Wednesday, 08 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1286

Parasitas na pele de ‘educadores’

Já estou mais que acostumado a ouvir, por parte de jornalistas ditos ‘profissionais’, os mesmos e velhos discursos repetitivos que tendem a favorecer à minoria endinheirada deste país. Um bom exemplo foi o que disse recentemente certo jornalista-professor da faculdade onde estudo, em Manaus (AM): ‘Tomem cuidado com os sindicatos. Em uma greve, vocês (alunos) devem logo saber o que a paralisação pode causar de ruim: quem será prejudicado, qual o prejuízo para a cidade, para a economia, para as pessoas, etc.’


Ou seja, a repetição discursiva-ideológica, neste caso, é aquilo o que o jornalista José Arbex Jr., no livro Jornalismo Canalha, chamou de ‘demonização de movimentos populares’. Há uma clara e rígida intolerância a qualquer forma de resistência, de luta e de combate por parte das classes trabalhadoras. Quando se fala em greve, a balança da imprensa marrom logo pende para o lado de quem realmente importa aos donos dos jornais: o Estado, os empresários, os políticos, enfim, todos aqueles que podem perfeitamente ser encaixados no chamado ‘lado mais forte’.


Dessa forma, quando ouço o mesmo discurso incansavelmente repetido dentro de uma academia, sinto que o futuro do ‘bom jornalismo’ está em fase terminal. Que tipo de profissionais de jornalismo teremos na imprensa brasileira se, no local onde eles deveriam ser formados e instruídos com técnica e humanidade, acontece exatamente o contrário? A afirmação de tal professor reflete o que acontece dia-a-dia na imprensa: ausência total de diálogo, de discernimento e, o que é muito pior, de bom senso.


O discurso do Estado


Ao invés de disseminar livremente seu preconceito nas almas dos jornalistas iniciantes, nossos colegas profissionais que se aventuram nas academias como educadores em busca de um salário extra, deveriam proporcionar o debate e usar a sala de aula para ‘exorcizar’ os demônios que os perseguem nas redações. Assim, na minha opinião, o discurso correto sobre os sindicatos e suas greves seria: ‘Ouçam o que cada um (empregadores e empregados) tem a dizer, contextualizem com os acontecimentos passados e presentes, ponham tudo em uma balança, e dêem o foco mais justo e correto possível.’


É bem provável que não tivéssemos tantas aberrações nas manchetes se isso fosse transmitido nas academias de Jornalismo com maior freqüência. É uma hipótese digna de ser estudada.


Apesar de não lembrar de muitos detalhes (eu era apenas uma criança), dou um exemplo específico. Há alguns anos, em Manaus, um grupo de professores da rede pública estadual de ensino fez alguns meses de paralisação nas aulas por conta de longos anos de congelamento do piso salarial da categoria. Na época, o percentual de reajuste pedido pelos professores era até baixo, se comparados aos pisos de outros estados brasileiros.


Entretanto, ao invés de coletar estas informações (nada muito difícil, mas inconveniente aos ‘patrões’), muitos jornalistas inescrupulosos, acomodados, preguiçosos ou mesmo estúpidos, seguiram o caminho mais fácil e assumiram o discurso do Estado, publicando manchetes a exemplo desta: ‘Greve prejudica 30 mil crianças’. Simples assim.


Acordos suspeitos


É verdade que as crianças estavam de fato sendo prejudicadas, mas por quem? Pelos professores, que exigiam um justo aumento de salário, ou pelo Estado, que insistia em não reajustá-lo usando como velha desculpa a falta de verbas públicas? O resultado óbvio disso foi a manipulação da opinião pública contra a greve, o que enfraqueceu o movimento e levou os professores a lugar algum. A única coisa que eles conseguiram foram faltas a serem compensadas e muitos sábados e domingos de trabalho.


Tempos depois ficou provado que o reajuste era possível; assim como ficou provada a desonestidade (ou burrice?) da maioria dos jornalistas daquele período. A inserção de profissionais desta estirpe, de discursos afinados com os grandes empresários, seria uma prática adotada pelo sistema dominante a fim de pôr fim ao jornalismo combativo? É outra hipótese.


Esta mesma imprensa, estes mesmos jornais e estas mesmas ‘figurinhas’ de Manaus tiveram incontáveis oportunidades de se redimir, mas insistem em permanecer ao lado do grande capital, ao lado do poder, ao lado de quem paga mais. Quais foram mesmo os jornais da capital amazonense que tiveram seus proprietários flagrados em escutas da Polícia Federal fazendo acordos suspeitos com Omar Aziz, atual candidato a prefeito?


Espalhando incompetência


São criaturas como estas que se fazem de ‘grandes mestres’ do jornalismo dentro das academias. São parasitas como eles que vestem a pele de educadores com a única intenção de disseminar os velhos discursos e formar novos multiplicadores do preconceito contra as massas. São profissionais como estes que fazem de conta que não há nada estranho na imprensa e na política amazonense.


Que eu me lembre, o então governador do Amazonas que negou aos professores o justo aumento de salário anos atrás, Amazonino Mendes, anda por aí dizendo que está de volta e que vai ‘melhorar a cidade de Manaus’. É uma baita incoerência. Entretanto, os jornalistas de outrora, que viram de perto o caso da greve, estão aí nas redações de hoje e nas salas de aula das academias, mas nem se lembram do fato. Seria amnésia coletiva ou conivência declarada? De uma forma ou de outra, eles estão aí, espalhando sua incompetência.

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Estudante do 6º período de Jornalismo, Manaus, AM