Friday, 26 de July de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1298

Começou o linchamento

Começou o linchamento do mensalão. Contrariando os apelos do ex-presidente Lula, querendo evitar a volta do maior escândalo do seu governo à mídia em pleno ano eleitoral. Mas, depois da clássica foto dele apertando a mão do companheiro Maluf, nada mais surpreende a população. O fato é que o evento jurídico mais esperado dos últimos sete anos já está nas bancas.

A revista Época publicou um artigo especial denominado: “Mensalão, os fatos”, por Marcelo Rocha e Murilo Ramos. Um belo artigo, não fosse por uma única frase: “A miríade de provas que constituem os autos, examinados por Época, não deixa dúvidas: o esquema que ficou conhecido pelo nome de mensalão é um fato”.Então pra quê julgamento? Curiosamente, após a matéria do Supremo Tribunal de Justiça de Época, surge uma entrevista com Carlos Velloso com o seguinte título: “A imprensa não tomou partido”. Sinceramente, soou como uma tentativa de legitimar a fantasiosa ideia da imparcialidade jornalística. Mas, ao julgamento.

Na leitura do texto de abertura, o relator Joaquim Barbosa deu seu parecer favorável à condenação de toda a “quadrilha”, com exceção de apenas dois acusados. Uma brilhante introdução ao julgamento. A repercussão nas mídias sociais foi de aprovação. O ministro recebeu elogios, fotos ao lado do texto “meu herói é ‘negão’ e usa capa” (por Eduardo Calmon) e coisas do gênero. O jornalista Lúcio Flávio Pinto, editor do Jornal Pessoal, de Belém do Pará, escreveu um belíssimo artigo denominado, “Aula Magna do Direito”, no Observatório da Imprensa. E realmente foi.

Omais previsto

Seguiu-se a defesa dos acusados. O cansaço era evidente nos cochilos de alguns ministros, tão noticiados. Os advogados se esforçavam em mudar o foco com seus trâmites jurídicos. Não existiu mensalão, foi só Caixa Dois (como se não fosse crime também). Ninguém sabia a origem do dinheiro que pegou. Roberto Jefferson não denunciou por causa dos 16 milhões que ficaram faltando no acordo. O dinheiro era de doações, foi destinado a pagar dívidas de campanha, os empréstimos foram legais e os contratos de publicidade foram cumpridos à risca. Ou seja, fizeram o papel deles.

Mas eis que surge a mais controversa figura do julgamento: o ministro revisor Ricardo Lewandovski. Eticamente, no lugar dele, não aceitaria essa missão. Sua ligação com muitos dos acusados, tira da opinião pública a imagem de isenção necessária para julgar o caso mais importante da justiça brasileira dos últimos anos. Mas ele assumiu. Em seu discurso, Lewandovski absolveu o ex-presidente da Câmara, deputado João Paulo Cunha. “Não resta dúvida, a meu ver, de que o repasse dos R$ 50 mil foi autorizado e providenciado pelo então secretário Nacional de Finanças do PT, Delúbio Soares, e pago com intermediação de Marcos Valério com a finalidade de custear pesquisas eleitorais realizadas em quatro municípios da região de Osasco, na Grande São Paulo”, afirmou. Pronto! Começou o mais previsto linchamento do ano.

A isenção no voto

No Facebook, Lewandovski viu sua imagem aliada à frase “Quando sair na rua, saiba que o povo brasileiro tem vergonha de você.” E a questão é simples. O “povo” não quer um julgamento. Quer uma condenação. Qualquer voto contra isso será considerado uma traição. Deixou de ser apenas uma questão de justiça e virou uma vingança contra os “mensaleiros”. E isso é perigoso. Os ministros terão de avaliar se o Ministério Público conseguiu ou não juntar provas suficientes para condenar os acusados. Deverão ficar isentos do clamor popular e se dedicar apenas a avaliar os autos. Mas com o clima de hostilidade destinado ao ministro revisor, alguém acredita nisso?

Enfim, quero ver todos os culpados na cadeia. Porém acredito que isso será mais difícil do que ver a isenção no voto de Lewandovski ou em matérias da Veja e Época.

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[Erick da Silva Cerqueira é publicitário e colunista da TipoRevista.com.br, Salvador, BA]