O ombudsman da Folha de S.Paulo, Carlos Eduardo Lins da Silva, pegou pesado, muito pesado, em um dos textos de sua coluna do último domingo (3/5). Não era o texto principal e foram apenas 231 palavras – reproduzidas abaixo –, mas o conteúdo é demolidor.
Carlos Eduardo comenta o caso da publicação de uma ficha falsa da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, contendo uma série de crimes que teriam sido cometidos por ela durante o regime militar. A suposta ficha – uma montagem que circula em sites direitistas na internet – foi publicada na primeira página do jornal sem checagem alguma se sua veracidade.
Na semana anterior, o ombudsman já havia comentado o episódio em uma nota também pequena, mas sem o teor da que saiu no domingo. Agora, parece ter compreendido a gravidade dos fatos e em poucas palavras coloca o dedo na ferida:
‘O `Manual´ [de Redação da Folha] prevê que o jornal identifique a fonte que lhe passe informação errada, o que não se fez neste caso (…) a Redação me disse que nenhum jornalista envolvido na produção e edição da reportagem original sabia da ficha falsa na internet, o que revela incrível desinformação de jornalistas especializados. O pior é a Redação dizer que encerrou a apuração desse episódio seriíssimo e não acha necessário rever procedimentos de checagem de informações’, escreveu Carlos Eduardo.
O tamanho da lambança
Até aqui, trata-se de uma reprimenda dura, mas não inédita. Outros ouvidores também tiveram a oportunidade de cobrar a Redação desta mesma maneira. Inédito mesmo é o que está escrito no último parágrafo do texto:
‘No caso Memogate, que citei domingo passado, a rede de TV CBS constituiu comissão independente para apurar o que houve. Seu relatório foi divulgado publicamente e dele resultaram ampla revisão de procedimentos internos da Redação, a demissão de uma produtora e um pedido de desculpas da emissora à audiência. Sugiro à Folha fazer algo similar.’
Este observador acompanha as colunas dos ouvidores da Folha desde 1989, quando Caio Túlio Costa estreou na função, e não se recorda de nenhum comentário tão incisivo quanto este de Carlos Eduardo Lins da Silva. Noves fora zero, o ombudsman recomendou que o jornal mande alguém ‘independente’ investigar o que aconteceu na apuração da matéria e puna, com demissão, se for o caso, os responsáveis pela lambança. Além disto, ele sugere que a Folha peça desculpas aos leitores, coisa que o jornal já se revelou incapaz de fazer ao publicar uma reportagem ‘explicando’ que ‘não é possível provar a autenticidade’ da ficha de Dilma. Dizer que se trata de ‘tucanês’, como gosta de escrever o colunista-humorista da casa, José Simão, é muito pouco: o que a Folha fez foi uma verdadeira operação jornalística para esconder a lambança praticada com a ministra.
Tudo somado, a atuação de Carlos Eduardo Lins da Silva reforça a idéia de que a instituição do ombudsman pode ajudar, sim, a melhorar o nível do jornalismo praticado no país. Pode até ser que a Redação da Folha ignore todas as recomendações de Carlos Eduardo, mas pelo menos não o fará sem que os leitores do próprio jornal tomem conhecimento do que o ouvidor pensa. E isto é um grande avanço.
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Até ver se a ficha cai
Carlos Eduardo Lins da Silva, Folha de S.Paulo, 3/5/2009
Recebi 77 mensagens de 55 leitores sobre a reportagem em que a Folha reconhece erros por publicar suposta ficha de Dilma Rousseff do tempo da ditadura. Nenhum se satisfez com as explicações. Nem eu.
Fiz perguntas à Redação para tentar esclarecer o caso. As respostas não o elucidam.
A reportagem original saiu na primeira página; a correção também deveria ter saído na capa do jornal.
O ‘Manual’ prevê que o jornal identifique a fonte que lhe passe informação errada, o que não se fez neste caso.
Alertado por leitor no dia da reportagem original de que ficha fraudulenta circulava na internet, o ombudsman pediu para a Redação apurar e ficou sem resposta até o dia 21.
Na sexta, a Redação me disse que nenhum jornalista envolvido na produção e edição da reportagem original sabia da ficha falsa na internet, o que revela incrível desinformação de jornalistas especializados.
O pior é a Redação dizer que encerrou a apuração desse episódio seriíssimo e não acha necessário rever procedimentos de checagem de informações.
No caso Memogate, que citei domingo passado, a rede de TV CBS constituiu comissão independente para apurar o que houve. Seu relatório foi divulgado publicamente e dele resultaram ampla revisão de procedimentos internos da Redação, a demissão de uma produtora e um pedido de desculpas da emissora à audiência. Sugiro à Folha fazer algo similar.