Thursday, 02 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Samba, suor, cerveja e complexos

Assisti ao vídeo da jornalista Raquel Sherazade criticando o carnaval. Ando meio cansado da mediocridade de alguns profissionais, que sempre, em período momesco, pretendem rediscutir a festa no âmbito cultural, como se eles estivesse acima do bem e do mal. Aproveitam-se da popularidade do evento para aparecer um pouquinho, na verdade.

Já assisti a palestras em faculdades, debates sobre os rumos do carnaval de Salvador, sociólogos, antropólogos e outros ‘ólogos’ discutindo a festa e os seus preconceitos sociais. Sinceramente, acho isso muito improdutivo e vago demais. É como discutir, numa conferência universitária em Salvador, o crescimento desenfreado da China e as consequências das milhares de toneladas de lixo que isso irá acarretar para o planeta. Vai dar em quê?

Deixem o carnaval ser apenas uma festa. Sem um viés sociopolítico preconceituoso e excludente. Uma festa do povo, sim. Afinal, os eruditos não curtem o Parangolé. Problema deles. E problema do povão, que curte o Tchubirabirou. Live and let die, my friends. Assim como é problema das elites-burguesas-opressoras também. Se o camarada quer ficar no camarote Vip Mega Plus Up e tem dinheiro para isso, deixa o cara viver a vida. Contanto que não jogue cerveja lá de cima nos outros, nem chame o cantor do trio de favelado, tudo certo.

Tudo tem seu tempo

Carnaval é festa do capitalismo, sim. O socialismo e o comunismo morreram, é preciso avisar isso para alguns. É o momento da descaração, das drogas lícitas (bebida, cigarro, pagode, arrocha) e do sexo com camisinha e sem compromisso. Ou seja, é uma forma de extravasar os sentimentos mais reprimidos pela sociedade durante o resto do ano. Hoje em dia, é o período onde a profissionalização baiana deve ser ressaltada. Somos brilhantes na organização da festa. Quem não tem dinheiro fica na pipoca, sai de perto das cordas e se protege nas calçadas. Dá pra curtir tranquilamente. Falo com a propriedade (igual a Sherazade) de quem nunca gastou um centavo comprando abadás. Quem tem muito dindim sai no Chicrete e quem tem pouco no Tiete. C’est la vie.

Discutir o carnaval como centro de um grande preconceito racial é outra grande perda de tempo. Os negros e os brancos se espremem na pipoca e nos blocos, juntos como as teclas do meu piano, diria Wonder. Se existem mais negros trabalhando nas cordas, catando latinhas e vendendo ‘três pirigueti a 5 conto’, a conclusão é óbvia. Mais de 80% da população baiana é negra. E isso é motivo de orgulho durante os outros períodos do ano. Afinal, somos a maior cidade negra do mundo fora da África. Na Oktoberfest tem um monte de ‘loirinhos’ trabalhando e ninguém reclama.

Bule-Bule é massa, Chico Buarque é fantástico, Mozart é meu ídolo. Mas tudo tem seu tempo. Citando o grande Haroldo Barbosa, ‘na avenida entre mil apertos, vocês vão ver gente cantando concertos‘?

Afinal, 2011 começa agora

Acho preconceituoso falar mal da música ‘Liga da Justiça’. Talvez meu lado nietzscheano me leve a perguntar: a música é ruim para quem? Não é porque eu não gosto (e odeio esses pagodes) que ela necessariamente mereça o ostracismo e o mármore do inferno. Se você não gosta, siga meu conselho, não ouça. Sintonize a Globo FM ou acesse a radiouol.com.br e escolha o seu estilo musical. A boa música é uma questão de gosto, cara Raquel. As pessoas não devem ser obrigadas a conhecer Verdi, Chopin, Bach ou Jackson do Pandeiro. Estamos numa democracia, lembra? Uma vez mostrei o vídeo de ‘O sole Mio’, com Os 3 Tenores, para minha irmã universitária e culta. Sabe o que ouvi? ‘É muita zoada…’

Acho que a apresentadora Raquel Sherazade fez um comentário infeliz e rancoroso. Atitude típica de uma pessoa mal cuidada na plenitude do seu leito de amor. No mais, é só mais um dos contos das ‘mil e uma noites’ dela. Não vamos dar mais audiência a isso. Afinal, 2011 começa agora. Feliz Ano Novo para todos.

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Analista de marketing, Salvador, BA