Thursday, 18 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1283

O poder da internet nas teorias da conspiração

Barack Obama é americano. Nasceu em Honolulu, no Havaí, em 1961. E quem tinha alguma dúvida pôde tirá-la de vez na semana passada, quando o presidente dos EUA pôs fim a duradouras especulações de que ele não teria nascido no país. Obama, eleito no fim de 2008, era vítima de uma teoria paranoica que ganhou espaço na internet e voz em expoentes da mídia americana e ultrapassou todos os limites do bom senso. Finalmente, o presidente parece ter cansado. Na semana passada, a Casa Branca divulgou sua certidão de nascimento. Em artigo publicado no New York Times [2/5/11], o editor da Bloomberg News Albert R. Hunt questionava se era preciso chegar a este ponto.

Em 2009, o então apresentador da CNN Lou Dobbscriou uma saia justa para a emissora ao insistir, em seu programa, que Obama deveria provar que não havia nascido na África. Ele acabou deixando a CNN meses depois. Em janeiro de 2011, o deputado republicano Eric Cantor, líder da maioria na Câmara, foi questionado em um programa de TV sobre a teoria. Respondeu que não considerava se tratar de uma questão relevante. Pressionado a citar as pessoas que estavam incitando a ideia de que Obama não era americano e falar sobre como a história toda era uma loucura, ficou contrariado e disse que não apontaria dedos. No último mês, o empresário e apresentador de TV Donald Trump – que estuda se candidatar à presidência dos EUA pelo partido republicano – transformou a cidadania do presidente no tema principal de suas aparições públicas e mostrou uma espantosa habilidade de chamar a atenção com ele.

Moinho

A controvérsia não dominou a cobertura política do país, como se queixou o próprio presidente há algumas semanas. De acordo com um estudo do Projeto para Excelência em Jornalismo, do Centro de Pesquisas Pew, ela chegou a representar no máximo 4% da cobertura, não desviando o foco de importantes questões econômicas e fiscais do período. Uma pesquisa nos dois jornais mais politicamente influentes dos EUA , o New York Times e o Washington Post, nos últimos dois meses encontrou dezenas de menções ao assunto – a maior parte em editoriais, colunas ou matérias denunciando a questão.

Ainda assim, pesquisas recentes sugerem que quase a metade dos republicanos e um número significativo de independentes acreditam que o presidente pode não ser “um cidadão legítimo”. Estudiosos de teorias da conspiração como esta dizem que este é um preço a se pagar por uma internet livre, sem filtros. Com todos os seus benefícios democráticos, a rede também funciona como um “grande moinho de boatos”, dizem os professores de ciência política Bruce Bimber, da Universidade da California em Santa Barbara, e Richard Davis, da Brigham Young University, em Utah.

Para Michael Barkun, professor da Universidade Syracuse, em Nova York, que estuda a cultura das conspirações, teorias como esta sobre Obama não teriam o mesmo poder há 25 ou 30 anos. Além da internet, a TV a cabo – com notícias 24 horas – alimenta este tipo de história. O curioso é que o canal de esquerda MSNBC foi, em determinados momentos, o que mais falou sobre a teoria. Ainda que com o intuito de desacreditá-la, a emissora acabava ajudando a manter o assunto em pauta. No canal conservador Fox News Channel, foram poucos os âncoras e comentaristas que consideraram a teoria como maluquice. A maioria, como o apresentador Sean Hannity, não cansava de perguntar no ar por que a Casa Branca simplesmente não mostrava logo a certidão e acabava com o assunto, dando a entender que não havia uma certidão americana a ser mostrada.

Em 2008, Obama divulgou um certificado resumido considerado legítimo pelo estado do Havaí. Os criadores e seguidores da teoria, ao que parece, não o consideraram válido. Recentemente, o presidente se deu ao trabalho de pedir ao Departamento de Saúde do Havaí que divulgasse cópias de sua certidão de nascimento completa. Donald Trump vangloriou-se de sua “vitória”. Agora, ele começou a questionar – em uma clara sugestão de preferência racial – como Obama teria entrado na Escola de Direito de Harvard. E a fila das teorias conspiratórias anda.