Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

Os dilemas da imprensa sobre o Programa Mais Médicos

Em artigo publicado no último número da Revista Brasileira de Pesquisa em Saúde, a partir de manchetes sobre o Programa Mais Médicos no jornal Folha de S.Paulo, quando da implantação da iniciativa, em 2013, ficou demonstrado como a imprensa se posicionou negativamente em relação a este tema que volta a ocupar as manchetes. O texto, com o título “O jornal Folha de S.Paulo no contexto das indústrias culturais e midiáticas: um olhar para as manchetes sobre o Programa Mais Médicos” foi mais um fruto da parceria entre o Observatório da Mídia: direitos humanos, políticas, sistemas e transparência e o Observatório de Saúde na Mídia, em uma parceria da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), e tem autoria de Tatiana Emerich, Aline Cavaca, Adauto Emmerich e Edgard Rebouças.

Em 2013, Alexandre Padilha (Ministro da Saúde na época), participa da aula inaugural do módulo de acolhimento e avaliação dos profissionais cubanos para a segunda etapa do Programa Mais Médicos. Durante três semanas, os médicos tiveram aulas sobre saúde pública brasileira e Língua Portuguesa. A aprovação nesta etapa foi condição para receberem o registro profissional provisório para atuação no programa. (Foto: Marcello Casal Jr. / Agência Brasil)

Com uma análise da cobertura ao longo do segundo semestre de 2013, observou-se que das 197 notícias que manchetaram o Programa Mais Médicos, 46,3% delas tinham um caráter negativo ou pessimista, seguido de 44,5% com tom neutro e 9,1% com caráter positivo.

Nas conclusões, o artigo mostra que a Folha de S.Paulo adotou um viés predominante político e negativista, atendendo a interesses corporativistas das entidades de Medicina associado ao fato de a indústria de “saúde” se constituir como grande anunciante da mídia brasileira. Destacando em seu último parágrafo que:

“Entender o jornal Folha de S.Paulo (e o Grupo Folha) como um ator inserido nas lógicas das indústrias culturais e midiáticas auxilia no entendimento dos interesses a serem ‘respeitados’ para emplacar a veiculação de uma manchete e a forma como se apresentam nos jornais. E que, como destacado anteriormente, a ilusão de que imprensa é um representante legítimo do interesse público — até expressado na campanha publicitária deste próprio jornal nos anos 1980: ‘Folha: de rabo preso com o leitor’ — está longe de ser efetivado. Quem paga a conta sempre pede a música, e no caso da imprensa a conta é paga pelos anunciantes, não pela sociedade beneficiada com o Programa Mais Médicos”.

No atual momento, diante das indefinições da imprensa sobre se apoia ou critica as decisões do governo cubano e do futuro governo Bolsonaro em relação ao Programa Mais Médicos, vale a pena focar atenção mais uma vez nos posicionamentos dos grupos de mídia. Os interesses em jogo continuam os mesmos: ficar ao lado do “governo”, das corporações da indústria da “saúde” ou do povo brasileiro?

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Prof. Dr. Edgard Rebouças é coordenador do Programa de Pós-graduação em Comunicação e Territorialidades (PósCom) na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).

Observatório da Mídia: direitos humanos, políticas, sistemas e transparência