Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Por trás do Observatório da Imprensa

Nenhum projeto foi mais importante para Alberto Dines do que o Observatório da Imprensa, criado há 22 anos, gerado numa mesa na Vila Madalena para ser o “olho”, símbolo do projeto, crítico da mídia.

Foi incansável a dedicação de Dines na excelência dos textos, no cuidado na apuração, na busca de novos parceiros e retoques elegantes a cada edição. Eram horas em cima do computador no mesmo escritório da Vila Madalena onde algumas vezes ele viu a luz do dia entrar sem ter dormido nem chegado em casa. Vinha da gravação do Observatório da Imprensa na TV Brasil, no Rio, a mala esperando ao lado, dando um tempo na vida, no jantar e no relógio, para escrever um texto, mandar um recado, clarear uma ideia.

A rotina ocorria de segunda a sexta. Aos sábados tudo se repetia depois que alunos de jornalismo de qualquer parte do país e de qualquer graduação deixavam o escritório. O domingo começava cedo com Dines, já tendo traçado todos os jornais, ao telefone com o editor Luiz Egypto, que morava em São Luiz do Paraitinga. A conversa durava horas com risos, irritações, descobertas, eurekas, ovos de colombo, grandes sacadas, condenações, e só depois de ter a semana desenhada no ar podia tomar o café da manhã já com a pasta na mão, direto para o escritório. Não, domingo não era dia de descanso. Ou o descanso era o Observatório da Imprensa. O alimento, o jornalismo no melhor estilo, o olho atento na mídia e na tentativa de melhorar a imprensa a qualquer custo.

Não que não houvessem outros projetos e paixões como as biografias (Stefan Zweig, Hipólito da Costa, António José da Silva, o Judeu, Dreyfus…), mais de 15 livros publicados, prefácios, palestras, aulas de jornalismo, artigos e entrevistas.

Mas o Observatório era o primeiro, acima de qualquer viagem, qualquer passeio, qualquer diversão. Aliás, o OI era a diversão. Por isso tem tanta energia positiva, virou fonte de consulta de jornalistas e teve a credibilidade que conserva até hoje.

Em 65 anos de jornalismo, Dines chefiou vários jornais como Jornal do Brasil, a sucursal do Rio da Folha de S.Paulo, criou várias colunas como “Jornal dos Jornais” na Folha e “Jornal da Cesta” n’O Pasquim, e teve a mídia como alimento diário. Mas nada apaixonou tanto o Dines como este Observatório, que ele alimentava todo dia e queria ver brilhando e servindo de bússola para leitores veteranos e aprendizes.

Na foto, um trecho da poesia em destaque no escritório de Alberto Dines, Vila Madalena. (Foto: Acervo Pessoal/Norma Couri)

Sei disso tudo porque acompanhei cada minuto dessa maratona e nunca entendi como ele aguentava o ritmo sem nunca sucumbir ou desistir, ao contrário: cada dificuldade reforçava a força contrária capaz de vencer qualquer tsunami. Esse foi o Dines durante 20 anos no Observatório.

No escritório onde tudo isso acontecia, uma frase de 1682, de John Sheffield (“Essay in Poetry“), pendurada na parede lembra a quem entra ali hoje que escrever bem é o maior talento que qualquer jornalista ou escritor deve almejar:

“ Of all the arts in which the wise excel
Nature’s chief masterpiece is writing well”

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Norma Couri é jornalista.