Thursday, 10 de October de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1309

"Pela primeira vez em 50 anos, ACM vê mídia voltar a mira contra si", copyright Último Segundo

ASPAS

CRISE DO PAINEL
Leão Serva

"Pela primeira vez em 50 anos, ACM vê mídia voltar a mira contra si", copyright Último Segundo, 3/05/01

"Quando o senador Antônio Carlos Magalhães, poucos dias atrás declarou estar sofrendo um ?linchamento? pela mídia, certamente, tinha razão. Pela primeira vez em sua vida, ele foi colocado no paredão, sob a mira dos meios de comunicação que, em sua maioria, até hoje o protegiam ou mesmo bajulavam.

ACM também expressou um sentimento que espelha o de outros políticos antes dele, normalmente homens mais velhos, em relação à evolução da força dos meios de comunicação como instrumento político ao longo das últimas décadas que não pára de crescer.

É muito diferente fazer política à base de relacionamentos pessoais, de articulações reservadas. Quando a mídia joga seus holofotes sobre um político e suas articulações de bastidores, aquilo que é íntimo e reservado se torna público. É quase como se fosse pego de cuecas no Senado (o que literalmente já provocou a cassação de um político, no passado).

ACM sempre usou a mídia com maestria, mas como se fazia política antigamente. Seu relacionamento com jornalistas sempre foi à boca pequena, nos bastidores, onde é considerado uma das melhores fontes para aqueles na imprensa que o usam como fonte. O custo dessas informações de qualidade sempre foi mantê-lo longe do escrutínio crítico: holofotes só para destacar suas qualidades e boas ações.

Agora, quando o criticismo se voltou contra ele (e mesmo alguns dos órgãos que sempre o protegeram se viram compelidos pela opinião pública a mudar de lado), ACM se surpreende e se sente ?fuzilado?.

Mesmo nos Estados Unidos, mais habituados ao uso intensivo de meios de comunicação de massa como arma política (quando a tevê chegou ao Brasil, já eram um meio de massa nos EUA), esse tipo de estranhamento também é destacado em inúmeros relatos.

Um caso explícito é o do ex-presidente Lyndon Johnson, que deixou de concorrer à reeleição em 1968, sentindo-se perseguido pela mídia. Ao não concorrer, abriu caminho para a vitória de Richard Nixon, que seis anos depois de eleito renunciou na onda do ?caso Watergate?, também atribuindo seu destino à força da mídia.

No livro ?The Powers That Be? (Alfred A. Knopf, 1979), uma história de alguns dos maiores grupos de comunicação norte-americanos, o jornalista David Halberstam descreve a resposta indignada de Johnson, já então ex-presidente, diante da pergunta de um jornalista sobre o que havia mudado na política desde o início de sua vida pública: ?Vocês, todos vocês da mídia. Toda a política mudou completamente por causa de vocês da mídia?.

Depois de Johnson, Nixon renunciou sob a força do ?quarto poder?; Reagan governou oito anos usando a tevê como um gênio; e Clinton firmou-se como um presidente de sucesso político e um fracasso pessoal, tudo pela força da mídia.

Por mais que ACM seja uma velha raposa da política, com 50 anos de vida pública e até mesmo responsável por farta distribuição de concessões de emissoras de rádio e tevê para políticos (criando uma espécie de rede nacional pró-ACM), jamais havia sido colhido pela máquina da mídia em situação tão crítica. Isso porque ACM está ?morrendo pela boca?, está sendo punido por falar demais.

Mas ele sempre falou demais, sempre gostou de mostrar que sabia mais do que os outros. O problema para ele é que agora algo que ele falou ?a mais? veio a público. E os meios de comunicação nunca tinham transmitido aquilo que ele falava e não queria que fosse transmitido."

Gilberto de Mello Kujawski

"A responsabilidade da imprensa", copyright O Estado de S. Paulo, 3/05/01

"A República ferve com as sessões da Comissão de Ética, no Senado. A temperatura cívica nunca foi tão alta em todo o País. No dia da argüição de ACM, o Brasil inteiro parou para ver e ouvir o cacique baiano defender-se, ao vivo. O desempenho do velho senador foi soberbo, provando a ascendência sobre quase todos os membros daquela Casa, mas sua defesa foi pífia e comprometedora.

A lição que fica desta penosa novela da violação do painel do Senado é que um homem não pode ter poder demais. Nem um homem, nem uma instituição. O vice-rei baiano, com a tremenda concentração de poder que detinha nas mãos, julgava-se acima dos outros mortais, acima da lei, e do bem e do mal. Também nenhuma instituição pode somar poder excessivo. Daí a alta sabedoria da divisão do Legislativo em Câmara e Senado.

Mas o tema deste artigo é outro. A imprensa vem cumprindo um grande papel na denúncia da má conduta dos políticos em nossa terra, mas não se pode esconder, por outro lado, o perigo que representa para a democracia o descrédito crescente dos homens públicos. O risco iminente está em a imoralidade de uns poucos ser generalizada para todos, e contaminar a própria fé nas instituições democráticas. A população se indaga: que democracia é esta, minada de alto a baixo pela irresponsabilidade de seus dirigentes? Que democracia é esta dos grampos telefônicos, das pastas rosas, das escutas clandestinas, dos desvios de recursos, das associações suspeitas entre alguns políticos com os maiores escroques, sem falar nos rumores persistentes da compra de votos na reeleição de FHC e das contas nas Ilhas Cayman? A escalada dos escândalos atinge agora o ponto mais alto com a famosa lista espúria do Senado, envolvendo o parlamentar mais influente do País e o próprio líder do governo.

Um prato cheio para a imprensa, nem há dúvida. Por força do infernal mecanismo da concorrência, os órgãos de divulgação competem ferozmente entre si sobre qual deles dará a público, em primeira mão, a informação mais sensacional, a última notícia, especialmente corrosiva, sobre o que se passa nos bastidores do poder, e que jamais seria divulgado.

Ora, a função da imprensa não é essa, mesmo? Ela existe para informar, não podendo sonegar nenhum fato de interesse público. E, como os jornais, as revistas, as estações de rádio, os canais de televisão estão inseridos no mercado, têm todo o direito de competir entre si para ver qual deles se antecipará na investigação dos fatos, e qual deles exibirá a manchete de maior impacto. Sem dúvida, mas a conseqüência inevitável é que os meios de comunicação, uma vez estourado o escândalo, não hesitam em jogar mais lenha na fogueira, insuflando, ainda que sem querer, a insatisfação e a revolta do público contra os políticos e a política em geral.

Atuando às cegas e por mero reflexo competitivo na disputa do mercado, a mídia vem reforçando a descrença do povo nos seus representantes, como se todos eles fossem ladrões, safados e vendilhões da Pátria. Não podemos pedir à imprensa que abafe os escândalos e reprima as denúncias dos atentados contra o bem comum. O que podemos e devemos fazer é lembrar à mídia que suas funções não se resumem a informar e denunciar. Compete também à mídia a função de educar, de conduzir a opinião pública pelos caminhos da ética, do direito e dos valores superiores. Está na hora de os jornalistas, que com tanto brilho elaboram suas informações e suas denúncias, passarem a abrir os horizontes da população, lembrando-lhe que não existe em nosso tempo outra legitimidade vigente a não ser a democracia, que não existe democracia sem políticos e que nem todos os políticos são iguais.

O povo brasileiro, bombardeado cotidianamente pelos escândalos mais cabeludos, está a um passo de desesperar da democracia e das suas instituições – o voto, o Parlamento, a lei, o Judiciário. O passo seguinte pode ser a decepção radical com o sistema democrático e o pedido para a reexibição daquele filme canastrônico que tanta náusea e indigestão já nos provocou – a intervenção militar, o fechamento do Congresso, a suspensão dos direitos e garantias e o apelo a uma nova ditadura.

Antes que isso aconteça, a imprensa tem o dever de, ao lado do noticiário sobre os desmandos na alta esfera da vida pública, colocar o contrapeso, explicando por miúdo à população a razão de ser da democracia, a importância vital do voto, do Parlamento e do Judiciário no jogo democrático. Cabe-lhe ensinar como foi penosa a conquista do Estado de Direito no Brasil, que não podemos descartar tão levianamente, e que essa conquista tem de ser renovada a cada dia, pois a vida democrática é uma elaboração vagarosa, sujeita a idas e vindas. Urge acentuar a distinção entre as instituições e os homens, pois, por pior que sejam estes, as instituições pairam acima de qualquer suspeita.

Sobretudo, é inadiável ensinar a discernir com seriedade entre os políticos sem escrúpulos e sem princípios e os políticos idôneos, confiáveis, patriotas e esforçados, que até podem não ser a maioria, mas são muitos. Por que não iniciar um estudo metódico, divulgando com destaque o currículo de cada deputado, de cada senador, dos governadores e prefeitos, mostrando quem é quem no mundo político?

A par de informar e denunciar, a imprensa deve retomar, com a mesma intensidade, sua função pedagógica, como contribuição essencial para preservar a crença social nas instituições e a sobrevivência do sistema democrático, que está ameaçado entre nós, não pela iminência de um golpe, mas pela generalização da descrença e do desinteresse popular. O Estado democrático pode não ser perfeito, mas fora dele não há salvação. (Gilberto de Mello Kujawski é escritor e jornalista E-mail: gmkuj@ig.com.br)"

O Globo

"Adélia Prado organiza protesto contra ACM", copyright O Globo, 4/05/01

"?Fora ACM! Fora Arruda! Fora Jader?. É dessa forma que a escritora mineira Adélia Prado e outros quatro intelectuais conclamam os moradores de Divinópolis, em Minas, para uma manifestação de repúdio, neste sábado, contra os escândalos no Senado. O grupo garante que não, mas o movimento acabou se tornando simbolicamente uma reação à solidariedade de artistas baianos ao ex-presidente da Senado Antonio Carlos Magalhães (PFL) – entre eles o casal de escritores Jorge Amado e Zélia Gattai, além da cantora Gal Costa.

– Divinópolis não tem força para deflagrar um movimento nacional, mas queremos dar nossa contribuição como cidadãos. Esperamos que em todo o país ocorram atos semelhantes – disse o escritor Lázaro Barreto, que está entre os cinco organizadores da manifestação, ao lado de Adélia Prado.

?Exigimos o julgamento, a cassação e a punição severa dos corruptos?, diz o grupo em mais de cinco mil panfletos distribuídos ontem na cidade. O ato será às 9h da manhã deste sábado, na Praça da Catedral.

Adélia e seus amigos terão o apoio de muitos artistas, incomodados com o desagravo de representantes da classe ao senador baiano. Aguinaldo Silva, autor de ?Porto dos Milagres? – cuja trama é ambientada na Bahia – é um deles:

– Tinham que cassar todo mundo, começar do zero. Mas na Bahia você ainda vê pessoas se dando ao trabalho de defender o ACM numa hora como esta – diz.

Antonio Torres, escritor e baiano, nem se dá ao trabalho de comentar o episódio.

– Sou do sertão e não tenho nada a ver com aquele povo do litoral – ironiza.

O cantor e compositor Sérgio Ricardo também critica o apoio dado a Antonio Carlos.

– Chega de bandido. Parte da classe artística está dando uma demonstração de como está perdida, sem opinião.

A cantora Nana Caymmi, filha de um símbolo da Bahia, Dorival Caymmi, também não se arriscaria a oferecer seu apoio ao senador:

– Não recrimino a Gal. Se fosse amigo meu eu iria visitar até na prisão, porque amigo não tem defeito. Mas pensando pelo país, foi um erro e alguém tem que pagar por isso.

A atriz Letícia Sabatella diz que mal pode esperar para ver alguém pagar pelos erros:

– É surpreendente ver que nem o todo-poderoso ACM vai ficar impune, quer dizer, se Deus quiser, não vai ficar. Será um milagre! – torce.

O escritor Marcos Santarrita, nascido em Ilhéus, diz que os artistas baianos que apoiaram o senador estão pagando uma conta.

– ACM cumula as pessoas de favores e quem ele protege é protegido dos deuses. Um dia apresenta a conta. É um senhor feudal.

Lobão é um dos mais revoltados.

– Numa réplica que estou fazendo a uma música do Caetano digo: ?Resta um glamour de fim de festa, ACM, de um império do medo carnavalizante.? A Tropicália morre com este episódio. Dá alívio e tristeza, pois envolve pessoas de quem eu gosto. Falam em patrulha ideológica? Não é ideologia, são fatos, réus confessos. ACM não é a Bahia. A Bahia é maior que o senador, senão seria intransitável."

Ricardo Mignone

"ACM acha que não merece punição e reclama da imprensa", copyright Folha Online (www.folha.com.br), 4/05/01

"O senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA) fez pesadas críticas hoje à imprensa e acusou a mídia de pressionar a opinião pública contra ele.

?A imprensa escrita e televisionada não está sendo isenta. Eu sou um juiz também da imprensa?, disse o senador. Segundo ele, quem viu a acareação, ocorrida ontem à tarde no Conselho de Ética do Senado, saiu com uma impressão diferente do que aqueles que acompanharam o episódio pela imprensa.

ACM disse que não merece nenhuma punição no caso da violação do painel de votação do Senado, ocorrida no dia 28 de junho de 2000. ?Pelo que tenho sabido, acredito que o conselho não vai tomar a decisão de me suspender até o fim do mandato. Acho que não mereço nenhuma punição?.

ACM afirmou também que não teme a cassação de seu mandato. ?Pelos argumentos não haverá cassação, embora essa não seja a vontade de alguns jornais?, afirmou.

O senador disse que não vai renunciar ao cargo, como estratégia de preservar seus direitos políticos. Segundo ACM, a tese de que uma renúncia em conjunto dele com seus dois suplentes, para convocar novas eleições para a sua vaga no Senado na Bahia, é ?absurda?.

Ressentimentos de inimigos

O senador Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA) disse hoje que existe um ?clima de caça às bruxas? por parte de alguns congressistas que ‘não perdoam’ denúncias feitas por ele no passado.

?São 50 anos de vida pública que não podem ser julgados de forma apressada e injusta?, disse ACM, acrescentando que a decisão do relator do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, senador Roberto Saturnino (PSB-RJ), de prorrogar o prazo de apresentação de seu parecer é acertada.

Na opinião do senador ACM, não deve haver demora e nem pressa no tempo de apresentação do relatório pelo senador Saturnino."

JB Online

"Manchete do JB faz Saturnino desistir de divulgar relatório na quinta", copyright JBonline, 4/05/01

"O relator do Conselho de Ética do Senado, o senador Roberto Saturnino Braga, informou há pouco que não entregará na próxima quinta-feira, como havia sido anunciado, o relatório final do processo de violação do painel do Senado. O senador disse ter sido surpreendido pela manchete do JORNAL DO BRASIL, que antecipava o resultado do relatório, que seria favorável à ??cassação dos dois senadores? -Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA) e José Roberto Arruda (sem partido-DF).

O relator disse ter conversado muito brevemente com dois assessores jurídicos, revelando seu sentimento de que permanecem contradições nos depoimentos dos dois senadores. Diante disso, Saturnino Braga disse que se inclinava pela proposição da cassação, não somente pelos ilícitos cometidos, mas pela posição dos senadores de apresentar versões que sempre se sucediam com ligeiras modificações, sem, no entanto, conseguir superar as contradições.

?O procedimento do Jornal do Brasil, que com certeza conversou com os dois assessores, me faz exigir certo recolhimento. Isso pra mim foi tãatilde;o chocante que me levou a perceber que, neste afã de dar notícias em primeira mão, a mídia está criando um clima de caça às bruxas?, afirmou."

Volta ao índice

Jornal de Debates ? próximo texto

Jornal de Debates ? texto anterior

Mande-nos seu comentário