Friday, 26 de July de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1298

Antes de ver a rainha, Lula reina na Economist

Foram 46 perguntas e respostas – a mais extensa entrevista exclusiva, se não a mais extensa de todas já concedidas pelo presidente Lula. Como se sabe, desde que chegou ao Planalto, ele subitamente deixou de apreciar as sabatinas da mídia.


Mas, no caso, o órgão de mídia era nada menos do que a revista britânica The Economist, que representa, com o jornal também britânico Financial Times e o americano Wall Street Journal, o evangelho do mundo do dinheiro.


A entrevista, cuja íntegra – sinal dos tempos – só saiu na edição eletrônica do semanário [www.economist.com/lula], foi feita para coincidir com a visita de Estado do presidente brasileiro à Grã-Bretanha, semana que vem.


[A Economist, com 1,1 milhão de exemplares, começa a circular na Europa e na América às sextas. No Brasil, a edição impressa nos Estados Unidos bate nas bancas geralmente aos domingos.]


Considero a Economist a mais bem feita revista semanal do mundo. Tem capas belíssimas, o melhor texto, gosto e talento para a ironia corrosiva, análises consistentes, mesmo quando se discorda delas – e admirável coerência na defesa do seu ideário liberal, no sentido original da palavra, a que se mantém fiel em um século e meio de circulação.


Além da coerência, o semanário – que chama a si mesmo de jornal – tem nada menos de cinco compactas páginas de editoriais, onde explica o mundo à sua maneira e, com franqueza desconcertante, diz o que o mundo deve fazer.O quarto dos cinco editoriais da edição entrante é um bom exemplo. Dedicado ao Brasil e ao seu presidente, se intitula “A mágica de Lula”, com o sub-título “O que o presidente brasileiro, manchado pelo escândalo, deve fazer com uma segunda chance”. [www.economist.com/opinion/displayStory.cfm?story_id=5576340]


Termina assim o último dos 10 parágrafos do texto: “Ele [Lula] tem o potencial de se tornar um dos mais notáveis políticos democráticos da América Latina. Mas a maior parte do seu trabalho ainda está por fazer”.


Não menos equilibrada do que o editorial é a extensa reportagem [2.400 palavras] “O salto de Lula”, baseada em ampla medida na entrevista. [Outra matéria reproduz os principais trechos das declarações do entrevistado.]


Fiel ao seu estilo, a reportagem não cita terceiros a torto e a direito. Os poucos privilegiados são o ex-titular do Banco Mundial no Brasil, Vinod Thomas, o economista Marcelo Neri, da Fundação Getúlio Vargas, o também economista Raul Velloso, especializado em finanças públicas, os ministros Antonio Palocci e Dilma Roussef.


Vinod Thomas comparece com um elogio e uma crítica – em sintonia com o tom geral da matéria. Ele diz, primeiro, que comparar os indicadores do país quando Lula tomou posse e hoje “é como olhar para duas economias diferentes”. Mais adiante: “O Brasil fez menos do que se esperava em educação e saúde.”


Das passagens da entrevista aproveitadas na reportagem, acho que é o caso de destacar:


1. “Não quero crescer 10% ou 15% ao ano. Quero um ciclo duradouro de crescimento médio da ordem de 4% ou 5%.” [Para minha surpresa, o Economist se absteve de fazer o confronto óbvio: a China e, mais recentemente, a Índia vivem ciclos duradouros de crescimento médio na casa de 10%.]


2. “Você não pode julgar um partido porque meia-dúzia de pessoas cometeram erros.”

3. O PT sofreu um “massacre justificável”. “Tem muito a explicar à sociedade.” [O Economist nota que ao mesmo tempo “ele próprio evita se explicar”.]


O termo mensalão aparece cinco vezes no texto [e numa pergunta da entrevista]. A Economist acha que “continua sendo um mar de suposições, pontilhado por ilhas de fatos”.


Tudo lido e refletido, dificilmente os petistas poderão dizer que os ingleses também estão no “complô da mídia” contra Lula. E dificilmente os tucanos poderão dizer que eles fizeram média com o brasileiro que daí a alguns dias vai passear de carruagem em Londres e dormir no Palácio de Buckingham.


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