Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Daniela Nogueira

A pauta do combate à prostituição e à exploração sexual é recorrente nos jornais. Na semana passada, teve destaque em manchetes e matérias principais de portais na internet, durante a cobertura da operação do Ministério Público Estadual, que investigou um esquema de prostituição em Fortaleza. Como os jornais mostraram, foi presa a ex-diretora de uma organização não governamental que atua contra a exploração sexual de crianças e adolescentes. As informações estão na matéria “MPE. Diretora de ONG é presa por esquema de exploração sexual”, publicada na sexta-feira, 6/6 (Cotidiano, página 2).

Mas, além da cobertura factual, o que têm feito os jornais para ajudar no combate à prostituição? Se depender dos anúncios nos classificados dos jornais impressos locais, não há muita colaboração. Todos os dias, a página dedicada à seção “Acompanhantes” estampa uma diversidade de corpos à venda. São ressaltadas características físicas, idade, opção sexual – e preços. Sem pudor.

Anúncios

Na última sexta-feira (6/6), os Populares do O POVO exibiam 52 anúncios de acompanhantes que se oferecem, além de casas de massagem, em “locais discretos”. No mesmo dia, os Classificados do Diário do Nordeste publicaram mais 80. Os jornais tentam se blindar do dolo ao divulgar: “Os anúncios desta seção são de inteira responsabilidade dos seus anunciantes”, como faz o Diário. Ambos, O POVO e Diário, avisam que “a exploração sexual e a prostituição infantojuvenil são crimes puníveis pela legislação vigente” e informam o número de telefone 100 para denúncias.

Não há esforço, porém, além do habitual aviso, para reprimir a prostituição no catálogo de ofertas dos cadernos de anúncios. A prestação de serviços sexuais se mantém na mídia impressa. Não chega a ser rufianismo, crime previsto no Artigo 230 do Código Penal, que consiste em “tirar proveito da prostituição alheia, participando diretamente de seus lucros ou fazendo-se sustentar, no todo ou em parte, por quem a exerça”.

No entanto, basta lembrar que, sim, os jornais lucram ao vender o nobre espaço de suas páginas ao comércio do sexo. Em tempos nos quais cada vez mais a cobertura informativa dá lugar às matérias de combate aos esquemas de prostituição, há uma grande contradição entre os setores editorial e comercial de um mesmo veículo. Questionados sobre o assunto, os gestores dos Populares não se manifestaram até o fechamento desta coluna.

Maconha: pró e contra

Com o título “Marcha da Maconha. Evento tem participação recorde em Fortaleza” (Cotidiano, página 4), o jornal publicou, na edição de 26/5, matéria principal, em quatro colunas não cheias, com foto, informando acerca do evento que reuniu participantes em defesa da legalização da maconha. Junto ao texto, havia uma seção “Confronto de ideias”, em que duas pessoas opinaram acerca do assunto – uma com argumentos favoráveis e outra com argumentos contrários. O mote era a factualidade da Marcha, ocorrida no dia anterior.

No dia 30/5, o mesmo assunto, sob outro ponto de vista, teve um destaque bem menor. Sob o título “Maconha. Seminário discute legalização”, foi publicada matéria secundária, sem foto, no canto da página 6 de Cotidiano. A notícia era a realização de um evento com participantes contrários à legalização da maconha. “O espaço foi reservado para as duas matérias de acordo com as demandas do dia”, comenta a editora Tânia Alves, responsável por Cotidiano.

Na mesma edição, 30/5, havia a cobertura detalhada da morte do motorista de ônibus e da consequente paralisação do transporte coletivo em Fortaleza, o que mereceu a devida atenção por parte do jornal, ocupando quatro páginas da editoria. O destaque dado às coberturas obedece também aos acontecimentos factuais. A escolha editorial segue os critérios de noticiabilidade, que determinam a importância que um fato tem para ser noticiado. Entretanto, principalmente ao tratar de temas polêmicos, que sempre provocam discussões carregadas de argumentos pró e contra, é preciso mais equilíbrio ainda a fim de fornecer igual tratamento para todas as vozes envolvidas.

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Daniela Nogueira é ombudsman do jornalO Povo