Friday, 26 de July de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1298

Ambiente: mídia apanha com razão e sem

Único jornal brasileiro, ao que tudo indica, a cobrir a primeira Cúpula Internacional de Mídia e Ambiente, em Kuching, na Malásia, com o enviado especial Reinaldo José Lopes, a Folha destaca hoje que os participantes do evento acusaram os meios de comunicação de saturar o público com tragédias.

São duas as queixas. Uma é a concentração do noticiário ambiental em desastres: acabou o desastre, acabou o interesse pelos problemas que o provocaram e pelas ações que poderiam tê-lo impedido ou reduzido.

O enviado da Folha cita o secretário-geral da Associação das Nações do Sudeste Asiático, Ong Keng Yong. Tomando como exemplo a cobertura do tsunami, no fim do ano passado, ele disse que poucos jornais mencionaram o fato de que os países que haviam conservado seus manguezais tiveram muito menos perdas do que os outros.

E o geneticista e divulgador canadense David Suzuki fez um comentário do qual ninguém que já tenha entrado numa redação haverá de discordar. “A mídia”, comparou ele, ironicamente, “consegue prestar atenção nas coisas pelo mesmo tempo que um beija-flor’.

A segunda reclamação é mais pesada. Segundo os queixosos, “jornalistas de gabinete” ligados a ONGs ambientalistas difundem uma espécie de terrorismo ideológico. O mais frequente noticiário alegadamente alarmista seria o que aponta para o cataclismo do aquecimento global.

Na realidade, a primeira queixa tem muito mais fundamento do que a segunda. O aquecimento global já deixou de ser uma hipótese. É algo comprovadamente em curso e comprovadamente associado ao efeito estufa – as emissões de gás carbônico resultantes da queima de combustíveis fósseis, como carvão e petróleo, que impedem que se dissipe da atmosfera o calor do sol”.

O que ainda não se sabe ao certo – e não é pouco – é quanto a Terra ficará mais quente, ao longo de que período, e quais serão as proporções da desgraceira para a homem e a natureza.

No Brasil, a acusação de que a grande imprensa praticamente só dá espaço para episódios de calamidades e ignora, entre outras, as coisas boas que acontecem em matéria de defesa da ecologia, foi levantada no 1º Congresso de Jornalistas Ambientais, realizado em Santos, há dois meses.

Também nessa área, a mídia se pauta pelo princípio castrador do bom jornalismo, segundo o qual “cachorro que morde homem não é notícia, homem que morde cachorro, sim”.

Mas o pessoal do pedaço nega com veemência que procure plantar na imprensa informações infundadas sobre as ações predatórias do homem em relação à natureza – um suposto denuncismo ecológico.

A coordenadora de comunicação do respeitado Instituto Socioambiental (ISA), fundado há 11 anos, Inês Zanchetta, reagiu desse modo quando lhe pedi para comentar, do ângulo brasileiro, as investidas na conferência de Kuching contra as ONGs e outras fontes do noticiário do setor:

“O jornalismo ambiental no Brasil é essencialmente honesto. Quando divulgamos informações sobre os efeitos da expansão da fronteira agrícola na Amazônia, com o desmatamento provocado pela extração ilegal de madeira na região, tiramos os dados não das nossas cabeças, mas de imagens sistematicas de satélites, devidamente interpretadas por cientistas idôneos.”

Esse é um caso típico, acrescento eu, em que os que mostram o dedo para a mídia são aqueles que têm interesse em que a mídia não mostre o que andam aprontando.

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