Wednesday, 01 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Projeto ‘Avança Brasil’ ameaça a floresta amazônica

Jean-Jacques Sévilla
"Projeto ‘Avança Brasil’ ameaça a floresta amazônica", copyright Le Monde / UOL, 31/01/01
"Será o desenvolvimento econômico do Brasil – pelo menos, tal como vem sendo concebido nos ministérios de Brasília – compatível com a preservação da selva amazônica? Segundo um artigo publicado na mais recente edição da revista científica ‘Science’, de 19 de janeiro, a mais extensa floresta tropical do planeta (7,3 milhões de quilômetros quadrados, uma área que corresponde a 40% das florestas tropicais ainda existentes) tem tudo a temer do projeto ‘Avança Brasil’, lançado em 2000, que prevê o investimento de US$ 40 bilhões (cerca de R$ 80 bilhões) em obras de infraestrutura, até 2007, no norte do país.
Num artigo intitulado ‘The Future of the Brazilian Amazon’, William Laurance, do Smithsonian Tropical Research Institute de Panamá, Mark Cochrane, da Universidade do Estado do Michigan, assim como diversos pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisa Amazônica de Manaus e da Universidade do Oregon, estão alertando o mundo para os efeitos, num período de vinte anos, de um projeto que deve bater de frente de maneira dramática com os diversos programas de proteção da floresta tropical brasileira que vêm sem desenvolvidos até agora.
Entre esses programas ameaçados, o mais importante é o Programa-piloto de conservação da floresta tropical brasileira, financiado por um conjunto de investimentos no valor de US$ 340 milhões (R$ 680 milhões) pelos países do G7 e da União Européia.
Segundo as previsões dos cientistas, se as obras previstas forem efetivamente realizadas, o ritmo do desmatamento irá conduzir, na mais otimista das hipóteses, à destruição de 28% da floresta amazônica brasileira. Ao passo que, segundo a hipótese mais pessimista, essa taxa subiria para 42%, ou seja, 58% do território nacional. No pior dos casos, a parte da mata primária será reduzida para menos de 5%, no lugar dos 80% atuais.
Os principais ‘eixos de desenvolvimento’ do programa ‘Avança Brasil’ dizem respeito, essencialmente, ao asfaltamento de pistas abertas em meio da selva há mais de vinte anos, tais como as que ligam Porto Velho (RO) a Manaus (AM) e Cuiabá (MT) a Santarém (PA), pelo menos na teoria, já que elas só podem ser utilizadas nas épocas em que não chove.
No total, são cerca de 6.000 quilômetros de estradas, que as obras pretendem tornar acessíveis para todos os veículos o ano inteiro, que deverão servir de suporte para a retomada da colonização na região. A construção de barragens hidroelétricas, a implantação de vias fluviais e a instalação de gasodutos completam esse plano diretor, que foi elaborado contando com uma participação decisiva, mas por enquanto muito precária, dos capitais privados.
Nesse sentido, o artigo da revista ‘Science’ sublinha, na sua introdução, que a população não-indígena estabelecida na Amazônia brasileira decuplicou em quarenta anos, passando de 2 para 20 milhões de habitantes. Foi sobretudo na borda meridional da floresta, a mais acessível aos migrantes, geralmente oriundos do Nordeste, uma região ciclicamente afligida pela seca, que os arroteamentos progridem mais rapidamente.
Segundo as estatísticas divulgadas pelo Instituto Nacional de Pesquisa Espacial de São José dos Campos (SP), responsável pela decodificação das fotos feitas por satélite, a superfície desmatada anualmente é da ordem de 17.000 quilômetros quadrados em média, há cerca de quinze anos.
Em menos de meio-século, a Amazônia brasileira já perdeu cerca de 551.000 quilômetros quadrados (o que equivale a pouco mais que a superfície da França) de sua floresta, que se foi em fumaça para deixar lugar para grandes fazendas de criação de gado extensivas, muito pouco lucrativas mas que servem de fachada para uma especulação imobiliária descontrolada.
‘Dependendo do grau de otimismo das projeções divulgadas até agora, a taxa projetada de desflorestamento varia entre 269.000 e 506.000 hectares por ano, enquanto a transformação de zonas de florestas levemente degradadas em solos moderadamente ou muito degradados está avaliada entre 1,53 e 2,37 milhões de hectares por ano’, acrescenta o artigo da revista ‘Science’ a respeito do impacto a ser causado pelo projeto ‘Avança Brasil’.
O ministério da ciência e da tecnologia reagiu assim que essa notícia foi publicada por meio de um comunicado à imprensa no qual qualifica o artigo em questão como ‘um exercício de futurologia ecológica inconsistente’. O que não impede um outro estudo, divulgado em março de 2000 e realizado pelo Instituto de pesquisa sobre o meio-ambiente amazônico de Belém, em conjunto com o Instituto Sócio-Ambiental (ISA), de São Paulo, e o Woods Hole Research Center, do Massachusetts, de chegar a conclusões tão preocupantes quanto aquelas.
Considerando apenas o desmatamento que resultaria da construção das quatro principais estradas inscritas no plano de investimentos e usando como parâmetro a estrada Transamazônica (não-asfaltada em mais de 2 mil quilômetros), 180.000 quilômetros quadrados de florestas seriam erradicados num período de vinte a trinta anos.
Inaugurada em 1982, a BR-364, que corta o Estado de Rondônia, na Amazônia ocidental, constitui até hoje o exemplo mais contundente da incompatibilidade patente entre asfalto e floresta no Brasil. Em seis anos, em conseqüência da intensa migração que ela favoreceu, 15% da cobertura vegetal (36.000 quilômetros quadrados) desapareceram sob os efeitos de gigantescas queimadas.
Após ter constatado os estragos que a estrada havia causado, a direção do Banco Mundial, que havia financiado sua construção com um investimento de US$ 320 milhões (R$ 640 milhões), lamentou o equívoco, oferecendo um pedido de desculpas sem precedente.
Além disso, enquanto a pobreza dos solos da Amazônia (com exceção das zonas inundáveis fertilizadas pelo limo dos rios) foi fartamente demonstrada por todos os institutos de pesquisas agrícolas nacionais e estrangeiros, a floresta vem enfrentando nos últimos tempos um perigo adicional: a expansão fulgurante da soja, da qual o Brasil é o segundo produtor e exportador mundial. Sem se preocupar com as opiniões dos especialistas, são muitos os grandes latifundiários que resolveram adotar em grande escala esse tipo de cultura, totalmente ‘exótica’ para os padrões agrícolas da região. (Tradução: Jean-Yves de Neufville)"

Global Press

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SCIENCE VS. AVANÇA BRASIL

"Projeto ?Avança Brasil? ameaça a floresta amazônica", copyright Le Monde / UOL, 31/01/01

"Será o desenvolvimento econômico do Brasil – pelo menos, tal como vem sendo concebido nos ministérios de Brasília – compatível com a preservação da selva amazônica? Segundo um artigo publicado na mais recente edição da revista científica ?Science?, de 19 de janeiro, a mais extensa floresta tropical do planeta (7,3 milhões de quilômetros quadrados, uma área que corresponde a 40% das florestas tropicais ainda existentes) tem tudo a temer do projeto ?Avança Brasil?, lançado em 2000, que prevê o investimento de US$ 40 bilhões (cerca de R$ 80 bilhões) em obras de infraestrutura, até 2007, no norte do país.

Num artigo intitulado ?The Future of the Brazilian Amazon?, William Laurance, do Smithsonian Tropical Research Institute de Panamá, Mark Cochrane, da Universidade do Estado do Michigan, assim como diversos pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisa Amazônica de Manaus e da Universidade do Oregon, estão alertando o mundo para os efeitos, num período de vinte anos, de um projeto que deve bater de frente de maneira dramática com os diversos programas de proteção da floresta tropical brasileira que vêm sem desenvolvidos até agora.

Entre esses programas ameaçados, o mais importante é o Programa-piloto de conservação da floresta tropical brasileira, financiado por um conjunto de investimentos no valor de US$ 340 milhões (R$ 680 milhões) pelos países do G7 e da União Européia.

Segundo as previsões dos cientistas, se as obras previstas forem efetivamente realizadas, o ritmo do desmatamento irá conduzir, na mais otimista das hipóteses, à destruição de 28% da floresta amazônica brasileira. Ao passo que, segundo a hipótese mais pessimista, essa taxa subiria para 42%, ou seja, 58% do território nacional. No pior dos casos, a parte da mata primária será reduzida para menos de 5%, no lugar dos 80% atuais.

Os principais ?eixos de desenvolvimento? do programa ?Avança Brasil? dizem respeito, essencialmente, ao asfaltamento de pistas abertas em meio da selva há mais de vinte anos, tais como as que ligam Porto Velho (RO) a Manaus (AM) e Cuiabá (MT) a Santarém (PA), pelo menos na teoria, já que elas só podem ser utilizadas nas épocas em que não chove.

No total, são cerca de 6.000 quilômetros de estradas, que as obras pretendem tornar acessíveis para todos os veículos o ano inteiro, que deverão servir de suporte para a retomada da colonização na região. A construção de barragens hidroelétricas, a implantação de vias fluviais e a instalação de gasodutos completam esse plano diretor, que foi elaborado contando com uma participação decisiva, mas por enquanto muito precária, dos capitais privados.

Nesse sentido, o artigo da revista ?Science? sublinha, na sua introdução, que a população não-indígena estabelecida na Amazônia brasileira decuplicou em quarenta anos, passando de 2 para 20 milhões de habitantes. Foi sobretudo na borda meridional da floresta, a mais acessível aos migrantes, geralmente oriundos do Nordeste, uma região ciclicamente afligida pela seca, que os arroteamentos progridem mais rapidamente.

Segundo as estatísticas divulgadas pelo Instituto Nacional de Pesquisa Espacial de São José dos Campos (SP), responsável pela decodificação das fotos feitas por satélite, a superfície desmatada anualmente é da ordem de 17.000 quilômetros quadrados em média, há cerca de quinze anos.

Em menos de meio-século, a Amazônia brasileira já perdeu cerca de 551.000 quilômetros quadrados (o que equivale a pouco mais que a superfície da França) de sua floresta, que se foi em fumaça para deixar lugar para grandes fazendas de criação de gado extensivas, muito pouco lucrativas mas que servem de fachada para uma especulação imobiliária descontrolada.

?Dependendo do grau de otimismo das projeções divulgadas até agora, a taxa projetada de desflorestamento varia entre 269.000 e 506.000 hectares por ano, enquanto a transformação de zonas de florestas levemente degradadas em solos moderadamente ou muito degradados está avaliada entre 1,53 e 2,37 milhões de hectares por ano?, acrescenta o artigo da revista ?Science? a respeito do impacto a ser causado pelo projeto ?Avança Brasil?.

O ministério da ciência e da tecnologia reagiu assim que essa notícia foi publicada por meio de um comunicado à imprensa no qual qualifica o artigo em questão como ?um exercício de futurologia ecológica inconsistente?. O que não impede um outro estudo, divulgado em março de 2000 e realizado pelo Instituto de pesquisa sobre o meio-ambiente amazônico de Belém, em conjunto com o Instituto Sócio-Ambiental (ISA), de São Paulo, e o Woods Hole Research Center, do Massachusetts, de chegar a conclusões tão preocupantes quanto aquelas.

Considerando apenas o desmatamento que resultaria da construção das quatro principais estradas inscritas no plano de investimentos e usando como parâmetro a estrada Transamazônica (não-asfaltada em mais de 2 mil quilômetros), 180.000 quilômetros quadrados de florestas seriam erradicados num período de vinte a trinta anos.

Inaugurada em 1982, a BR-364, que corta o Estado de Rondônia, na Amazônia ocidental, constitui até hoje o exemplo mais contundente da incompatibilidade patente entre asfalto e floresta no Brasil. Em seis anos, em conseqüência da intensa migração que ela favoreceu, 15% da cobertura vegetal (36.000 quilômetros quadrados) desapareceram sob os efeitos de gigantescas queimadas.

Após ter constatado os estragos que a estrada havia causado, a direção do Banco Mundial, que havia financiado sua construção com um investimento de US$ 320 milhões (R$ 640 milhões), lamentou o equívoco, oferecendo um pedido de desculpas sem precedente.

Além disso, enquanto a pobreza dos solos da Amazônia (com exceção das zonas inundáveis fertilizadas pelo limo dos rios) foi fartamente demonstrada por todos os institutos de pesquisas agrícolas nacionais e estrangeiros, a floresta vem enfrentando nos últimos tempos um perigo adicional: a expansão fulgurante da soja, da qual o Brasil é o segundo produtor e exportador mundial. Sem se preocupar com as opiniões dos especialistas, são muitos os grandes latifundiários que resolveram adotar em grande escala esse tipo de cultura, totalmente ?exótica? para os padrões agrícolas da região. (Tradução: Jean-Yves de Neufville)"

"Brasil diz que nao vai deixar a Amazônia virar ‘santuário’", copyright Global Press (www.globalpress.com.br), 23/01/01

"O New York Times publicou que O governo do Brasil rejeitou um estudo alertando sobre a destruição de pelo menos um quarto da Amazônia, por causa do desenvolvimento, e afirmou que a maior floresta tropical do mundo não pode se transformar num ‘santuário intocável’.

?O ministério da Ciência e Tecnologia informou que um relatório sobre a destruição da Amazônia, publicado na sexta-feira pela revista Science, se baseou em ‘futurologia ecológica’, usando projeções sem fundamentos sobre desflorestamento que são constestadas pelo governo brasileiro?, diz o artigo da Reuters.

?’Existe um claro entendimento no governo de que não podemos tratar a Amazônia como um ‘santuário intocável’. Há vinte milhões de brasileiros que vivem ali’, afirmou um porta-voz do ministério, defendendo o desenvolvimento da região.

O desenvolvimento da Amazônia sempre foi uma questão controvertida no Brasil, dividido entre o desejo de desenvolver a pobre região norte do país e a pressão dos ambientalistas para manter a floresta intacta.

O artigo da Science diz que um plano de desenvolvimento do governo brasileiro, envolvendo US$40 bilhões em investimentos nos próximos sete anos, pode resultar na destruição de um quarto da floresta até o ano 2020.

O artigo foi escrito por William Laurance, do Smithsonian Tropical Research Institute, pelo pesquisador da Michigan State University Mark Cochrane e equipes da Oregon State University e do Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos da Floresta, do Brasil.

Laurance afirmou que ficou surpreso com o comunicado do ministério, ‘já que ‘membros da nossa equipe fazem parte de um projeto de pesquisa conjunto do Instituto Nacional de Pesquisa Amazônica do Brasil e da Smithsonian Institution, dos EUA’.

‘Não vejo como qualquer pessoa razoável possa constestar nossas conclusões’, disse o professor, ressaltando que ‘os comentários partiram de um único ministério brasileiro, não do governo como um todo’. O ministério afirmou que o trabalho de Laurance ‘não reflete o consenso técnico daquelas instituições’.

Também a embaixada do Brasil em Washington divulgou uma nota, criticando o artigo do professor Laurance, em que destaca que algumas informações contidas no estudo ‘são objeto de considerável controvérsia na comunidade científica’.

‘A projeção feita pelo Professor Laurance não parece ter uma base sólida já que leva em consideração a experiência dos últimos 25 anos, quando ainda não se tinha adotado nenhuma das várias políticas em curso para deter o desflorestamento’, diz a nota da embaixada?."

"Brasil promete estudar impacto ambiental de seu plano de US$40 bi para a Amazônia", copyright Global Press (www.globalpress.com.br), 25/01/01

"O governo brasileiro resolveu atender aos apelos dos ambientalistas e anunciou nesta quarta-feira que irá estudar o impacto sobre a Amazônia de um plano de desenvolvimento econômico da região, publicou o New York Times. ?Cientistas advertiram que até 42 por cento da floresta amazônica podem desaparecer por causa desse projeto?, diz o artigo da Reuters.

?João Paulo Silveira, funcionário do ministério do Desenvolvimento encarregado do plano de US$ 40 bilhões, informou que o governo brasileiro vai estudar o provável impacto ambiental de todos os projetos planejados. Esse estudo que se estenderá por doze meses deve custar US$ 400 mil. Ele prometeu que se houver risco de danos ambientais, os projetos serão alterados?."

"Sentença de morte para a Amazônia", copyright Global Press (www.globalpress.com.br), 19/01/01

"Cientistas disseram que um projeto de US$40 bilhões vai destruir 95 por cento da Floresta Amazônica até 2020, destacou o editor de Ciência do jornal The Independent, Steve Connor. ?A mais detalhada investigação sobre o futuro da maior floresta tropical do mundo estima que apenas cinco por cento da Amazônia poderão estar preservados em seu estado virgem no ano 2020.

O cenário pessimista é pintado por uma equipe de cientistas brasileiros e americanos que analisaram como o delicado ecossistema da Amazônia vai reagir a um novo projeto de desenvolvimento de rodovias de US$40 bilhões.

Os cientistas acreditam que dentro de vinte anos, a floresta vai estar extremamente reduzida em relação a seu tamanho atual como resultado direto do ambicioso projeto chamado ‘Avança Brasil’, que inclui a construção de rodovias, ferrovias e hidrelétricas.

Eles acusam o governo brasileiro de não consultar agências ambientalistas, incluindo seu próprio ministério do Meio Ambiente, para acelerar o desmatamento e a derrubada de árvores.

O estudo, liderado por William Laurance, do Smithsonian Tropical Research Institute do Panamá, publicado hoje pelo jornal Science, mostra dois cenários possíveis: um futuro ‘otimista’ e outro ‘não-otimista’. Os dois sugerem que a Amazônia vai ser drasticamente mudada pelos atuais projetos de desenvolvimento. Pelo cenário menos otimista, mais de 95 por cento vão perder seu status de mata virgem e 42 por cento da floresta estarão totalmente destruídos ou seriamente degradados no ano 2020?."

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