Wednesday, 09 de October de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1308

Quando prevalecerá o bom senso?

FITAS & ROLOS

Chico Bruno

A imprensa continua divulgando fitas e grampos telefônicos. O jornalismo fiteiro está a todo vapor. Na terça-feira da semana passada, O Globo divulgou, com direito a chamada no Bom Dia Brasil, da Rede Globo, denúncias requentadas, baseadas em grampos telefônicos, já divulgadas durante a campanha de 1998 e republicadas em julho ou agosto de 2000 contra o governador carioca Anthony Garotinho. O jornal foi impedido de divulgar as fitas, dois dias depois, por liminar conseguida pelo advogado do governador, o que já havia acontecido durante a campanha de 1998. Uma atitude muito criticada, porque quem não deve não teme. O JB desconsiderou a liminar e, na sexta-feira, divulgou parte das gravações obtidas com grampos telefônicos. Suspeita-se que tenham sido feitos por um empresário de Campos, cidade natal do governador, ex-amigo de Garotinho, que se sente prejudicado porque seus contratos com a prefeitura de Campos foram cancelados na segunda e meteórica administração de Garotinho como prefeito da cidade.

Vale ressaltar que esses grampos foram parcialmente usados por César Maia e resultaram insuficientes para impedir a vitória de Garotinho, em 1998. Em 2000, voltaram à cena, durante a crise entre a polícia carioca e o governador, ainda sem abalar a administração estadual, que continua com altos índices de aprovação. Aliás, o próprio Jornal do Brasil, ao publicar trechos da fita, faz uma ressalva, que transcrevo na integra: "Há discrepância entre a fita obtida pelo JB e a que foi levada ao ar pela rádio CBN (emissora do Sistema Globo de Rádio), anteontem, no começo da noite."

Por que foram inseridas agora no contexto tais denúncias? A quem interessa sua divulgação? Ao empresário? Aos adversários políticos de Garotinho? No domingo, o jornalista Fernando Pedreira, de O Globo, enveredou pela questão e escreveu: "Poucas pessoas, por exemplo, se dão ao trabalho de pensar com seriedade sobre o que pode estar por trás das manchetes dos jornais e da TV" ? o que, aliás, indaguei neste Observatório na semana passada ?, e encerra seu artigo com o seguinte parágrafo: "O Brasil não quer andar para trás, não vai andar para trás, mas certamente sofrerá incômodos tropeços em sua caminhada, à medida que nos deixemos confundir pelos rodopios da opinião e pela gritaria das manchetes." Outro colunista, Elio Gaspari, que publica colunas simultaneamente em O Globo e na Folha de S. Paulo, também escreveu, no domingo, sobre a credibilidade dos grampos telefônicos ilegais, citando decisões da Corte Suprema americana sobre o assunto.

Massa de manobra

A verdade é que fitas e grampos hoje são matéria-prima de parte do jornalismo brasileiro. Uma parcela dos jornalistas deixou o jornalismo investigativo de lado e aguarda calmamente nas redações que alguma denúncia baseada em fitas e grampos lhe caia no colo, trazida por alguém interessado em "campar" (sinônimo de prejudicar, utilizado na Bahia) com um adversário. Em todos os episódios recentes, a coisa funciona dessa maneira. Ninguém corre atrás da notícia, ninguém apura mais nada. Hoje, uma parte da imprensa é o instrumento mais eficaz para a vingança.

Vale lembrar que as denúncias pipocam de todos os lados. A agência de notícias do Globo distribuiu, no sábado, matéria sobre denúncias que atingem oito governadores, de quase todos os partidos, inclusive o PT. Com a antecipação da corrida presidencial e das sucessões estaduais, o jornalismo fiteiro vai se multiplicar, e o risco de se verem reputações mergulhadas na lama aumenta ainda mais.

É bem capaz que novamente venham à tona, em breve, as mesmas denúncias contra Lula e Ciro utilizadas na campanha presidencial passada, e que não prosperaram porque não continham provas consistentes. Infelizmente, a imprensa está se deixando usar. Será preguiça, ingenuidade? Ou estará consciente de que serve para vingança ou para que se tirem proveito de brigas, como no caso das telefônicas, entre o Opportunity e os canadenses? Está na hora de o bom senso prevalecer.

    
    
                     

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