

Um representante do NYTimes não quis comentar as investigações da BBC, limitando-se a dizer que Thompson “é nosso novo diretor-geral e começa em novembro”. Entretanto, a situação não é a ideal para Thompson ou para o NYTimes, disse Kelly McBride, professor de ética no Instituto Poynter, uma faculdade de jornalismo que se aprofunda no estudo da mídia. “Depende do que ainda vai surgir e de seus possíveis vínculos com o escândalo da BBC”, disse Kelly McBride. Segundo ela, o perigo para o NYTimes é se for o tipo de escândalo que a uma série de revelações, uma sobrepondo-se à outra.

Thompson foi nomeado diretor-geral do NYTimes em agosto, ao final de uma busca de seis meses por um executivo para dirigir a empresa após a demissão inesperada de Janet Robinson, no ano passado. Foi escolhido devido à sua experiência com vídeos e mídia digital, assim como por seu talento em diplomacia administrativa. Enquanto esteve na BBC, Thompson ajudou a desenvolver o iPlayer digital, que permite aos telespectadores acompanharem programas que perderam de forma gratuita. Foi considerado um sucesso entre as pessoas que acompanhavam os Jogos Olímpicos.

Ele foi elogiado por ter conduzido a emissora pública através de problemas éticos, de ataques ao império de mídia de Rupert Murdoch e de ameaças ao seu financiamento pelo governo britânico. O próprio Murdoch, dono da empresa cujo escândalo de grampos clandestinos contou com uma ampla cobertura por parte da BBC e do NYTimes, aproveitou a atual oportunidade para atacar Thompson pelo Twitter. “Procure-se o novo diretor-geral para sacudir o NYTimes a menos que se convoque para explicar o último escândalo na BBC”, tuitou Murdoch. Informações de Jennifer Saba [Reuters, 17/10/12].