Saturday, 20 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Como a busca pelos ‘cliques’ afeta o trabalho jornalístico

O jornalismo online mudou o modo como se enxerga o sucesso de um artigo. A aprovação passa diretamente pelos “cliques” – enquanto repórteres, colunistas e blogueiros veem neles um sinal de popularidade, os editores preocupam-se em mantê-los elevados, já que são utilizados como base para a receita publicitária.

A socióloga Angèle Christin conduziu, por dois anos, uma pesquisa etnográfica – com a observação de redações e entrevistas com repórteres, editores e blogueiros – para analisar se estas novas métricas que chegaram ao jornalismo com a internet estão mudando a cultura da redação. Sua conclusão é que sim, estão, mas não como seria esperado.

O feedback obtido com o jornalismo online trouxe poder ao público e rompeu a ideia de superioridade e autoridade do jornalista profissional diante do leitor, como era caracterizada tradicionalmente a mídia impressa. Por outro lado, a obsessão pelos “cliques” ajudou a degradar a qualidade do conteúdo jornalístico online: junto a reportagens consideradas sérias, sites de notícias trazem listas fúteis e os tão populares vídeos de gatinhos para impulsionar o tráfego.

Em seu estudo, Angèle analisou o jornalismo online nos EUA e na França, dois países com tradições jornalísticas distintas. A pesquisadora tentou, com mais de 400 horas de observação em seis redações de veículos online, além de cem entrevistas com jornalistas, comparar o que estes profissionais dizem sobre seu trabalho com o que eles realmente fazem quando estão na frente de seus computadores.

Suas conclusões:

** A análise em tempo real das métricas online se tornou algo central na rotina dos sites jornalísticos. Os editores verificam os números de cliques em tempo real para determinar a localização de cada artigo na homepage e para mudar manchetes, tornando-as mais atrativas.

** Em muitos sites, os jornalistas recebem regularmente listagens com informações sobre o tráfego online, o que os estimula a pensar diretamente nestes números quando escrevem.

** As métricas da internet também são usadas como ferramenta de gerenciamento da redação. Muitas vezes, elas são levadas em consideração quando editores decidem sobre promoções ou aumentos.

** Costuma haver, afirma a pesquisadora, uma diferença entre o que os jornalistas dizem sobre as métricas e o que eles fazem. Muitos destes profissionais têm pontos de vista irônicos sobre o tráfego online e afirmam não se importar com page views, mas observa-se que quase sempre eles verificam se seus textos estão entre os mais lidos.

** Jornalistas lidam de maneiras diferentes com os números, dependendo do contexto. Em algumas organizações observadas por Angèle, eles veem o tráfego como um jogo que querem vencer. Em outras, repórteres sentem-se pressionados por seus editores para mantê-lo alto.

A pesquisadora concluiu que, apesar de ficar claro que a análise das métricas online é hoje essencial para os sites de notícias, estas métricas são vistas de diferentes formas. Diversos fatores explicam estas diferenças entre as redações observadas, como o tamanho e a idade do site, sua situação financeira, sua linha editorial, a idade e a carreira de seus jornalistas, o estilo de gerenciamento da organização e o país onde ela está. Ou seja, existem diversas “culturas do clique”.

Deveriam os jornalistas ser protegidos da pressão por tráfego ou encorajados a ampliar os números? O estudo de Angèle sugere que não há uma estratégia que sirva para o jornalismo online como um todo. “Com a multiplicação das métricas da web, para o bem ou para o mal, novas estratégias são necessárias para proteger a independência editorial das forças do mercado. A necessidade de se encontrar ajustes que funcionem entre as ambições editoriais e as realidades econômicas é tão antiga quanto o próprio jornalismo. Também é o único meio possível de garantir o futuro da mídia, online”, escreve ela.