Friday, 26 de July de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1298

João Domingos

‘A eleição para a presidência da Câmara levou pelo menos três parlamentares a tentarem um salto de qualidade em suas carreiras políticas. José Thomaz Nonô (PFL-AL), presidente em exercício, atual primeiro vice-presidente, Ciro Nogueira (PP-PI), atual segundo vice-presidente e corregedor da Câmara, e João Caldas (PL-AL), quarto secretário, são todos candidatos à sucessão de Severino Cavalcanti (PP-PE), que renunciou na quarta-feira.

Quem tenta o salto mais alto é o deputado João Caldas (PL-AL). Ele sabe que não tem nenhuma condição de chegar a um segundo turno, que parece ser disputado por três candidatos – Nonô, Aldo Rebelo (PC do B-SP) e Michel Temer (PMDB-SP). Mesmo assim, foi o primeiro a se inscrever para concorrer à eleição de quarta-feira, quando será escolhido o novo presidente da Câmara. Só o fato de disputar o cargo mais importante da Casa, segundo na linha de sucessão do presidente da República, é a certeza de ocupar pelo menos um bom espaço na mídia.

Como é um dos comandantes do baixo clero, Caldas pode negociar votos com alguns dos candidatos com maiores chances de vitória. Ao fazer sua campanha, quase não pede votos para si. Mas costuma lembrar ao parlamentar abordado que Ciro Nogueira está na disputa. É o cabo eleitoral do candidato.

Também disputa a presidência da Câmara sem nenhuma possibilidade de vitória o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ). Ele concorreu na eleição que elegeu o pernambucano Severino Cavalcanti e teve apenas dois votos – o dele e o de um eleitor que até hoje ele não conseguiu identificar.

O próprio Bolsonaro costuma dizer que não disputa para vencer. Da última vez, concorreu apenas, segundo diz, para atrapalhar o candidato do PT e do governo, Luiz Eduardo Greenhalgh (SP). Nem precisava. Greenhalgh foi vitimado dentro do próprio PT pelo dissidente Virgílio Guimarães (PT-MG). Nessa confusão, o vencedor acabou sendo Severino.

Sem existência oficial, a bancada do ‘PM’ (Partido do Mensalão) se move na Câmara para influenciar a eleição do próximo presidente da Casa.

Não é um grupo de se desprezar. São 16 parlamentares ameaçados de cassação por terem sido citados, no relatório combinado da CPI dos Correios e do Mensalão, por algum tipo de envolvimento com o esquema operado pelo publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza.

O nome do coração da bancada do mensalão seria Ciro Nogueira.

O grupo tem representantes de seis partidos (PT, PP, PL, PTB, PMDB e PFL), possui contornos imprecisos, mas ultrapassa o número de citados porque ainda são desconhecidos os nomes de deputados que teriam sido abastecidos pelo duto do PP, supostamente comandado por José Janene (PR).’



Clóvis Rossi

‘Luzes, Câmara, ação’, copyright Folha de S. Paulo, 24/9/05

‘Talvez a solução para o problema da política brasileira (sim, a política brasileira tornou-se um problema ou sempre o foi) seja reproduzir o que aconteceu com aquele jato da JetBlue, cujo quase desastre foi transmitido ao vivo para os passageiros quase vítimas.

Seria apenas uma questão de inverter a direção para onde olham as câmeras ou de fazer um ‘celebrity show’ às avessas. Em vez de o público ficar em casa, olhando aquele punhado de famosos-quem-mesmo?, os deputados e senadores é que ficariam trancados no Congresso durante um certo tempo, enquanto os eleitores seriam focalizados fazendo seus comentários a respeito deles e da política em geral.

Mas não os comentários do tipo ‘o povo fala’ a que as tevês recorrem com freqüência. Seriam as conversas do cotidiano, no botequim, nos locais de trabalho, nos intervalos dos telejornais, na mesa do café com a família, no almoço de domingo, no churrasco dos amigos, no vestiário da ‘pelada’ e assim por diante. Ou seja, ‘reality’ comentários.

Imagino que os nobres parlamentares sentiriam o mesmo pânico que deve ter invadido os passageiros do jato ao ouvirem especialistas discorrerem sobre as chances de sobrevivência das quase vítimas (engraçado como a TV sempre tem um especialista à mão para tudo, desde a influência da galinha na arte medieval até quase queda de jatos).

O mesmo pânico talvez seja pouco. O que se fala aqui em baixo sobre os políticos em geral, quase sem exceções, é impublicável.

Mas eles parecem não se dar conta ou não ligar a mínima. Tanto que estão, de novo, brincando de eleger o presidente da Câmara sem o menor respeito pela necessidade de restaurar algo do prestígio da instituição.

Talvez, então, um show em que sejam não os personagens, como agora, mas as vítimas do falatório, lhes devolvesse o fio terra há muito perdido. Ou talvez dissessem apenas, sobre o falatório: ‘Faz parte’.’