Thursday, 02 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1286

Moacir Japiassu

‘O considerado Marco Antonio Zanfra, que é assessor de imprensa e por tal razão obrigado a ler tudo quanto é notícia de jornal, deparou com esta obra-prima publicada no Diário Catarinense, enterrada abaixo do título Encontrado corpo sem cabeça:

(…) Ainda ontem, eles (os peritos do IML) tentariam recolher amostras de sangue ou de urina para identificar a causa da morte. Também examinariam a arcada dentária, que pode ajudar na identificação da vítima.

Zanfra, veterano do tempo em que jornalista jamais mostrava o pau antes de matar a cobra, fez a seus zíperes a seguinte e simples perguntinha:

Para examinar a arcada dentária, não seria aconselhável que eles encontrassem a cabeça antes?

Janistraquis, que freqüentou redações no tempo em que nem se mostrava o pau, comentou:

‘Considerado, se os repórteres de hoje forem matar antes de mostrar, Brasília, por exemplo, seria o paraíso sem pecado de todas as cobras criadas…’

É verdade; os tempos são outros e tantas são as corais, jararacas e maracabóias que não há pau que sempre dure nem Gushiken que se acabe.

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Inteligência vs. má-fé

Deu no jornal A Notícia, de Santa Catarina:

Minoria

Morador há dois anos no Rio de Janeiro, o escritor catarinense Deonísio da Silva alude à frase de Nelson Rodrigues – ‘Toda unanimidade é burra’, reproduzida aqui, sábado – para dizer que lá encontrou novos motivos para, infelizmente, continuar em minoria: defender o direito de o cidadão que quiser, por meios legais, adquirir uma arma, que possa fazê-lo.

Questiona: ‘A sociedade brasileira precisa tomar consciência de que a proibição é o caminho mais rápido; nem sempre, porém, o mais eficiente. Proibida a venda, virá inevitavelmente o comércio paralelo. No plebiscito, votarei a favor das armas. Eu não as quero para nada, mas quero defender o direito de quem as quer, às vezes, não porque as queira, mas porque precisa delas¨.

Teme que se for aprovado o ‘não’, os bandidos poderão ter certeza de entrar na casa de quem quiserem, sem temer arma nenhuma. Observa que hoje ainda temos a nosso favor o benefício da dúvida. ‘O bandido sabe que poderá ser recebido a tiros. Ou alguém acredita que na eventualidade de desgraça assim poderá chamar a polícia?’.

Janistraquis festejou: ‘Estamos em boa companhia, considerado!’

(A propósito, clique no Blogstraquis e leia o artigo de Ruy Alberto Paneiro sobre facciosa matéria do Globo Online e veja também no que deu esse negócio de desarmamento em vários países.)

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Acidente

O considerado Ageu Vieira lia o Estadão quando foi gravemente atingido pelo seguinte título:

Choque de trem e ônibus deixa mais de 14 mortos na Ucrânia

Kiev – Um choque de trem e ônibus deixou mais de 14 mortos, entre eles duas crianças, nesta quinta-feira, na região de Odessa, sul da Ucrânia, informou a imprensa local. Pelo menos oito pessoas ficaram feridas, e delas quatro em estado grave, no acidente causado, ao que tudo indica, pelo descarrilamento de um trem que transportava carvão, informou a agência de notícias Interfax citando fontes de equipes de resgate.

Mais confuso do que Severino em Nova York, Ageu conseguiu reagir:

Mais de 14 é quanto? 15? Então, por que não dizer 15?

E o famigerado ‘pelo menos oito pessoas’? Ufa! Pelo menos oito pessoas ficaram feridas, e quatro delas em estado grave…

E, afinal de contas, quem informou a Agência Estado foi a imprensa local ou a agência de notícias Interfax?

E a precisão na causa do acidente? ‘…Ao que tudo indica’ é o ápice do melhor jornalismo!

Ainda bem que foram só seis linhas de texto…

É mesmo. Ainda bem.

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Sérgio Augusto

O mestre nos revela: o que aconteceu em Nova Orleans não foi surpresa para muitos ecologistas-e muito menos para um geógrafo chamado Jared Diamond, ‘um expert em catástrofes, um arqueólogo de calamidades coletivas, um pesquisador das hecatombes que há milênios castigam o nosso planeta e alteram o curso de sua História (…) Poucos parecem conhecer tão bem quanto ele o caminho para o Apocalipse e como tentar, ao menos tentar, contorná-lo.’

Leia no Blogstraquis a íntegra do artigo, originalmente publicado no caderno Aliás, do Estadão.

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De misses…

O considerado Fausto Ryo Osoegawa recebeu e repassou esta obra-prima de concurso de miss:

Pergunta: Se houvesse um holocausto nuclear, qual casal

(homem + mulher) você escolheria para preservar e multiplicar a raça humana?

Resposta: O Papa e Madre Teresa de Calcutá.

(Carolina Zuniga, durante concurso de Miss Chile.)

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…e garotas

O mesmo Osoegawa também enviou engraçadíssima cena brasiliense que percorre a internet. O título é Confidências de uma cafetina e começa assim:

Baixa tanto político no meu privê que coloquei o nome do estabelecimento de ‘Metida Provisória’. Esta semana, com tanta gente para me aparecer, adivinha quem resolve dar o ar da graça? Severino…

(A história continua no Blogstraquis.)

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Carabina

O considerado Moisés Pregal leu no Extra, irmão mais moço de O Globo, acocoradinho sob o título Homem é preso com cocaína e maconha em Itaipuaçu:

RIO – Rafael Castilho da Silva, de 23 anos, estava em frente a um bar na Rua São Bento da Lagoa, em Itaipuaçu, quando despertou a atenção de policiais que estavam próximos à região. Ele, que confessou ser traficante, foi revistado e foi preso com R$100 e 17 papelotes de cocaína. Os policiais encontraram 2 tabletes de maconha (com cerca de 300g) e uma balança de precisão na casa do rapaz. O pai de Rafael disse não saber que o filho era traficante. Na casa, a polícia também achou uma arma e uma carabina. Neste momento, os dois estão na 82ª DP (Maricá).

Moisés sempre imaginou que carabina fosse uma arma e Janistraquis, mais vivido do que ele, tinha certeza disso:

‘Tinha certeza, considerado; tinha. Hoje em dia, é bom não se ter certeza de nada neste país de m…’

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Marcos de Castro

Cinco anos depois da rara experiência que foi a revista Jornal dos Jornais, o considerado Marcos de Castro, jornalista do tempo em que jornalista gostava de literatura, colhe o que plantou naquele terreno modestamente bem arado e fertilizado: reuniu os 21 textos de sua lavra ali publicados entre março de 1999 e dezembro de 2000, muito podou e mais ainda acrescentou, juntou outros textos especialmente escritos e reuniu tudo no livro Caminho Para a Leitura (Editora Record).

A coluna de Marcos de Castro em Jornal dos Jornais, intitulada Parágrafo Primeiro, tinha como objetivo ensinar o caminho das pedras aos estudantes de jornalismo, pois, como sabemos, quem não lê, não escreve, e focas e até veteranos lêem muito pouco ou quase nada. O livro deste mestre em jornalismo e língua portuguesa, desde já indispensável para todos nós, é um prático, inteligente e intensivo curso para quem deseja se ilustrar com o que de melhor produziu a literatura brasileira.

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Intelectuais

Leia no Blogstraquis o excelente artigo de Boris Fausto, um verdadeiro professor da USP, intitulado Os intelectuais e a crise e publicado na seção Tendências/Debates da Folha de S. Paulo. Não dá pra não ler!!!

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Ratimbum

O considerado Roldão Simas Filho, diretor de nossa sucursal em Brasília, de cuja varanda pôde escutar a freada do carro que quase jogou longe o casal presidencial no desfile de 7 de setembro, pois Roldão lia a revista Nova Escola quando deparou com um anúncio da TV Ratimbum cuja chamada era Entretenimento com Diversão – Este é o canal!

Roldão, que nunca confundiu vaia com aplauso, protestou:

Ora bolas, entretenimento e diversão são sinônimos! É como se alguem sugerisse comer aipim com mandioca.

‘Ou com macaxeira!!’, gritou Janistraquis lá da cozinha.

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Fecais

O considerado Camilo Viana, diretor de nossa sucursal em Belo Horizonte, envia frase imortal do deputado federal Mauro Lopes (PMDB-MG):

‘O povo bebe água com clorofórmio fecais!’

Fascinado, Janistraquis comentou:

‘Considerado, se o deputado fica indignado com clorofórmio na água de beber dos mineiros, avalie quando ele souber a quantidade de coliformes fecais por mililitro…’

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Nota dez

O considerado Elio Gaspari deita e rola com o talento neste artigo que começa assim:

As humilhações impostas aos brasileiros que depositaram esperanças no Partido dos Trabalhadores parecem não ter fim. Lula pediu ao ministro Jaques Wagner que socorra Severino Cavalcanti. Ver o PT na base severina vai além da fantasia do Kama Sutra da corrupção. É algo como imaginar os cristãos defendendo o palácio de Nero, Robespierre namorando Maria Antonieta ou o papa Leão 1º convertido ao paganismo de Átila. Caso de estelionato emocional.

Leia íntegra no Blogstraquis.

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Errei, sim!

‘IMPOTÊNCIA – Intrigante título de primeira página do Diário Popular, de São Paulo: Médico garante que impotência de industrial tem cura. Meu secretário pensou em voz alta: ‘É… a Ciência tem seus caprichos. Impotência de industrial tem cura; já a de jornalista…’ Trata-se, no mínimo, de medonho preconceito da Ciência, devo admitir.’ (abril de 1993)’



José Paulo Lanyi

‘Carta ao Moacir Japiassu’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 8/09/05

‘Prezado Japi, leio os seus artigos desde a época em que eu estava no colegial e pensava em ser jornalista. Você mantinha uma coluna na revista Imprensa. Eu lia e ria. Tudo me parecia jocoso. Dos erros cometidos pelas suas ‘vítimas’ à sua verve ao abordá-los.

Quis o acaso ou o destino que eu viesse a ter uma coluna na mesma revista Imprensa – quando você já não estava mais lá- e, tempos mais tarde, eu tivesse o prazer de lhe dar as boas vindas como colega de espaço neste Comunique-se.

Para mim é uma honra. A despeito de algumas críticas necessárias que lhe fiz, até mesmo publicamente, como quem lhe deve a lealdade da isenção, admiro-lhe o olhar cirúrgico e, sobretudo, o estro literário que me é tão caro, nestes tempos em que jornalista mal consegue escrever o básico.

Nos últimos dias andei pensando em uma ressalva que lhe fizeram há uns três anos. Um notável especialista em textos jornalísticos desaprovava-lhe, Japi, o trabalho ‘sarrista’, o ofício agridoce de catalogar o ridículo.

Ele preferia ensinar sem expor, mostrar os erros genéricos, substituir o incorreto pelo certo. Nada de humor à custa da imperfeição alheia. Tal era o pensamento de quem lhe dedicava reservas.

Guardei a observação e pus-me a refletir sobre isso, com a alma dividida.

Hoje tenho a resposta.

Tive que me tornar fonte para divulgar as minhas próprias atividades artísticas. E senti no lombo a negligência a que se têm entregado, sei lá, dois terços do universo que compõe a nossa ‘raça’, como bem diz, com evidente e justificado desprezo, um realizador amigo meu.

Há os que copiam o release – o que me envergonha; há os que omitem o fundamental e tecem loas ao acessório – o que me envergonha; há os que ouvem uma só fonte e, ‘por falta de tempo’, saem a publicar o imperfeito – o que me envergonha; há os que erram informações básicas, por mera falta de revisão – o que me envergonha; entre aspas, há os que pronunciam palavras pela boca do entrevistado (esse, que nunca as pronunciou) – o que me envergonha; há os que não entenderam nada e publicaram o que nunca entenderão, pois, por preguiça ou auto-suficiência, nunca saberão que não entenderam – o que me envergonha; há os que não questionam nada, rendem-se a qualquer conceito e se deixam emprenhar – o que me envergonha.

A resposta é sim, Japi! Exponha-os, defenda-os de si mesmos e dos demais! Seja o Aretino, o Gregório, o Boca do Inferno dos nossos tempos!

Alguém tem mesmo que se levantar contra a profusão de textos deploráveis que se cometem por este imenso e castigado País.

Faça o que tem que ser feito! Ninguém tem pena deles, Japi, as fontes e os leitores estão inermes! Então…

Abraço do Zé Paulo.’



LITERATURA DE CUBA
Antonio Gonçalves Filho

‘Cuba, a palavra exilada’, copyright O Estado de S. Paulo, 11/09/05

‘As editoras brasileiras descobriram Cuba e os cubanos, ainda que exilados (fora e dentro do próprio país). E estão se dando bem. Em poucos meses, Cuba por Korda – obra com a produção do fotógrafo cubano Alberto Korda (1928-2002), que registrou a imagem mais popular de Che Guevara – tornou-se o livro de maior vendagem (15 mil exemplares) da Cosac Naify, que lança em outubro outro ensaio fotográfico, da brasileira Tatiana Altberg (Sí por Cuba). A Globo, animada com o sucesso de Comandante Che, biografia do guerrilheiro argentino que ajudou Fidel Castro a conquistar o poder, prepara-se para lançar uma reimpressão do livro do norte-americano Paul J. Dosal ainda este mês.

Na esteira do sucesso de Comandante Che (3 mil exemplares vendidos desde julho), a Globo coloca agora no mercado o livro À Espera da Neve em Havana, do exilado Carlos Eire. Aproveitando a ocasião, a Barcarolla lançou Provas de Contato, do poeta e jornalista exilado Raúl Rivero. A Companhia das Letras, para não perder a onda, traz ao Brasil o mais sexuado entre os escritores cubanos, Pedro Juan Gutiérrez, que chega hoje ao País para lançar O Ninho da Serpente – Memórias do Filho do Sorveteiro e participar da Feira de Livro de Belém.

Gutiérrez e Carlos Eire concederam entrevistas exclusivas ao Estado. O primeiro, assustado com tudo o que tem sido escrito sobre Cuba, alerta para a parcialidade dos relatos de escritores exilados. Diz que muitos não estão a par do atual panorama cubano, em estágio de rápida mudança, segundo ele. Não, não aconteceu nenhum milagre. Nem mesmo uma abertura castrista. Mas há algo no ar. Até bem pouco, Pedro Juan Guiterrez era ‘persona non grata’ em Cuba. Só recentemente foram lançados dois livros seus em Havana, La Melancolia de los Leones e Animal Tropical, contra cinco títulos publicados no Brasil.

Prova de que Fidel ainda domina a ilha com mão de ferro é Provas de Contato, do poeta Raúl Rivero, exilado desde abril na Espanha. Ou À Espera da Neve em Havana, de Carlos Eire. Ambos dificilmente serão publicados em Cuba enquanto o ditador viver. E, se isso acontecer até 2010, Cuba terá, então, 14 milhões de habitantes: nove dentro e cinco fora da ilha. Rivero conta em seu livro como é a vida dos que ficaram. Fala de atores que não exercem a profissão por falta de trabalho, de jornalistas obrigados a pescar para alimentar a família, de sua vida na prisão, entre ratos e baratas, de casas em ruínas, das prostitutas que transformaram Havana numa Pyongyang do Caribe, dos hospitais infectos, enfim, de um país encurralado pela miséria.

Carlos Eire recua no tempo. Fala da Havana antes de Fidel. Com nostalgia, mas não do ditador Fulgêncio Batista, que precedeu o atual. Eire descreve uma ilha caribenha de mar turquesa, céu alaranjado, lagartos passeando pelas casas e certa inocência perdida. Eire nem poderia falar do presente. Saiu de Cuba aos 11 anos, numa operação conhecida como ‘Pedro Pan’ e que levou 14 mil crianças cubanas para fora do país.

O escritor ganhou há dois anos o National Book Award, o mais prestigioso prêmio de literatura nos Estados Unidos, por À Espera da Neve em Havana. E – surpresa – na categoria da não-ficção. Novela autobiográfica, a obra transformou o professor de Religião e História na Universidade de Yale numa celebridade instantânea. Idolatrado pela comunidade cubana nos EUA, Eire teve a idéia de escrever o livro quando a custódia do garoto cubano Elian Gonzalez foi disputada pelos pais adotivos e o pai biológico há cinco anos.

O escritor era contra a volta do menino a Cuba. Lembra que, em 1962, quando Fidel fechou as portas após a crise dos mísseis, os pais de 10 mil crianças mandadas para o Exterior não puderam deixar a ilha. Eire, como elas, foi criado em orfanatos e lares adotivos americanos, até reencontrar sua mãe, três anos e meio depois. Ela conseguiu chegar aos Estados Unidos passando pelo México. Eire nunca mais viu o pai. O velho juiz municipal, que se julgava reencarnação de Luís XVI, morreu em Cuba.

Também historiador, mas sem ‘parti-pris’, o norte-americano Paul J. Dosal, em Comandante Che, fala dos erros estratégicos de Guevara e das discussões com Fidel por causa das críticas do primeiro à ex-União Soviética, retirando do ditador o título de mentor da Revolução Cubana. Guevara foi seu principal arquiteto, defende Dosal. Fidel, acrescenta, foi apenas o pedreiro.

Longe do enfoque político, o livro Sí por Cuba, da fotógrafa carioca Tatiana Altberg, de 30 anos, mostra Cuba sem ideologia. Ela passou dois meses, em1999, percorrendo as cidades cubanas e fotografando velhos, jovens e crianças. E conclui: ‘Fiquei confusa com o que vi. De um lado, velhos tentando preservar antigos valores. De outro, a solidão de jovens que querem conhecer o mundo.’ No meio, Fidel. Sempre Fidel.’



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‘Escritor exilado nos EUA diz que não pretende voltar a Cuba’, copyright O Estado de S. Paulo, 11/09/05

‘Mesmo que pudesse, o exilado cubano Carlos Eire jura que jamais voltaria a seu país. Professor de História e Religião em Yale, Eire desembarcou nos Estados Unidos com 11 anos, seguindo outras 14 mil crianças retiradas de Cuba numa operação que ficou conhecida como Pedro Pan, empreendida por pais da classe média e alta após a tomada do poder por Fidel. Eire guarda um ressentimento enorme do ditador, por ter sido separado de sua família. Seu livro À Espera da Neve em Havana não esconde essa raiva, mas é lírico e excepcionalmente bem escrito. Por telefone, de Connecticut, EUA, onde mora, ele falou ao Estado.

O seu é um livro de memórias, mas também pode ser lido como um manifesto político contra o regime de Fidel Castro. Como você o vê?

Sei que há pessoas que o idolatram na América Latina, mas digo que Fidel é o mal em progressão geométrica, um ditador em nada diferente de Stalin, Hitler, Mao Tsé-tung e Pinochet. Fidel não se importa com ninguém além dele mesmo. Inteligente, arranjou um jeito de parecer herói para as massas, criando uma religião bizarra chamada Revolução Cubana. Não há exagero nisso. É só prestar atenção em quantas vezes ele repete as palavra sacrifício em seus discursos. Sua única meta é sacrificar e reprimir o povo cubano.

O senhor é filho de um juiz e teve uma infância sem problemas financeiros em Cuba. Já nos Estados Unidos, teve de trabalhar como garçom. O senhor voltaria a morar em Cuba, se pudesse?

Não posso me imaginar em Cuba, até mesmo porque estaria morto ou na prisão. Outro dia tive um pesadelo com isso. Foi terrível. É impensável morar num país controlado por uma ditadura que diz o que você pode e o que não pode fazer ou falar. Não. Minha relação com Cuba acabou. Não volto nunca mais.

A Casa Branca alertou os cidadãos americanos que visitam Cuba para o fato de estarem violando a lei. Você é favorável ao boicote turístico?

Não me importo que americanos visitem Cuba. Incomoda-me o fato de os cubanos não poderem conhecer outros países ou manter contato com turistas sem ser ameaçados pelos espiões do Comando de Defesa da Revolução. Tenho um tio e uma tia lá e sei que teriam problemas se fossem me visitar no hotel. Os cubanos são tratados como cidadãos de segunda classe.

O senhor dá aulas de Religião. Acredita que a visita do papa João Paulo II não serviu para mudar nada em Cuba?

Serviu para atrair alguma ajuda humanitária na ocasião, mas não deu em nada. Ou pior: ajudou a identificar pessoas que o regime considera suspeitas. Minha tia, que dá aulas de catecismo para crianças, tinha apenas dois alunos antes da visita do papa. Depois dela, o número cresceu para 30, mas ela teve de fornecer a lista dos nomes para o Comitê de Defesa da Revolução, provavelmente para identificar infiéis aos ideais revolucionários. Ela perdeu todos os alunos.

Muitos dos refugiados cubanos revelam uma tendência ultraconservadora. Mas você investe contra a censura de Fidel aos filmes em À Espera da Neve em Havana. Foi seu primeiro embate com o regime?

É irônico. Não sei até hoje por que alguém baniria os filmes produzidos por Wal Disney. Brinco com a possibilidade de Bambi ter sido censurado por ser gay, mas, no fundo, é isso mesmo. Fidel não suporta nem Disney nem os gays. É um ‘macho’ latino e não admite a alteridade. Enfim…’



JORNALISTAS & ASSESSORES
Márcio Ferreira

‘Um Katrina para as assessorias de comunicação!’ , copyright Comunique-se (www.comunique-se.com.br), 6/9/05

‘ ‘O título deste artigo deveria mesmo ser ‘Jornalistas, tremei!’ , e com a mesma exclamação. Quem é jornalista e trabalha na área de Assessoria de Comunicação, Assessoria de Imprensa ou Comunicação Empresarial, deve tomar cuidado. Para quem não sabe, estas atribuições, que eu como jornalista, assessor e professor de Assessoria de Comunicação há quatro anos, ainda não tinha me dado conta, não são, segundo o CONFERP e suas representações regionais, para o nosso bico. Não são, não podem ser, não devem ser e ainda são passíveis de multa, caso jornalistas se metam a besta de atuar nesta área! Isso mesmo, multa.

A resolução de nº 43, que trata de definir as funções privativas e as atividades específicas do profissional de Relações Públicas, nos termos da Lei 5.377, diz que os RPs podem atuar na:

I) comunicação estratégica, com o objetivo de atingir de forma planificada os objetivos globais e os macro-objetivos para a organização;

II) comunicação dirigida, com o objetivo de utilizar instrumentos para atingir públicos segmentados por interesses comuns;

III) comunicação integrada, com o objetivo de garantir a unidade no processo de comunicação com a concorrência dos variados setores de uma organização.

Até aí nada. O mais está na mesma resolução, no artigo 3º, quando começa a falar das ‘ funções privativas da atividade profissional de Relações Públicas’ :

1) planejamento estratégico da comunicação; comunicação corporativa; campanhas institucionais de informação, integração, conscientização e motivação dirigidas a público estratégico e à informação da opinião pública e em apoio à administração, recursos humanos, marketing, vendas e negócios em geral;

2) coordenar, implantar, supervisionar, avaliar, criar e produzir newsletters e boletins informativos eletrônicos ou impressos, house-organs, jornais e revistas institucionais de alcance interno ou externo, relatórios para acionistas, folhetos institucionais, informações para imprensa, sugestões de pauta, balanços sociais, manuais de comunicação, murais e jornais murais;

3) elaborar planejamento para o relacionamento com a imprensa:

a) definir estratégia de abordagem e aproximação;

b) estabelecer programas completos de relacionamento;

c) manter contato permanente e dar atendimento aos chamados e demandas;

d) elaborar e distribuir informações sobre a organização, que digam respeito às suas ações, produtos, serviços, fatos e acontecimentos ligados direta ou indiretamente a ela, na forma de sugestões de pauta, press releases e press kits, organizar e dirigir entrevistas e coletivas;

e) criar e produzir manuais de atendimento e relacionamento com a imprensa;

f) treinar dirigentes e executivos para o atendimento à imprensa, dentro de padrões de relacionamento, confiança e credibilidade;

4) desenvolver estratégias e conceitos de comunicação institucional por meios audiovisuais, eletrônicos e de informática, Internet e Intranet;

5) definir conceitos e linhas de comunicação de caráter institucional para roteiros e produção de vídeos e filmes;

6) organizar e dirigir visitas, exposições e mostras que sejam do interesse da organização.

7) coordenar e planejar pesquisas de opinião pública para fins institucionais:

Se você é jornalista e chegou até este ponto do artigo, deve estar tão estarrecido como eu fiquei no último sábado (03/09), durante o IV Enjac – Encontro de Jornalistas em Assessoria de Comunicação, na palestra de Mario Carlos Silva Lopes, Presidente do Conselho Regional de Relações Públicas do RJ. Ah, um detalhe importante: esta resolução é de 2002. E acreditem, tem mais, muito mais. Para quem quiser ter a idéia total do estrago que esta resolução pode fazer na profissão do jornalista, é só acessar www.conferp.org.br/pg_resolucoes_conteudo.htm.

Para o CONFERP, a despeito da formação do profissional de Relações Públicas, que como os de Jornalismo, passa pelas faculdades de Comunicação do país, não tem na graduação – e acho que só com uns cinco MBAs e algumas Pós para conseguir fazer tudo que elenca na resolução nº 43 – uma formação tão ampla que garanta não só a qualidade como o conhecimento mínimo dos assuntos acima, a idéia é abraçar tudo que o mercado de comunicação oferece, entrando também no reduto da publicidade, se for feita uma leitura um pouco mais cuidadosa da nº 43.

E o impacto desta resolução vai mais longe. Já é fato que alguns editais de licitação de empresas que contratam Assessorias de Comunicação, tem se calçado da preocupação de seguir a resolução no que tange, segundo o CONFERP, a necessidade de quem lida com o negócio da comunicação estar registrado lá no Conselho de Relações Públicas. Isso porque o CONFERP tem multado empresas e o valor da fatura chega até R$ 15 mil.

Depoimento de Delmar Marques, Diretor da DM Textual Editoração Eletrônica em São Paulo, no dia 04/09 no Comunique-se, dá o tom da celeuma que está criada por conta desta resolução. Ele pede que o Sindicato dos Jornalistas de São Paulo ‘se comprometa em pagar todas as multas que jornalistas tomarem dos conselhos de relações públicas por invadir o mercado deles’ . Segundo Marques, ‘em todo o resto do mundo civilizado, assessoria de imprensa é função de RPs’ e se apóia no fato, segundo ele, ‘do TST ter baixado súmula declarando oficialmente que assessoria de imprensa não é função jornalística’ .

O fato é que em todo o país crescem as assessorias de comunicação e as atividades de assessoria de imprensa feitas por jornalistas. Os anúncios de jornais são claros ao mostrar o comportamento do mercado quando procura um profissional para este fim. É só olhar os classificados dos jornais ou os sites de emprego para ver que qualificação é pedida para as vagas de assessoria de comunicação. Está lá, é jornalista que se pede.

Ninguém procura ocupar uma vaga de Assessor de Imprensa, desculpe, com um RP. Ao buscar abraçar o mercado como um todo e criar uma reserva, o CONFERP corre o sério risco de engessar a comunicação ou incentivar a burla. Uma empresa do eixo Rio-São Paulo, ao se ver obrigada a ter registro no conselho para participar de uma licitação não titubeou, registrou-se no CONFERP e na hora de contratar o profissional para atender a conta, contratou um jornalista.

Na visão de muitos jornalistas – e eu não quero acreditar nisso – a reserva criada tem caráter arrecadatório, pelos vários problemas que cria e pela quase impossibilidade da aplicação na sua essência. Primeiro a dificuldade que o órgão terá para fiscalizar a aplicação da resolução, segundo porque é, como o nome diz, apenas uma resolução e não uma lei, portanto carece de legitimidade, com todo o respeito ao Conselho. Por fim, a despeito do entendimento do órgão regulamentador da profissão de Relações Públicas, os jornalistas conseguiram, nos últimos 20 anos, provocar o crescimento, o desenvolvimento e a ascensão das Assessorias de Comunicação ao patamar de empresas de primeira necessidade no ambiente empresarial, seja pelos cases de sucesso que produziram, seja pela adequação à segmentação.

O fato é que o MEC entende que na grade curricular dos cursos de jornalismo deve constar a disciplina de assessoria de comunicação, nas entidades que pensam a comunicação como o Fórum Nacional dos Professores de Jornalismo, FENAJ, Intercom, e até mesmo em Mestrados, a Assessoria tem sido discutida pelos jornalistas.

A resolução nº 43 tem, porém, algumas utilidades. Mostra a necessidade de os jornalistas e, agora, as empresas de comunicação, se unirem para que haja em definitivo a regulamentação por conselho da nossa profissão. O novo modelo do anteprojeto do CFJ, que foi elaborado com ajuda da OAB chega em ótimo momento. E, com escusas, impede a possível fadiga que o ‘super’ profissional de RP terá se for seguir à risca o que o CONFERP trata na sua resolução.

Enfim, o risco para os jornalistas assessores existe. E eu como um deles – e vai ter um monte no Rio de Janeiro entre os dias 22 e 25 de setembro no Enjac Nacional, no Hotel Glória – me preocupo duplamente: além de trabalhar como jornalista em Assessoria de Imprensa, sou professor desta disciplina na Universidade Veiga de Almeida há 4 anos. O que eu vou falar para meus alunos de jornalismo que se empolgam com a possibilidade de trabalhar em uma assessoria de comunicação com o estrangulamento do mercado?

– Troquem de curso e vão fazer Relações Públicas?

Os jornalistas, que sofreram com um Tsunami na década de 80 com o enxugamento das redações, e que constantemente sofrem com pequenas tempestades empresariais que passam com barcas nos órgãos de imprensa, têm agora uma nova preocupação. Que este ‘ Katrina’ que se aproxima, seja apenas uma tempestade tropical, e fique por lá, bem longe como está desde 2002.

Marcio Ferreira é jornalista, atua em Assessoria de Imprensa e é professor do Curso de Comunicação da Universidade Veiga de Almeida – RJ.’’