Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Uruguaio será o novo relator de liberdade de expressão da CIDH

O advogado e jornalista uruguaio Edison Lanza foi escolhido pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA) para ser o novo relator especial para Liberdade de Expressão do órgão. Ele substituirá a advogada Colombiana Catalina Botero, que em 6 de outubro termina seu segundo mandato à frente da relatoria.

Com ampla experiência em diversos veículos de comunicação – como o celebrado “Búsqueda”–, na arguição de casos perante o Sistema Interamericano de Direitos Humanos, inclusive contra o Uruguai, e na fundação de entidades civis e de advocacia de direitos fundamentais, Lanza era um dos postulantes a relator de Liberdade de Expressão preferidos de organizações da sociedade civil ligadas ao tema. Entre suas áreas de expertise está o acesso a informações públicas.

Uma das principais tarefas de Lanza será defender a relatoria dos ataques das chamadas nações bolivarianas. Sob a direção de Catalina Botero, a Relatoria Especial de Liberdade de Expressão – que goza de autonomia em relação aos Estados-membros e à própria CIDH – tornou-se a maior arrecadadora de fundos extra-cotas da CIDH (como doações de países europeus e instituições), consolidando sua independência. Isso irritou governos, que se dizem perseguidos por seus relatórios e recomendações.

Equador, Venezuela, Bolívia e Nicarágua estiveram à frente de uma campanha iniciada em 2011 que levou, em 2013, a uma reforma da CIDH que esteve próxima de esvaziar a comissão, ao tentar limitar a captação de recursos extra-cotas e impor limites aos mecanismos de advertência e processo. Em junho, na Assembleia Geral da OEA em Assunção, houve novo ataque, outra vez contido.

Segundo pessoas que conhecem Lanza e seu trabalho, o jornalista e advogado é “um uruguaio típico”, que fala com todo mundo e preza o trabalho coletivo. É considerado um bom contemporizador, mas uma pessoa de ideais firmes, fundamentados em argumentos. Sua qualidade técnica é avaliada como excelente.

– Ele defende com unhas e dentes os elementos básicos da liberdade de expressão, sabe quais são os limites, mas mostra disposição para incorporar mais vozes e ser plural – afirmou ao GLOBO um observador do processo de seleção da CIDH.

Os maiores adversários de Lanza na disputa eram os juristas chileno Francisco Cox Vial – considerado o candidato de maior habilidade técnica – e argentino Damian Loreti. Este último era visto com apreensão pela sociedade civil, devido ao fato de, apesar de longa folha corrida de serviços em prol da liberdade de expressão, ter escrito a principal peça de defesa do governo Cristina Kirchner na batalha jurídica contra o jornal “Clarín”, um dos capítulos mais dramáticos da implantação da lei de controle de meios de comunicação da Argentina.

Apoio discreto de Mujica teria ajudado

Correndo por fora, estavam o jurista peruano David Lovatón (com experiência junto à sociedade civil), o advogado equatoriano Juan Pablo Alban (que atuou na CIDH e não tem vínculo com o governo Rafael Correa) e a jornalista guatemalteca Ileana Alamilla Bustamante (há 30 anos militante na defesa da atividade profissional). Para observadores, faltava a esses candidatos conhecimento jurídico sólido nos temas de liberdade de expressão.

Nos bastidores da escolha, Lanza teria tido o apoio discreto do governo do Uruguai, cujo presidente José Mujica é celebrado internacionalmente por seu governo plural, de orientação à esquerda e caráter tolerante. Isso teria contribuído para a escolha de Lanza, embora sua independência não seja questionada pela sociedade civil.

A eleição do novo relator esta amanhã, após uma terça-feira de entrevistas com os seis finalistas. Mais de 49 pessoas se candidataram ao posto. A escolha ficou a cargo dos sete comissários da CIDH, que têm independência em relação aos países-sócios da OEA. O nome de Lanza foi enviado ao secretário-geral da organização, José Miguel Insulza, que já chancelou a designação. O novo relator assumirá o cargo em 6 de outubro, para um mandato de três anos.

******

Flávia Barbosa é correspondente do Globo em Washington