Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Voto de confiança aos jovens jornalistas



Em janeiro estive numa cerimônia de formatura de alunos da Uniara, em Araraquara (SP). Fui patrono dos formandos em jornalismo. Como professor (leciono no Departamento de Jornalismo e Editoração da ECA-USP), tenho convivido com as incertezas das novas gerações em relação ao futuro do nosso ofício. É um assunto que me preocupa, evidentemente. Não raro, noto que os jovens são bombardeados com os desencantos da minha geração, sobre os quais eles não têm nem poderiam ter nenhuma responsabilidade. Penso que não temos o direito de desiludi-los em nome das derrotas que podemos ter sofrido. A profissão de jornalista é essencial à democracia, como sempre foi e deve continuar a ser. É uma escolha mais que digna: encantadora e apaixonante. Por isso, tomo aqui a liberdade de compartilhar com os leitores deste Observatório as palavras que levei aos formandos de Araraquara. Talvez seja do interesse dos que freqüentam este site. Principalmente dos que estão agora iniciando sua vida profissional. (E.B.)


 


Vocês fazem a colação de grau em meio a uma temporada de discursos pessimistas. Virou um chavão afirmar que o ofício de jornalista caiu em desprestígio porque o diploma obrigatório foi abolido. Outro lugar-comum, que traz o mesmo sinal de negatividade, são os diagnósticos que acusam o mercado de vilipendiar a função pública de informar a sociedade. O humor geral se deprimiu a tal ponto que temos a sensação de que os formandos em jornalismo recebem saudações como as que são dadas aos soldados que partem para a guerra. É como se um futuro de fatalidades e injustiças os aguardasse. É como se a sobrevivência fosse o melhor que cada um pudesse almejar.


Claro que todas essas contingências têm o seu peso e devem ser consideradas. Eu mesmo vou dizer algumas coisas sobre elas, mais adiante. Mas, antes, é preciso assinalar que esses problemas estão longe de ser o que mais importa. Venho aqui hoje com outro tipo de mensagem. Venho lhes trazer confiança. Não por acreditar que vocês precisem de motivações artificiais; trago confiança porque estou convencido, tranquilamente convencido, de que a escolha que vocês fizeram é promissora, é socialmente necessária; e poderá presenteá-los com boas emoções, com reconhecimento público e com episódios de sucesso que confirmarão, muitas vezes, que vocês fizeram a escolha certa.


Para ter uma noção inicial do que quero dizer, pensem no sabor da conquista que vocês comemoram hoje. Pensem no significado desta nossa reunião. Vocês têm hoje todas as razões para celebrar, para ter orgulho de si mesmos. O sentimento que vocês experimentam hoje é desses que a gente festeja em alto estilo – e que depois guarda como uma pequena centelha, sempre acesa, para o resto da vida. É uma chama que se mantém ao longo dos anos e, se mais adiante vierem tempos sombrios, ela terá o dom de nos guiar em noites de incerteza.


Os momentos de justa realização são assim: eles ficam em nós e, depois, quando rememorados, vêm reafirmar a nossa vocação primordial, aquilo que nos dá a razão de estar neste mundo. Eles perduram. Depende de nós, e apenas de nós, permitir que eles iluminem as jornadas que ainda trilharemos. Por isso eu faço votos de que vocês, no futuro, revivam esta cerimônia como fonte de inspiração.


Linha reta


Meditemos com serenidade e abertura de espírito sobre o esta data. O que há de tão especial nesta noite? Por que ela é tão representativa na biografia de vocês?


Deixemos de lado aquilo que é mera pompa e, às vezes, um protocolo vazio. Pensemos sobre o significado profundo dos rituais. Eles existem para marcar uma passagem. Como se fossem um nó na imensa rede do tempo, unem o período que já foi ao período que ainda virá. Um ritual de verdade, que vivenciamos não apenas como uma convenção de etiqueta, mas com engajamento emocional autêntico, partilhado coletivamente, tece um elo entre o que é matéria, ou seja, aquilo que podemos ver ou tocar, e o que é intangível, inacessível aos sentidos primários. Para alguns, mais místicos, o ritual é uma transubstanciação, capaz mesmo de lançar um fio que, por um instante fugaz, une céus e terra.


Eu, que mal conheço a terra e que jamais visitei o céu, a não ser o céu dos deleites mundanos, e mesmo assim de modo efêmero, não posso garantir que isso seja fato. Mas afirmo, com segurança, que um ritual vem sublinhar certas frases na história das nossas vidas. Um ritual simboliza e dá luminosidade ao início de novas etapas da nossa existência social. É por isso que as pessoas se casam em festas cheias de convidados: para indicar, perante os demais, que a partir daquele instante elas estão casadas e que debandaram oficialmente do mundo dos solteiros. Aliás, é também por isso que existem as memoráveis despedidas de solteiro: são rituais boêmios que assinalam a mudança de estado do cidadão. Ou cidadã. A mesma função aparece nos batizados dos recém-nascidos e dos convertidos, e até nas multidões que soltam foguete quando seu time é campeão.


Rituais atualizam o estatuto social de cada um de nós. Comunicam o nosso ingresso na sociedade, a nossa progressão, a nossa despedida definitiva – daí as cerimônias fúnebres por meio das quais nós prestamos homenagens aos mortos. Sem rituais, não haveria vida em sociedade. Sem eles, não haveria existência simbólica.


Portanto, vamos nos esmerar no nosso ritual de hoje. Como todos os outros, este também promove um vínculo entre o tempo que foi e o tempo que virá, marcando assim um deslocamento que não poderia passar em branco. Não poderia passar a seco. Nesta noite, os meninos e as meninas que vocês foram se fundem aos homens e mulheres maduros que vocês serão. Entre o menino e o homem, entre a menina e a mulher, há de ser traçada uma linha reta, reta no exato sentido de retidão. Sobre essa reta vai se sustentar, no curso das décadas, a construção de seres humanos íntegros – íntegros porque inteiros e íntegros também porque unos, indivisíveis no seu núcleo. Sobre esse alicerce em forma de linha reta, o que havia de mais precioso nos sonhos juvenis de vocês vai conviver com o que haverá de mais honroso na vida produtiva que vocês têm pela frente. Que seja uma convivência harmoniosa e produtiva.


Cicatriz da guerra


Um ritual também oficializa um pacto. Hoje, os jovens sonhadores que vocês certamente ainda são apresentam um termo de compromisso aos adultos em que vocês vão se transformar. A versão adulta de vocês é chamada a continuar, é chamada a persistir, traduzindo sonhos em projetos e, depois, projetos em trabalho.


É nesse sentido que dizem que somos todos herdeiros das crianças e dos adolescentes que fomos. Somos produtos do que fomos no passado. Vocês são produto daquilo que sonharam, assim como são rascunho do que ainda os espera. Estejam a altura disso.


Falo aqui de uma idéia recorrente, que aparece, por exemplo, em Machado de Assis, quando ele anota que ‘o menino é pai do homem’ [trata-se do título do capítulo XI de Memórias Póstumas de Brás Cubas]. Mas, embora antiga, essa idéia é negligenciada em noites como esta, como se não passasse de uma frase de efeito. Acho uma pena. Eu, particularmente, gosto dessa expressão: ‘o menino é pai do homem’. Não costumo entendê-la como se fosse uma determinação, algo dado e que não admite renegociações. Não é assim. O homem não é definido de forma acabada pelo menino que ele foi.


O futuro é uma página em branco, ou, melhor, uma página cheia de surpresas. Mesmo assim, o homem sempre será chamado a prestar contas ao menino que ele foi. Não como quem obedece às birras de uma criança, mas como quem deve saber cuidar das aspirações que a criança – e, depois, o adolescente – transmitiu a ele, um dia, num ritual, mesmo que seja um ritual particular, silencioso. Assim é que, cedo ou tarde, somos convocados a dar satisfações ao menino que é nosso ‘pai’, nosso ‘pai’ entre aspas.


O que existe aí é menos uma relação de paternidade propriamente dita, ou de filiação, e mais um elo de lealdade aos nossos anseios mais genuínos. Ela não implica obediência, submissão, ou não teríamos como nos libertar dos caprichos infantis. Muita gente já disse a vocês que amadurecer é o oposto de deixar-se escravizar pelos caprichos. É isso mesmo. Os que sucumbem a eles não conseguem crescer e acabam por se converter em potenciais tiranos ou criminosos – dois termos que, do ângulo que os pronuncio agora, constituem sinônimos. Agredirão os semelhantes e a si próprios. Não obstante, poderão ir longe, muito longe, alcançando os extremos e, um dia, terão de se dar conta de que o ponto culminante ou o abismo mais baixo a que chegaram é apenas o lugar algum. Lá não há nada que conte. E aí será tarde.


Claro que nada é simples e fácil. O capricho do menino não deve mandar no homem, mas ai do homem que imagina poder seguir sozinho, extirpando de si mesmo o sonho que herdou do menino. É possível que vocês, agora, enquanto falo, estejam se perguntando sobre o que significa ser adulto. Devo confessar que também penso nisso com assiduidade. Devo confessar algo mais grave: não sei direito o que significa ser adulto. Mas, como venho tentando ser adulto há mais tempo que vocês, eu me atrevo dar testemunho das lições que pude aprender.


Uma delas é a seguinte: torna-se adulto aquele que aprende a assimilar frustrações. Só sabe ganhar quem sabe perder. Quanto a isso, lembro que o mundo não se divide entre vencedores e perdedores, mas entre, de um lado, aqueles que aprenderam a saborear sem maiores restrições o fluxo da vida, que é maior, mais complexo e mais surpreendente que a nossa imaginação egocêntrica, e, de outro lado, aqueles que ainda se debatem acreditando que podem controlar os acontecimentos. Os primeiros aprenderão a perder e ganhar; os segundos, apanharão das derrotas e apanharão ainda mais das vitórias.


É sábio quem não repudia as desilusões, os desencantos ou os malogros, pois aí se escondem chaves para o crescimento. Do mesmo modo, tem sabedoria quem não se deixa embriagar pela vitória, pois sabe que dentro dela pode morar a cicatriz da guerra, ainda que de forma figurada, indireta, e a necessidade da guerra é sempre uma derrota, não importa quem venha a vencê-la.


Viver com prazer


Voltando à nossa formatura, peço que vocês prestem atenção: a alegria que vocês experimentam hoje não deve se confundir com soberba, com qualquer veleidade de superioridade. Ela é mais valiosa que isso: é uma completude que não depende de inferiorizar ninguém. Vocês não estão felizes porque se provaram superiores, mas porque estão em paz com o que sonharam. Aproveitem.


Como professor, tenho convivido com a geração de vocês. Conheço alguns dos dramas e dos dilemas que agora os afligem. As minhas palavras hoje pretendem dialogar com esses dramas e com esses dilemas. Eu me dirijo apenas a isso – e a isso pretendo ser minimamente útil. É minha maneira de retribuir a homenagem que vocês me prestam ao me escolher como patrono e ao dar o meu nome à turma de vocês.


Não quero incorrer nas fórmulas prontas. Seria inútil. Não quero dar receitas ou conselhos gratuitos. Quando alerto para os riscos de nos deixarmos inebriar pela euforia da glória, inspiro-me em tradições que não têm nada a ver com os truques do pensamento positivo, com a auto-ajuda barateada, nada disso. Lembro-me, entre outras, de uma passagem de Sófocles, em Antígona, quando ele diz que, para o homem, um dos maiores mistérios é seu próprio ‘irmão e semelhante, o qual não vê e não entende’. Nessa passagem, escrita há 2500 anos, Sófocles adverte sobre a nossa eterna batalha contra nossos próprios irmãos, e sobre o risco da soberba. Eis o que ele diz:




‘Se não resiste a ele [ao seu irmão], o homem é esmagado. Se o vence, o orgulho o cega e vira um monstro que os deuses desamparam.’


Esse tipo de orgulho é uma das ameaças mais sérias à nossa realização pessoal. Diante dele, é bom termos algum cuidado. Deixar-se levar por esse orgulho que cega é tão desastroso quanto se render ao estigma de derrotado. Nenhum de nós é perdedor – muito menos vocês, que hoje festejam uma conquista. Mas, saibam, vitória e derrota são categorias da superfície; são ambas impostoras, como ensinou Kipling, cujos versos, no poema ‘Se’, ecoam agora entre nós:




‘Confrontar-se com o triunfo e com a desgraça/ e tratar estes dois impostores da mesma maneira.’ [Rudyard Kipling, ‘Se’]


Eu poderia dizer que triunfo e desgraça são ilusões. Não explicam a nossa existência. Não dão a medida do valor de cada um. Repito: o mundo não se divide entre vencedores e perdedores – e, de resto, é melhor pensar o mundo sem tentar dividi-lo tanto assim.


Seguindo com as lições que pude aprender na minha longa carreira de tentar alcançar a maturidade, uma carreira sinuosa e nem sempre bem-sucedida, eu diria que tornar-se adulto talvez tenha a ver com aprender a lidar com a realidade, sem sujeitar-se inteiramente a ela. Vocês certamente já ouviram falar daquele conceito de Freud, ‘princípio de realidade’. Vou lembrá-lo aqui para sintetizar o que quero dizer: amadurecer é aprender a levar em conta o ‘princípio de realidade’, pois nem tudo se resolve pelo ‘princípio do prazer’. Claro que isso não depende da nossa vontade – o aprendizado passa por inúmeros descaminhos inconscientes, mas ele pode ser alcançado, desde que saibamos prestar atenção às dobraduras da realidade e às membranas quase invisíveis do prazer.


É claro que o prazer nos expande e nos liberta, mas nem sempre ele guarda em si o critério da verdade. Às vezes, ele pode até nos emboscar. Pensem bem: o que é o vício? O vício nada mais é do que o prazer que assume o poder sobre nós mesmos. Todo vício se apresenta como prazer e, no instante em que esse prazer passa a nos governar, converte-se em vício e nos domina. É por isso que o vício, antes de nos matar, mata a nossa liberdade. Viver além do prazer é necessário.


Outra vez, porém, devo lembrar que as coisas não são simples. Abandonar a perspectiva do prazer, a menos a meu juízo, seria uma desumanidade monstruosa – e, ainda que, também nesse campo, os acontecimentos não estejam sob nosso controle, ou pelo menos sob nosso controle pleno, seria um erro mortal. Viver sem prazer não é viver – existir sem ter prazer é, numa única palavra, morrer. Quem vive sem prazer morre em vida. Daí as complicações. Viver com prazer não pode representar a negação de viver com responsabilidade – e viver com responsabilidade não pode nos impor a supressão do prazer.


Centelha eterna


Aristóteles insistia na tese do equilíbrio, no caminho do meio, no combate aos excessos destemperados e das privações desmedidas. Nisso, o que ele ensina ainda vale. Agora: que não é simples, não é. Nem um pouco. No nosso tempo, as escolhas são mais abertas, de conseqüências mais incertas. A sociedade é menos previsível que no tempo de Aristóteles. As trilhas a que as nossas escolhas nos conduzem não estão prontas, não estão pavimentadas. É preciso que cada um saiba abrir suas próprias trilhas, pavimentando-as com os próprios passos. Os papéis que nos cabem são múltiplos, simultâneos. Nisso tudo, achar o caminho do meio ficou bem menos óbvio.


No chamado mundo adulto, encontramos armadilhas a toda hora. Nessas armadilhas, os vícios têm a peculiaridade de nos rodear, de nos assediar com os mais inimagináveis estratagemas, do canto das sereias às chantagens perversas. Vocês já notaram que não falo aqui de vícios em sentido moralista, mas no sentido daquilo que se opõe à felicidade e à virtude . Já que falei em Aristóteles, devo declarar que entendo a virtude como a busca de uma vida menos mesquinha, que nos alarga as fronteiras do espírito à medida que respeita e emancipa aqueles que convivem conosco.


Não raro, os vícios se aproximam com ofertas aparentemente contraditórias. Às vezes, prometem prazeres imediatos como sinônimos de felicidade. Outras vezes, eles nos convidam a renunciar à felicidade como se esta fosse uma reles ilusão, sob o argumento de que é preciso ser prático, é preciso ser, mais que racional, puramente racionalista, é preciso não ter pruridos morais, é preciso vencer a todo custo. Cuidado, porque isso, ainda que pareça contraditório, como já avisei, também constitui uma forma de vício. Está no outro pólo, mas é, igualmente, vício. Na política – e há muito de política em jornalismo –, esse vício pode se abrigar sob o manto do pragmatismo. Por isso, muito cuidado.


Um dia, mais adiante, talvez vocês julguem que devam prestar contas a algum senhor. Então, quando os senhores a quem vocês vierem a julgar que têm que prestar contas, que serão os senhores do dinheiro, ou mesmo o dinheiro, transformado em senhor impessoal, ou os senhores das religiões, do poder, da ideologia, enfim, quando qualquer um desses senhores cobrar de vocês um passo diante do qual vocês hesitam, acolham a hesitação. Parem por um instante. Não busquem a decisão em manuais de ética ou mesmo em textos clássicos. Não peçam conselhos aos outros. Nada disso será prejudicial, por certo, mas, antes, consultem o menino ou a menina que vocês foram. Que vocês ainda são agora.


Quando a dúvida ética aparecer, ouçam essa voz que, dentro de vocês, está intacta, cheia de sonhos, mas que, com o decorrer dos anos, tende a ser esmaecida. Essa voz saberá iluminá-los, irá protegê-los da armadilha do pragmatismo, cujos ardis devoram vocações promissoras que, depois, mal conseguem saber quando foi que caíram.


Também por essa razão, a cerimônia de hoje é vital. Ela realça e projeta a centelha que há de permanecer. Espero que vocês saibam preservá-la com delicadeza e sensibilidade.


Calor da hora


No início do meu discurso, eu disse que vocês têm hoje todas as razões para celebrar e ter orgulho de si mesmos. Eu disse isso também porque há um mérito especial em se tornar jornalista na nossa época.


Volto então a falar, apenas de passagem, das aflições que eu sei que estão por aí a espreitá-los. Entre todas, a mais comentada talvez seja mesmo a decisão judicial que teve enorme repercussão nos nossos cursos: o fim do diploma obrigatório para o exercício da profissão de jornalista. Não se deixem abater por isso. O diploma específico em jornalismo não é exigido para profissionais de imprensa em democracias de maior tradição que a nossa – de onde vêm, aliás, alguns dos principais ensinamentos do ofício que exercemos.


Não é porque o diploma é obrigatório que a profissão se torna melhor ou pior. São várias as profissões no Brasil que não requerem diplomas específicos. Isso não é um problema em si – e não deve, por um minuto sequer, fazê-los acreditar que o futuro será pior. O que conta é que vocês se diplomaram, tiveram aulas com grandes professores, e que isso os habilita de forma diferenciada a exercer essa função pública que é a de informar o cidadão e fiscalizar o poder. Há uma imensa estrada aberta para vocês. Não duvidem disso.


A nossa sociedade precisa, a cada dia mais, das redações independentes. Se bem exercida, a atividade da imprensa só irá crescer entre nós. O mundo está aí, de portas abertas para vocês. As boas histórias estão aí para ser bem contadas. As notícias estão à espera de vocês para ser descobertas e publicadas. E vocês estão preparados para isso.


Portanto, eu não perderia tempo com esse tipo de aflição. O que mais me preocupa, hoje, são as forças que procuram sitiar e confinar a liberdade. Sei que vocês também estão atentos a isso. A figura da censura prévia, imposta por decisões judiciais, vem privando a cidadania de ter acesso às notícias a que ela tem direito. Aí, sem dúvida, temos um anacronismo a remover. A democracia só é plena onde o poder não impõe obstáculos ao direito à informação. E, embora alguns desses obstáculos ainda resistam em nossa sociedade, tenho certeza de que em breve seremos capazes de superá-los. A democracia sairá ganhando.


Não tenham medo da liberdade. Não concedam. É dentro dela que irá prosperar o que de melhor vocês têm a oferecer para a sociedade. É dentro dela que vocês irão amadurecer. Descuidar da liberdade seria como descuidar dos meninos e meninas que vocês devem guardar vivos pelo futuro afora. Vocês, assim como todos os jornalistas, não têm o direito de renunciar à liberdade. Não renunciem. Não renunciem e verão que o nosso ofício é feito de uma paixão inigualável, emocionada e justa, de uma combinação rara entre a ética e a estética, entre política e arte, que a diferencia de todas as outras profissões.


Termino as minhas palavras com meus melhores votos de felicidade. Sejam bons naquilo que escolherem fazer. Sejam prósperos. Criem novas narrativas, novos enunciados, novos negócios. O jornalismo é a escolha de vocês. É também a minha e eu posso garantir que vale a pena.


Por isso, enfim, o nosso ritual desta noite é tão fecundo. A vida, nesta noite, sorri para vocês. Saibam sorrir para ela também. Vocês estão de parabéns. As famílias de vocês estão de parabéns. Os professores de vocês estão de parabéns. Celebrem. Comemorem. Brindem. Bem-vindos à profissão que narra à história humana no calor da hora. Bem-vindos à primeira hora de mais um capítulo da calorosa história da vida de vocês.

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Jornalista, professor da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo