Thursday, 28 de March de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1281

O que faltou na galinhada

AGRESSÃO À PREFEITA

Luiz Antonio Magalhães

O episódio do acadêmico de Direito da Universidade de São Paulo que jogou uma galinha preta na prefeita paulistana Marta Suplicy recebeu grande atenção da imprensa brasileira. Era de se esperar: além do inusitado protesto, o ministro da Justiça colaborou ao comentar o fato com um dos maiores despautérios já ditos publicamente na cena política brasileira ? a já célebre comparação do ato de jogar a galinha na prefeita ao de se jogar um veado, se fosse do sexo masculino o alvo da manifestação.

É compreensível que a besteira do ministro tenha recebido amplo espaço nos jornais e revistas. Como bem observou a Veja, o anedotário político está em alta depois da declaração de Márcio Thomaz Bastos.

Não é compreensível, por outro lado, a superficialidade da cobertura do caso, em especial no que diz respeito ao protagonista da agressão à prefeita. Diversos veículos entrevistaram o estudante e até seus familiares, mas nenhum foi ao âmago da questão: um rapaz que estuda na mais prestigiosa Faculdade de Direito do Brasil foi capaz de cometer um crime, na frente do ministro da Justiça e da prefeita de São Paulo, e sair impune. Sim, porque não se tratou de um protesto pacífico e tolerável no regime democrático, mas uma agressão à prefeita.

Os próprios colegas do estudante Ernest Hellmuth correram para repudiar a manifestação: o diretório acadêmico classificou a atitude de desrespeitosa. Jornal algum se lembrou de perguntar à direção das Arcadas se caberia alguma penalidade ao acadêmico.

O Largo de São Francisco é celeiro não de advogados de porta de xadrez, mas de juízes, promotores e juristas. Que um vândalo tenha conseguido passar no concorrido vestibular da faculdade e esteja regularmente matriculado, tudo bem ? há vândalos inteligentes e estudiosos ?; mas causa espécie que a instituição, após os fatos da semana passada, permita que ele continue assistindo às aulas sem admoestação alguma.

A falta de curiosidade da imprensa sobre este ângulo do episódio, por outro lado, enseja duas explicações: preguiça mental dos pauteiros, que se entregaram de corpo e alma no trabalho de "repercutir" a trapalhada do ministro; ou extrema má vontade com a prefeita Marta Suplicy, vítima do vandalismo. Pode inclusive ter sido a soma dos dois fatores, mas o segundo parece preponderante. Afinal, ao não investigar o que na realidade foi um crime, os jornais trataram o criminoso como um mero brincalhão. Com isso, Marta passa de vítima a algoz ao reclamar da atitude antidemocrática e desrespeitosa do seu agressor.