Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Molon: exceções à neutralidade precisam ser raras

Atualmente em fase de consultas públicas para definir aspectos da regulamentação, o Marco Civil da Internet enfrenta um debate mais focado em neutralidade de rede. Na visão do relator do projeto, o deputado Alessandro Molon (PT-RJ), as exceções que serão regulamentadas na Lei nº 12.965/14 têm de ser feitas com parcimônia. “Se é uma exceção, tem que ser pouco, raro. Se são exceções à neutralidade, não podemos ter oito ou dez, se não vira regra, e a regra é a neutralidade”, disse ele em palestra durante a Campus Party 2015 na sexta (6/2), em São Paulo. O evento é organizado pela Telefônica.

Na visão do deputado, as exceções já estão previstas nos dois incisos do primeiro parágrafo do Art. 9º da Lei, que prevê a priorização de tráfego para serviços de emergência e excessões técnicas ao funcionamento da rede. O deputado acredita que o mesmo tratamento deve ser dado em relação à guarda de dados. “Como a tecnologia hoje permite que se guarde tudo, a lei tem que prever que a regra é não guardar, e só guardar o que for necessário, se não vão violar nossa privacidade”.

Molon cita o recente movimento do diretor da agência reguladora dos Estados Unidos, a FCC, que propôs princípios semelhantes, mas sem ser específico demais para não deixar o texto datado. “Tom Wheeler está propondo uma regra de neutralidade que diz que está tendo o cuidado de não colocar algo que impeça o desenvolvimento posterior. Foi o que a gente fez, para não tronar a lei velha e que impeça a inovação”, destaca.

Navegação gratuita

Um dos pontos polêmicos da regulamentação, no entanto, é a exceção para novos modelos de negócios para operadoras. Isto é, permitir a existência de acordos comerciais que promovam a navegação patrocinada, ou o “zero rate” – como o acesso gratuito a redes sociais a partir de um plano pré-pago de smartphone, por exemplo. Para o professor e consultor para sociedade da informação, Marcelo Branco, essa prática não deveria ser aceita. “Na minha opinião e na do (fundador da Web) Tim Berners-Lee, isso é uma quebra da neutralidade de rede. Não tem como ter um plano de dados que acessa só alguns serviços”, defende.

Branco reconhece que essa é uma ideia difícil de defender, mas justifica: “A operadora diz que dá de graça o Facebook, mas na verdade ela te vende um plano (de dados) que você só pode acessar determinados serviços que têm acordo comercial com a operadora, e isso quebra o princípio de neutralidade”. Ele criticou ainda a Anatel, dizendo que a agência “não representa os interesses dos usuários”, e pediu que o debate sobre a regulamentação do Marco Civil não envolva disputas partidárias.

A visão da advogada e membro do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Veridiana Alimonti, é semelhante a de Marcelo Branco. “Na medida em que você permite que uma determinada aplicação comercial tenha tratamento diferencial em termos de descontos de plano em relação a todas as outras (aplicações) que podem fazer exatamente o mesmo que ela faz, isso vai de encontro justamente às preocupações do Marco Civil de não existirem condutas anticomerciais”, destaca. Ela defende, por outro lado, o debate para que serviços públicos possam ser contemplados com esse tipo de modelo.

A visão de uma tele é, logicamente, diferente. O diretor institucional do grupo Telefônica/Vivo no Brasil, Enylson Camolesi, não chegou a defender abertamente o modelo de navegação patrocinada, mas pediu consideração. “É uma discussão que precisa ser aprofundada, tem apelo popular. Existe princípio que não pode ser usado para tudo, mas tem que ver se é benéfico ou não”, justifica. Ele lembra que a própria empresa não possui esse tipo de modelo de negócios “ainda”, mas pede que o debate seja feito de forma racional. “Tem coisa da neutralidade que precisa ser discutida, e a questão comercial tem que ser discutida também. Tem as necessidades de inclusão digital que nossa sociedade tem.”

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Bruno do Amaral, do Teletime