Friday, 19 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1284

Após escândalo, Congresso reavalia lei de proteção à mídia

Depois que veio à tona que o governo americano teria monitorado ligações telefônicas de cerca de cem jornalistas da AP e que o correspondente da rede de televisão Fox News em Washington teria sido acusado de ser “cúmplice de conspiração”, o presidente Barack Obama pediu ao Departamento de Justiça que revise suas diretrizes sobre liberdade de imprensa.

Representantes de organizações de mídia foram convidados a dar seus pontos de vista, mas muitos recusaram-se a se reunir com o secretário de Justiça Eric Holder, que tem até julho para dar uma resposta ao presidente sobre como autoridades federais investigam repórteres. A decisão de lançar a investigação sugere que haverá ações concretas. Obama já propôs que fosse revista uma lei nacional de proteção à mídia para garantir a liberdade de imprensa. A imprensa vem respondendo com editoriais críticos e questões hostis nas coletivas na Casa Branca, que espera que a investigação do governo apazigue sua relação com os jornalistas.

Em discurso, Obama repetiu que é necessário um equilíbrio entre segurança nacional e liberdade de imprensa. Mas o presidente mudou a ênfase ao acrescentar que está preocupado com a possibilidade de que a investigação sobre o vazamento possa gerar autocensura no jornalismo investigativo. “Jornalistas não devem correr risco legal por fazer seu trabalho. Nosso foco deve ser naqueles que infringem a lei”, disse. “Como comandante-em-chefe, acredito que devemos manter em segredo informações que protegem nossas operações e as pessoas no campo. Para isso, deve haver consequências para aqueles que violam a lei e seu compromisso de proteger informações confidenciais. Mas uma imprensa livre também é essencial para a nossa democracia”.

“Comportamento vale mais do que estatuto”

Para Matthew Cooper, colunista da Atlantic e ex-jornalista da Time que foi indiciado no caso de vazamento da identidade secreta da agente da CIA Valerie Plame, nem as ideias em consideração no Congresso ou qualquer outra lei podem proteger adequadamente os profissionais de imprensa. Essa é uma das áreas nas quais o comportamento (no caso, o bom senso dos promotores) tem mais peso do que um estatuto. A maior parte dos promotores abre mão de perseguir jornalistas, mesmo quando pode.

Em 2003, Cooper chegou a escrever um artigo para a Time sobre como funcionários do governo de George W. Bush estavam destroçando Valerie Plame, funcionária da CIA cujo marido foi enviado pela agência para investigar acusações de que Saddam Hussein estaria tentando comprar urânio da África. Vazar a identidade de Plame era potencialmente um crime e Cooper foi ameaçado de prisão por desacato à corte por não identificar suas fontes. O caso foi até a Suprema Corte, onde foi negado.

Duas lições do episódio envolvendo Cooper, na opinião do jornalista: em um momento de guerra mais ou menos permanente, o governo federal mostrou pouco da sua antiga hesitação para perseguir jornalistas. Além disso, o governo tende a vencer – não sempre, mas na maioria das vezes. Ao final do caso de vazamento da CIA, promotores ouviram repórteres como Cooper, Walter Pincus, Tim Russert, Robert Novak, Bob Woodward, Glenn Frankel e Judith Miller. Todos lutaram com a lei, mas a lei venceu.

Isso ocorre porque a lei está do lado dos promotores. Em 1972, a Suprema Corte determinou no caso Branzburg vs. Hayes que não há direito constitucional para repórteres protegerem suas fontes. O caso envolveu um repórter de Kentucky cobrindo o comércio de maconha. Promotores queriam saber o que ele sabia. A determinação foi resultado de uma decisão dividida e a opinião do juiz Lewis Powell teve um grau de ambiguidade que permitiu que defensores da Primeira Emenda fizessem sucesso às custas dele por muitos anos.

Ainda assim, prevaleceu a decisão judicial. No auge do caso Woodward e Bernstein, o governo respondia ao dar a repórteres uma variedade de proteções por meio de leis ou determinações judiciais. Não havia pressão para uma lei de proteção federal, como agora, em parte porque defensores da Primeira Emenda, incluindo a indústria de jornais, acham melhor lutar outra vez com a Suprema Corte do que aceitar um estatuto insuficiente para defender os jornalistas.

No governo de Richard Nixon, o Departamento de Justiça tinha diretrizes mais razoáveis para quando promotores tinham que intimar jornalistas. Em geral, repórteres enfrentavam mais casos de calúnia do que intimações do governo. A necessidade de uma lei federal de proteção a jornalistas tornou-se óbvia durante o caso de vazamento da CIA, quando até mesmo os defensores mais inflexíveis da Primeira Emenda tiveram que reconhecer que, em um futuro próximo, a Suprema Corte não garantiria o direito de proteger as fontes.

No caso de Cooper, ele teve alguns direitos para resistir à acusação a nível estadual; no entanto, ele estava na corte federal. O juiz David Tatel, da corte de apelações, determinou que o jornalista tinha que testemunhar. A atual lei de proteção que está sendo avaliada no Congresso tem muitas exceções de segurança nacional e provavelmente não teria ajudado Cooper, a AP ou James Rosen. “É melhor do que nada, mas significa que nenhuma corte dará proteção incondicional para repórteres ocultarem suas fontes”, diz Cooper. “Promotores e outros terão sempre a oportunidade de convencer a corte de que a segurança nacional prevalece sobre questões de Primeira Emenda”.

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