Wednesday, 09 de October de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1308

Quem pariu a bolha das teles que a embale

DESINFORMAÇÃO & MAMATAS

Alberto Dines

Está nas primeiras páginas, colunistas excitadíssimos(as), a oposição como barata tonta quer pegar alguém só não sabe quem, ânimos exaltados no seio do governo.

E, como sempre, a mídia não consegue contar tudo o que é preciso ser contado sobre a crise das empresas de telefonia & telecomunicações.

Não consegue porque não quer.

E não quer porque teria que falar dela mesma e do papel que desempenhou na criação da bolha das teles (que inclui a badalada internet) e as demais "diversificações" desvairadas a que se entregou, esquecida do seu negócio principal.

Não nos interessa aqui a questão em si ? se o governo deve intervir para evitar uma quebradeira sistêmica, se deve haver um "Tele-Proer", se o Banco Central tem razão em chamar a atenção para um assunto que a imprensa ignorou ou se a Anatel, como toda facção corporativa, está certa em garantir que está tudo sob controle.

Interessa ao usuário do sistema de comunicação ? portanto ao cidadão ? saber por que um setor privatizado, legitimado e institucionalizado há um par de anos, ainda claudica, longe de atender seus compromissos contratuais mais elementares.

Interessa responder a estas questões:

** Quem enganou a opinião pública não a alertando na hora apropriada sobre a real situação das empresas?

** Quem deixou-se embalar pela guerra de preços nas tarifas internacionais imaginando que as leis do mercado conseguiriam oferecer um serviço moderno, acessível e competente sem comprometer os fundamentos financeiros das empresas?

** Quem fechou os olhos e permitiu que os serviços de telefonia continuem fixados nos grandes centros metropolitanos, esquecidos do dever básico de estender o atendimento e o faturamento nos espaços intermediários?

1? resposta: a mídia.

2? resposta: a mídia inteira.

3? resposta: a mídia inteira, sem exceções.

Assim como a mídia cobre os negócios da mídia de uma forma particularizada, sem obedecer a critérios mínimos de isenção e de responsabilidade, assim também a mídia brasileira estendeu ao setor das telecomunicações o beneplácito, proteção e cumplicidade. Virou área reservada; a orientação das coberturas passou a funcionar fora das redações, nos andares "de cima", livres dos controles de qualidade.

Gurus, consultores e colunistas ligados ao "mercado" garantiam que na era da TI (tecnologias de informação) o negócio é juntar tudo no mesmo pacote. Confundiram os serviços de transmissão de dados com a indústria cultural destinada a processar informações. Esqueceram do princípio elementar da economia política que separa a infra-estrutura da super-estrutura e, com isso, contaminaram e comprometeram os dois.

Os potentados brasileiros de mídia queriam apossar-se do canal físico (onde corre o fluxo informativo) de modo a aumentar o poder de influência do que veiculam. E magnificar o seu cacife político. Meteram-se em aventuras telemáticas e informáticas, seduzidos pelo "mundo novo" que os editores especializados em descobrir "febres", "manias" e "tendências" lhes apresentavam como infalíveis.

Os resultados aí estão:

** O Grupo Estado de S.Paulo está encalacrado pelo litígio entre os financiadores da BCP, da qual é sócio, e ? o pior ? sem poder oferecer aos leitores uma cobertura razoável do que acontece na operadora de telefonia móvel e reflete a crise do setor.

** O Grupo Folha está encalacrado com o portentoso prejuízo do UOL no último exercício, prejuízo este garantido pelo patrimônio da empresa-mãe, o jornal Folha de S.Paulo. Por isso jogou areia nos olhos da opinião pública criando a onda em torno do aumento da participação do BNDES na Globopar. Como tática de despistamento é ótimo mas, na hora de pagar o preju, alguém ou alguma coisa terá que dançar.

** O Grupo Abril, depois de redesenhos, reengenharias, contratações fabulosas, parcerias e uma fábula de dinheiro em mirabolâncias televisivas, voltou ao que era ? apenas a maior editora de revistas do país. Quase duas décadas perdidas foi o preço da tentação pela bolha.

** O Grupo Globo mantém a hegemonia, ok, mas à hegemonia no faturamento e do poder de influência somou-se outra ? virou uma espécie de Geni, rainha da pancada. Leva cascudos até da Band. A perda no faturamento foi grande mas o desgaste na aura de invencibilidade é mais grave. Midas está de licença: o desastre da Globocom é indelével.

A mídia inventou a bolha das teles
para tirar vantagens particulares. Para ela. Queria crescer a reboque
das miragens que o mercado financeiro inventa para tomar a grana
dos fundos de pensão.
Com isso
descurou de acompanhar o comportamentos das empresas de telefonia
e de telecomunicações.

No Rio, a Telemar não consegue levar o telefone fixo além dos precários limites da antiga e decadente Telerj, e patina na mesma inoperância, burocracia e corrupção dos tempos da estatal. Isto não está nos jornais por que a Telemar é uma grande anunciante.

O mesmo se dá com a Telefônica ou Telefónica (a empresa que não resolveu o seu problema de acento ou assento). Seu serviço de acesso à internet por banda larga não consegue sair além da região metropolitana de São Paulo e sequer chega ao eixo econômico mais próspero do país, o Vale do Paraíba. Isto também não está nos jornais porque a Telefónica é uma anunciante ainda maior.

Uma prestadora de serviços ganha com a prestação de serviços, óbvio. Isso significa qualidade mas também significa ampliar a escala da operação. As nossas teles estavam ganhando dinheiro em jogadas financeiras e especulativas esquecidas que este é um dinheiro volátil e caro. No âmbito das bolsas e do noticiário financeiro é mais fácil mexer ? a mídia está aí para isso, para ajudar no despistamento. Mais complicado é apostar no crescimento, na expansão e no bom atendimento.

Acabou-se o que era doce. De uma forma ou de outra estamos diante da necessidade de re-estatizar o setor, diretamente ou indiretamente. O fracasso não foi da privatização em si, mas daqueles que movidos por interesses menores esqueceram da sua responsabilidade de fiscalizar.

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