Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Comunista puro-sangue pagou caro pelo ‘aggiornamento’

O pai, Valério Konder, médico sanitarista, ingressou no Partido Comunista Brasileiro em 1934 e logo aderiu à Aliança Nacional Libertadora. O nome foi homenagem a Rodolfo Ghioldi, um dos fundadores do PC argentino, amigo e companheiro de Luís Carlos Prestes na malfadada Intentona de 1935. O irmão mais velho, Leandro Konder, importante filósofo marxista, é considerado um dos precursores no Brasil do eurocomunismo, a corrente que seguiu o arco de alianças proposto pelos comunistas italianos e espanhóis.

Primoroso redator, Rodolfo trabalhou na Realidade, Visão, IstoÉ, Estado de S.Paulo e em diversas revistas da Editora Abril. Com o golpe de 1964 foi demitido da Petrobras e obrigado a refugiar-se no exterior. Ao retornar, assumiu o cargo de editor-chefe e apresentador do Jornal da Cultura, da TV Cultura de São Paulo, função que exerceu durante quatro anos sob o comando do amigo Vladimir Herzog, diretor de Jornalismo da emissora. Foram presos em outubro de 1975 e da sua cela no DOI-Codi Rodolfo ouviu os gritos do companheiro torturado e morto.

Libertado graças à comoção produzida pelo assassinato, seus depoimentos foram decisivos para fundamentar a ação movida pela família Herzog que culminou três anos depois na condenação do Estado brasileiro pelo crime. Alertado de que sua vida corria perigo exilou-se novamente, desta vez no Canadá.

Direitos humanos

A corajosa militância de Rodolfo Konder em defesa dos direitos humanos levou a Anistia Internacional a designá-lo como presidente da seção brasileira. Não interrompeu a militância política passando a seguir a ideia do aggiornamento, abertura, defendida pela corrente eurocomunista.

Por coerência, foi levado a acompanhar o grupo de comunistas que apoiou Paulo Maluf. Ocupou de 1993 a 2000 a Secretaria de Cultura do Município de São Paulo, convertida por ele num organismo vivo, criativo e aberto, em contraste com o que ocorria em outros setores da prefeitura.

Outros jornalistas, ditos “de esquerda”, mamaram nas tetas do estado de São Paulo (inclusive em estatais como a hoje extinta Vasp), quando Maluf era governador e comandava a repressão policial contra greves e manifestações. Konder assumiu a arriscada tarefa política com toda a transparência, sem hipocrisias ou dissimulações. O radicalismo, o sectarismo e a intolerância que sempre combateu se voltaram contra ele. Há poucos anos, na plateia de um evento no Clube Hebraica, em São Paulo, desabafou para a jornalista Norma Couri: “Me sinto um leproso”.

Incompreendido, isolado e desolado. Morreu no dia 1º de maio.

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