Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

No Peru, governo NÃO ameaça a imprensa


Liberdade em risco: no Peru, governo ameaça imprensa. O presidente Ollanta Humala declarou que a união legal entre grupos de mídia pode vir a ser considerada ilegal. Juristas criticam a interferência do governo etc., etc., etc.

Esta chamada foi publicada na primeira página do Globo, na segunda-feira (6/1). O texto da página interna não tem assinatura, mas tem procedência suspeita: foi enviado pelo diário El Comercio, o jornal conservador que está sendo acusado de montar um oligopólio de comunicação e negócios no Peru ao comprar o grupo Epensa.

Se o jornalão carioca está efetivamente interessado em informar seus leitores com isenção não deveria basear-se apenas numa fonte e ainda mais uma fonte altamente suspeita, comprometida com um negócio que está preocupando não apenas o presidente Humala, mas também os setores mais responsáveis da imprensa peruana.

Além de parte interessada, El Comercio – assim como O Globo – fazem parte de um pool fundado em 1991 composto por onze jornais conservadores da América Latina denominado Grupo de Diários de América (GDA).

O Wall Street Journal também é conservador e sua edição em espanhol é produzida pelo mesmo El Comércio que, não obstante, não brinca em serviço: publicou na sexta-feira (3/1) um relato preciso e equilibrado sobre a situação da imprensa peruana (ver aqui o resumo em português).

O WSJ não omitiu que o Nobel de Literatura, Mario Vargas Llosa, suspendeu sua colaboração no El Comercio durante a campanha eleitoral de 2011 porque o jornal manipulava informações contra o candidato que apoiava, Ollanta Humala (afinal vitorioso). O jornal preferiu jogar descaradamente a favor de Keiko Fujimori, filha do ex-presidente Alberto Fujimori, condenado em quatro julgamentos (inclusive por violação de direitos humanos) e condenado a um total de 25 anos de prisão.

Vargas Llosa transferiu imediatamente a sua coluna para o La República, de orientação progressista, hoje o mais veemente denunciador do oligopólio montado pelo concorrente de direita.

Concorrência regulada

A matéria do jornalão carioca (reproduzida aqui, no site da Abert), além de favorável à compra da Epensa, tenta colocar o presidente Humala na mesma linha bolivariana de Chávez-Maduro na Venezuela e os Kirchner, na Argentina. É uma grosseira mistificação política, já que Humala representa justamente as forças que se opõem ao populismo pseudoesquerdista e meio fascista de alguns caudilhos continentais.

O oligopólio que se tenta implantar na imprensa peruana com o apoio irrestrito do GDA seria impraticável se o país tivesse um organismo de regulação da concorrência nos moldes do nosso Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), pelo qual o Grupo Globo tem o maior respeito.

Nos Estados Unidos, pátria da livre iniciativa, a Federal Communications Commission (FCC), criada há exatos 80 anos por Franklin Roosevelt, não admite a propriedade cruzada e impõe uma série de entraves à formação de oligopólios nas comunicações.

O presidente Ollanta Humala não ameaçou a imprensa peruana. Considerou legal a compra da Edensa. Mas admitiu que no futuro a operação poderá ser considerada lesiva.

Está acenando com um CADE peruano. E certamente terá o pleno endosso do Globo.