Reproduzimos nesta edição, com autorização do Correio Braziliense, uma série de reportagens de Sylvio Costa (BrasÃlia) e Jayme Brener (São Paulo) que constitui um itinerário minucioso e circunstanciado da distribuição de concessões de televisão feita Brasil afora a pessoas direta ou indiretamente ligadas à atividade polÃtica.
O assessor de imprensa do Ministério das Comunicações, Francisco Mendonça, ouvido pelo OBSERVATÓRIO a respeito da reportagem, considerou-a “boa matéria”, mas afirmou que os jornalistas do Correio Braziliense não levaram em conta todas as suas ponderações.
Francisco Mendonça enviou para o OBSERVATÓRIO uma nota do Ministério das Comunicações distribuÃda à imprensa em 24 de janeiro deste ano – mencionada na série de reportagens do Correio – , um aviso público publicado como matéria paga nos jornais do dia 24 de março e tabelas com as quantidades de outorgas e de cassação, revogação e perempção de outorgas, ambas do exercÃcio de 1996, assim como uma tabela com a filiação das retransmissoras outorgadas por rede comercial. Este material é reproduzido abaixo, após as reportagens do Correio Braziliense.
O colunista de televisão Gabriel Priolli, da Gazeta Mercantil, chamou a atenção, em 1/8/97, para a importância do levantamento dos repórteres do Correio Braziliense.
Para este OBSERVATÓRIO, mais relevante do que avaliações polÃticas do comportamento do governo de Fernando Henrique Cardoso nessa área – tanto mais prováveis quanto mais nos aproximarmos das eleições de 98 – é a visão dos mecanismos que, há décadas, regem capilarmente as concessões de importantÃssimos meios de comunicação. É a percepção de um paÃs virtualmente desconhecido por quem depende, para se informar no dia-a-dia, da mÃdia hegemônica no Brasil.
A seguir, um comentário de Sylvio Costa sobre as circunstâncias em que a reportagem veio a público, a Ãntegra das reportagens e as informações fornecidas pelo Ministério das Comunicações.
Coronelismo eletrônico
Sylvio Costa, do Correio Braziliense
Estranho reino esse o de Tucanópolis. O Ministério das Comunicações distribui repetidoras de televisão a torto e a direito, para a felicidade de dezenas de polÃticos. Dois meses de intensa apuração resultam em mais de mil centÃmetros de texto, ao longo dos quais descreve-se não só a galeria dos beneficiários como o descarado uso eleitoreiro que boa parte deles faz dos canais de TV sob o seu controle. E o que acontece? Nada.
Na mesma semana em que o Correio Braziliense publicou o trabalho aqui reproduzido, a revista Veja veiculou a polêmica entrevista em que o ministro das Comunicações, Sérgio Motta, cuspiu fogo contra outros ministros. Ali, ele se vangloriava do fato (fato?) de se ter votado a reeleição sem se distribuir um canal de televisão sequer. Ninguém ousou pôr as suas palavras em dúvida. Apesar do farto material colocado à disposição de toda a mÃdia pelas páginas do principal jornal da capital do PaÃs.
A série de matérias publicadas pelo Correio ofereceu um amplo painel das irregularidades cometidas nas emissoras de TV pelo paÃs afora: veiculação irregular de propaganda, descumprimento da legislação eleitoral, emissão ilegal de programas etc. etc. etc. Durante duas semanas, tentamos ouvir o Ministério das Comunicações. Tanto para conhecer os critérios que serviram de base para a distribuição das estações retransmissoras de televisão  as RTVs  como para saber se o governo tinha conhecimento das irregularidades encontradas e que providências estaria disposto a tomar.
Foram incontáveis telefonemas, mas não conseguimos, Jayme Brener e eu, passar do assessor de imprensa, Francisco Mendonça, cujas observações foram incorporadas ao texto que abriu a série. E ele ainda foi procurado depois, insistentemente, para que as autoridades do Ministério das Comunicações tivessem nova chance de se manifestar sobre o assunto. Não houve resposta.
Apesar de todo o cuidado que tomamos, é possÃvel que tenhamos incorrido em falhas aqui e ali. Rastrear perto de 2 mil RTVs, afinal, é como caçar agulha em palheiro. Em um caso ou outro, pode-se ter tomado como agulha um simples e inocente alfinete. Tal crÃtica não cabe, no entanto, para o grosso do material publicado. E dali emerge, inconfundÃvel, uma faceta até então desconhecida do governo Fernando Henrique: a sua cumplicidade com o brasileirÃssimo fenômeno do “coronelismo eletrônico”.
O leitor atento irá perceber que a maioria das RTVs entregues a polÃticos foi distribuÃda por portarias assinadas em datas próximas a janeiro de 1997, data da votação da reeleição. Mera coincidência? Talvez. Mas a relutância do Ministério das Comunicações em abrir as informações a respeito do tema  divulgando, por exemplo, a relação das empresas e entidades que tiveram os seus pedidos para instalação de RTVs negados  só estimula as suspeitas de que se tenta esconder algo.
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