Friday, 29 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Os massacrados nos telejornais

Os telejornais vivem cometendo equívocos na distribuição de notícias na vastidão do nosso país. Neste ano de Copa do Mundo, o que não faltam são notícias sobre atrasos em obras, especulações e, infelizmente, acidentes com vítimas fatais. As obras de estádios no Norte e Nordeste sempre sofreram com as notícias descrentes dos telejornais que massacraram em suas manchetes as cidades nordestinas enfatizando, a todo instante, que os estádios não ficariam prontos para o Mundial. Ironia do destino. O primeiro estádio a ser concluído foi no Nordeste.

A Arena Castelão, de Fortaleza, ocupou os noticiários em flashes ao vivo da presidenta Dilma rolando a bola no gramado. Na mesma leva de boa sorte, a Arena Fonte Nova, em Salvador, a bola também rolou. Feitos que o sofrível Nordeste, tão castigado na paisagem pela secagem da caatinga, teve outro elefante em padrão Fifa world erguido dentro do cronograma da organização do monstro sagrado.

Em notinhas nos telejornais, onde a presidenta passa a bola ao vento, foram noticiadas as façanhas dos desprezados, muito menos do que as especulações dos “não vai haver Copa” nas terras remotas. Como em grande eco se exploravam “falta estrutura” e, ainda, “não ficarão prontas” – soavam as falas dos âncoras dos noticiários. A Arena das Dunas, na esquina do Brasil, teve suas obras concluídas no prazo e com uma ressalva: não foi simples reforma. O antigo estádio foi demolido para dar lugar ao grande “elefante branco”, que possivelmente poderá se unir e adequar-se à paisagem somando ao branco da caatinga das terras potiguares.

País renascido

E como grande ironia, o estádio escolhido para abrir o Mundial pode não ser o inicialmente previsto. Caíram do cavalo. Hoje a realidade é outra. Os jogos que deveriam ocorrer em São Paulo e em Curitiba, cidades bem defendidas pelos meios de comunicação, correm o risco de não acontecerem.

Ironia. Os noticiários curitibanos eram os que mais trucidaram as cidades nordestinas, não acreditando na capacidade das longínquas cidades provincianas de darem show em construção de arenas. A previsão – ou seria profecia? – é que a Arena da Baixada seja inaugurada somente em meados de maio. Estão correndo a passos tortos para marcar gol, com o intuito de a Baixada não ser rebaixada.

Essa cultura, enraizada pela televisão, construída pelos noticiários, em que o Norte e Nordeste são postos sempre como a lanterna do “campeonato no Brasil”, tende a ser destruída e reconstruída junto com as arenas e a Copa Fifa para os gringos verem. Ficou vicioso falar do Nordeste envolto no estereótipo de secas, burros de cargas, paisagem híbrida e povo tísico. Quando se falou em atrasos nas obras no Nordeste, os telejornais corriam e especulavam, a queda das cidades sedes, não davam nenhuma escapatória para desoladas províncias. Diferentes das arenas sulistas, para a quais sempre mostram positivismo, mesmo o tempo correndo e o segundo tempo terminando, ao passo de não haver chance de prorrogação.

Os pontos positivos que saem do Norte e Nordeste os telejornais das regiões mais “evoluídas” do Brasil têm dificuldades em assumir. Os gringos gostam do Nordeste e constataram que as manifestações de junho começam e saíram da caatinga. Parece que os brancos dessas paisagens deixam por consequência seu registro histórico nulo.

Onde tudo começou nesse quinto dos infernos de Portugal, tem muita história rolando e transformando todo o resto no lugar berço da cultura brasiliana. Mas daremos sempre ao César europeu ou americano os feitos mais grandiosos. No Brasil, o César é sempre o Sul, mesmo que a taça seja de direito do Norte. A Copa e as transformações sociais estão sendo feitas no Nordeste, basta os telejornais assumirem que o Brasil está renascendo no branco das paisagens.

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Francisco Júlio Xavier é estudante de Comunicação Social