Monday, 29 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Rodrigo Dionisio

MION NA BAND

"Mion leva o estilo MTV para a Band", copyright Folha de S. Paulo, 3/02/02

"Marcos Mion, 22, entra no Museu de Arte Moderna de São Paulo como um visitante comum. Com uma câmera escondida, registra o momento em que tira da mochila um ?quadro? e coloca entre outras obras em exposição.

Feita pelo próprio apresentador, a ?obra? mostra uma casa, um sol com um rosto sorridente e algumas manchas de tinta vermelha. A câmera oculta ainda grava comentários elogiosos e análises de visitantes a respeito do ?trabalho?.

A sequência fará parte de ?Guerrilhas Urbanas?, quadro do programa de auditório que Mion apresentará ao vivo na Bandeirantes a partir do próximo dia 18, de segunda a sexta, às 20h30.

A intenção da brincadeira? Mostrar ao telespectador que ele também pode se expressar por meio da arte. É prestação de serviço, segundo o apresentador.

E é esse clima, misto de deboche e ?papo-cabeça?, que Mion e Rogério Gallo, diretor da Bandeirantes, pretendem impor à atração, que substitui o programa ?Superpositivo?.

?Queremos um apresentador dono do programa, uma televisão feita por apresentadores carismáticos. Ele é ativo e envolvido, procurei-o por isso?, diz Gallo.

Realmente, vários ingredientes que atraíram o público na antiga atração comandada por Mion, o ?Piores Clipes do Mundo?, da MTV, estarão na Band. O apresentador fará quadros como o ?Micon?, no qual imita personalidades, e satirizará gravações. Mas, agora, em vez de videoclipes, o alvo estará nos arquivos da emissora.

?Tem um programa do Chacrinha em que ele fez um sorteio. Os prêmios eram: um monomotor, uma lancha, um Chevete ou um jegue chamado Roberto Carlos. É genial?, afirma Mion.

Haverá também um quadro em que vídeos caseiros serão comentados pelo apresentador -?de videoclipes a registros de churrascos familiares?. Lembra ainda programas da MTV, como ?Em Busca da Fama? ou ?VJ por um Dia?, o bloco ?Nasce uma Estrela?.

Os interessados enviam vídeos à Band se apresentando. Os selecionados serão entrevistados por Mion e farão uma sessão de fotos dirigida pelo apresentador.

Outro ponto de identificação com a antiga atração é a presença do ?assistente de palco? Cidão, revelado no ?Piores Clipes?. ?A molecada que gostava do ?Piores? vai pirar com o novo programa?, afirma o apresentador.

As semelhanças, segundo Mion, têm explicação simples: ele continua o mesmo. ?Meus amigos de colégio vêem mais semelhanças ainda. São as mesmas brincadeiras da quinta série. Mas, agora, ganho dinheiro em vez de suspensão.?

Esses quadros não devem ser fixos e, segundo Mion, haverá espaço para improvisações frequentes: ?Vamos estar com tudo preparado para, se eu sentir fome, poder preparar na hora uma receita. Vou cozinhar, provavelmente não vai dar certo, mas tudo bem. No final o Cidão come?, diz Mion.

?O programa tem de mudar sempre, ser reinventado. Não pode aquela história de ter um tema diário. Nem atração musical vai existir sempre. Não dá para apresentar um musical de qualidade todo dia? Então não tem?, completa Gallo.

O nome do programa já foi escolhido, mas a Band não o divulga pois, até o encerramento desta edição, ele ainda não havia sido registrado.

Mesquita No mesmo dia 18, deve estrear o programa de Otávio Mesquita na emissora. ?Vamos investir no lado repórter do Otávio?, afirma Gallo. Originalmente, a atração seria um ?game show?, mas, prevendo uma possível saturação do formato, a direção desistiu."

 

ARTE EM DEBATE

"Arte: Equívoco Alarmante", copyright O Globo , 29/12/01

"Sobretudo nas chamadas ?artes plásticas?, nos últimos anos tornou-se evidente um fosso entre o público e as obras apresentadas como artísticas. A rigor, a crise é ainda mais grave, pois muitos artistas que se consideram igualmente modernos, e o são, não reconhecem nas obras de muitos de seus contemporâneos, qualquer validade estética. A isto se soma o fato de que não apenas entre os artistas que ocupam espaço na mesma contemporaneidade existe essa negação, mas também muitos intelectuais, igualmente importantes dentro da chamada modernidade não reconhecem em muitas das obras hoje apresentadas em galerias e museus o caráter de inovação ou de criatividade artística. Portanto, estamos diante de um fenômeno insólito e pertubador dentro das relações sócio-artísticas.

Não se trata, como no final do século 19 e princípio do século 20, de que alguns artistas estejam trazendo uma linguagem nova, difícil de ser assimilada prontamente, decorrendo daí a sua dificuldade de compreensão. A sensação que se tem hoje é que muitos autores desses produtos não apenas estão repetindo essencialmente as experiências que vão do impressionismo ao dadaismo, mas sobretudo são despreparados técnica e intelectualmente para a tarefa a que se propõem.

A partir sobretudo do Romantismo os artistas adotaram, de uma maneira radical crescente, o modelo de ruptura dos cânones vigentes como uma forma de emulação de suas obras. Ao final desse ciclo, o Dadaismo, em 1916, surge então, como o marco onde a arte encontrou-se e fundiu-se com a anti-arte e a não-arte. As rupturas sucessivas criaram o círculo vicioso, e sem saída, das rupturas dentro das próprias rupturas configurando, a exemplo da pintura, a sindrome do ? branco sobre o branco? -como nos célebres quadros pintados por Malevitch . Todas as demais artes, a rigor, conheceram síndrome idêntica: chegou-se à folha em branco, ao concerto silencioso, à escultura que derrete, ao teatro sem atores, etc .

O que aqui se propõe é uma indagação, uma reflexão.

O século 20 já acabou. Ele foi, para o mundo ocidental, o campo de provas de três teorias formuladas pelo século 19:- o marxismo, a psicanálise, a arte moderna.

Enquanto o marxismo e a psicanálise já entraram em fase de revisão, a ?arte moderna?preserva seus equívocos. Como o marxismo e a psicanálise, a arte moderna teve um nascimento tortuoso e árduo, mas finalmente impôs-se, ocupou os museus, salas de concerto, antologias e tornou-se norma estética vigente.

Não seria hora de passarmos a limpo a sua trajetória, tendo em vista que um novo século se inaugura possibilitando um natural renascimento e uma reanálise de nossas manifestações simbólicas?

Em relação à arte moderna e à necessidade de sua revisão há um problema que precisa ser desentranhado e posto no divã s&ooacute;cio-estético. Refiro-me a um ?trauma?, a uma ? má consciência? que ficou na memória do Ocidente pelo fato que vários artistas foram recusados em salões oficiais no final do século passado e acabaram posteriormente se revelando como alguns dos maiores criadores de seu tempo. Desde então, a possibilidade de que nossos conceitos de arte estejam equivocados e que sejamos tidos no futuro como incompetentes e ignorantes para perceber a ? vanguarda? e o ? novo? fez com que se abrissem, ou melhor, se escancarassem as portas do julgamento estético. Deste modo, passou-se a aceitar como arte tudo aquilo que o artista( ou alguém por ele) apresenta como obra de arte. Passou a valer a assinatura e a intenção. Daí, um silogismo perverso: se tudo é arte, então, nada é arte.

Ocorreu, por outro lado, um outro fenômeno acoplado ao trauma daquela rejeição histórica. Os artistas, que por suas propostas perturbadoras e revolucionárias àquela época, enfrentavam o gosto oficial e que no princípio foram malsinados e marginalizados, passaram, numa reversão da expectativa, não só a serem canonizados, mas a fazer parte da ?modernidade? triunfalista.

Portanto, da recusa inicial desses artistas, à sua posterior celebração, estabeleceu-se um ritual sócio-estético de entronização. Algo que pode ser melhor explicado pela sociologia e antropologia. E da mudança de parâmetros estéticos, que sempre foi um processo renovador da própria história da arte, passou-se a parâmetro nenhum, tanto para a elaboração quanto para o julgamento de uma ?obra artística?. Não se trata do já estudado fenômeno da ?perda da aura? artística, mas sim de algo que se poderia denominar de reinvenção de uma outra ? aura? resultante tão somente do marketing e do mercado de galerias , de museus, de bienais e exposições congëneres. Uma ?aura? instituida por uma espécie de seita que faz da recusa de um pacto com o público, a sua auto-propulsão.

A improvisação, a audácia, o arrivismo, a exploração da ingenuidade do público e a esperteza burguesa e mercantilista sustentam um insólito equívoco na história das manifestações simbólicas do homem. O objeto artístico alienou-se do público e de si mesmo.

Portanto, considerando que o século 20 foi o espaço em que esse equívoco prosperou, mas considerando que é necessário rever e passar a limpo nossa história, sem o quê ela ficará estagnada em seus equívocos, é que se propõe aqui uma ampla discussão em torno da revisão das chamadas ? artes plásticas?."