Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Mais transparência, com isenção e menos teatro

Para qualquer observador dos pressupostos de informação que as transmissões ao vivo de CPIs ou interrogatórios legislativos ou judiciários podem repercutir no inconsciente coletivo brasileiro, o que se tem presenciado é um desfile grosseiro de anticomunicação. Não é questão de censura ou filtragem, mas de respeito ou noção de vida republicana e institucional.

De há muito o nível dos nossos parlamentares e até dos nossos representantes judiciais foi baixando e se deteriorando. Fala-se do desvio de milhões como se fosse algo normal diante de um povo sofredor que conta tostões para sobreviver e elege políticos ou crê na justiça como tábua isenta para suas salvações legais.

Mas os canais se limitam a deixar correr como se fora um reality show onde frases e confissões nem parecem levar em conta a disparidade que o momento politico nacional pressupõe.

Os estadistas teriam seu papel se conseguissem separar joio de trigo. Mas estão escassos ou comprometidos ou engessados ou acreditam em oportunidade de faturamento de suas exposições segundo modelos que já se autodestruíram.

A mídia televisiva se limita a transmitir e os analistas (mesmo os melhores jornalistas) não conseguem estancar seu ar de perplexidade diante da grande responsabilidade que é a concessão da comunicação social.

Não é o caso de mentir. Jamais. Tudo o que precisamos é transparência com isenção e menos teatro. Centenas de milhares de pessoas são diretamente afetadas pelo escândalo do Petrolão. E o que se vê é cada investigado ou mesmo delator premiado depor como se herói fosse por ter decidido assumir mea culpa.

Que jornalismo é esse que nem questiona obstinadamente os resultados da paralisação do país diante do quadro a nós impingido como destino cruel.

Que se calem e mintam menos

Pergunto me se as tais forças ocultas que fizeram Janio renunciar num tempo sem TV ao vivo não teria mais neutralidade de ação para trazer o drama político e social de uma corrupção escancarada aos lares de criaturas que aprendem a exercer a democracia e já desconfiam se as enganam ou ludibriam descaradamente. Uma presidente eleita e mal avaliada porque o tal ajuste fiscal está mal explicado. Um país à beira do ataque de nervos e as figuras de presidentes de Senado e Câmara Federal que não nos pedem desculpas de nada. Afinal são perfeitos. Errados somos nós, que assistimos falas que mencionam imensos roubos e nos afrontam dignidade.

Os meios de comunicação que precisam da publicidade parecem cautelosos ou se agregam como agremiações ideológicas. Os apresentadores são repetitivos. As análises carecem de propostas coerentes. Nossos jovens e crianças são parte do público e a eles é dada essa plêiade de desajustes ou tantos desmentidos. A frase mais repetida. Nunca participei disso. Parece que o jornalismo investigativo morreu. Não conseguem provar ou mostrar os tais encontros em hotéis onde se combinava a distribuição do dinheiro desviado. Onde estão os repórteres com fontes especiais?

O tal lero-lero do tempo de Noel Rosa voltou à moda. A única novidade é a atuação do temido Ministério Público. O corporativismo é palavra de ordem. Ou seria um procedimento globalizado imposto pelo poder? Mídia corporativa é tão nociva quanto corrupção sistêmica.

Exame de consciência virou história da carochinha e verdade parece peça de leilão de antiguidades. Os depoentes merecem mesmo ser chamados de excelências. A nós, que somos público, restam perplexidade, prejuízos, decepções e paciência para novas cenas de teatrinho com roteiros que nem mencionam nossas dores ou desempregos ou papel de enganados de plantão.

Mídia esquisita em tempos de muitas revelações ou de inúmeros desencantos. O Brasil é maior e merece mais. Pelo menos que se calem mais e mintam menos.

******

Maria Aparecida Torneros é jornalista, poeta e escritora