Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Enfim, o ‘clima de Copa’

O amistoso com a Sérvia não foi propriamente um triunfo; no entanto, dois dias depois, de repente, do nada, surgiu o “clima de Copa”, a “cara de Copa”, a “festa do Mundial”. Comandados por inaudível apito, os comentaristas começam a sorrir esquecidos das apreensões e angústias cada vez mais justificadas. Ninguém é de ferro, vamo q’ vamo.

Compreende-se: as seleções estão chegando, a curiosidade cruzada com hospitalidade teve o dom de retirar do freezer o estoque de expectativas congeladas há sete anos.

#vaitercopa deixou de ser uma afirmação virtual, é realidade pura: o grande dia é uma questão de horas e dura quatro semanas.

As saudades do hino nacional logo serão saciadas, o virumdum é mágico e a versão à capela tão inovadora quanto o estilo Fred de fazer gols – deitado.

Estado de espírito

As discussões sobre o direito de greve e o direito ao trabalho vão ceder à outra, transcendental, empolgante: a função do centroavante (o velho center-forward) é apenas fazer gols ou comandar o ataque?

O futebol continua a mesma caixinha de surpresas, porém a questão central não aparecerá no placar: o esporte-rei foi desbancado pelo ativismo político? Ao menos equiparado?

A melhor radiografia da trepidante saison futebolística está na capa de última edição do Economist – como esporte, belíssimo; como negócio, asqueroso (ver “The Economist lembra o lado obscuro da Copa”). E assim convivem há 84 anos. Nossa imprensa fingiu que não entende inglês, ficou na moita.

Cansada de ser neutra, a república mais antiga do mundo – a Suíça – resolveu dominar o mundo. Seus relógios, chocolates e canivetes continuam os melhores, mas só a Suíça consegue alcançar uma corrupção padrão FIFA.

Reunidas numa portentosa multinacional para explorar a sublime paixão pelo futebol, quem discordar, cai fora. Quantas CBFs terão a coragem para criar uma FIFA do B? Por isso, estão juntinhas, irmanadas. Mais fácil ampliar o Conselho de Segurança da ONU do que criar uma CPI em Zurique.

O tal “clima de Copa” é um estado de espírito quadrienal, que começa com resmungos, ceticismo, e acaba em urras, delírios. Os cientistas o identificam como sinônimo de complacência.