Tuesday, 30 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Temporal vira chuva miúda on-line


Mauro Malin

 

A

informação on-line tem propriedades excepcionais. Pode ser consultada a qualquer momento, ao contrário da notícia dada no rádio e na televisão, que desaparece no fluxo do tempo.

Imaginemos que uma pessoa ouve no rádio do carro, às oito e vinte da noite, notícia sobre um temporal que começou no Rio de Janeiro à tarde. Até estacionar, entrar em casa e ligar a televisão, já terminou o Jornal Nacional (desloque-se a situação para uma hora mais tarde, e já terá terminado o Jornal da Manchete). Pior: chegou a tempo de ouvir as últimas frases do noticiário televisivo, o que só aumentou sua vontade de saber mais.

Se tiver acesso à Internet, poderá informar-se, recapitular tudo o que foi noticiado até aquele momento. As páginas brasileiras de informação on-line prestam esse serviço, mas a passo de tartaruga e com singular avareza. Na verdade, ainda estão engatinhando. Seu público, embora de padrão aquisitivo relativamente alto, ainda parece pequeno demais para justificar investimento em jornalistas, não apenas em máquinas, linhas telefônicas e programas de computador.

O temporal de 8 de janeiro no Rio de Janeiro permitiu tirar uma fotografia de diferentes serviços noticiosos na Internet. Vamos apresentá-la na ordem inversa à do grau de atualização das informações.

A noite é de ninguém

Os sites foram visitados pouco antes da meia-noite daquele dia (1). Depois, às 3h30 da madrugada. Por sinal, a madrugada parece não existir. Embora o serviço on-line não tenha nada a ver com o jornal impresso, que deve ir para a rotativa até determinado momento com suas informações “congeladas”, não houve na madrugada do dia 9 de janeiro qualquer atualização das informações encontradas por volta de meia-noite.

Para começar, informação zero: todos os sites internacionais (CNN, Yahoo, Miami Herald – em Miami há uma numerosa colônia brasileira).

Em seguida, quem deu a primeira informação e ficou nisso:

Correio Braziliense – 17h28, “Chuvas colocam Rio de Janeiro em estado de alerta”.
Brasil Online – 19h55, “Chuva paralisa o Rio e prefeito decreta estado de alerta”.
ZAZ (site da Rede Brasil Sul) – 20h05, “Chuva provoca caos no Rio”.
(A Agência Estado também deu a última notícia antes das 20 horas, e não a atualizou.)

E, na melhor situação, os sites dos jornais do Rio, que fizeram algumas atualizações, mas infinitamente aquém das edições impressas que foram para as mãos dos leitores algumas horas depois (informações, note-se, estocadas em meio digital, no mesmo prédio).

JB Online – 20h37, “Simone e Tom Cavalcante cancelam shows”. (Antes, 19h53, “Jacarepaguá sofre os efeitos da enchente”.)
O Dia – 21h20, “Chuva adia shows de Simone e Tom Cavalcante. Continua chovendo forte no Rio de Janeiro. Diversas ruas da cidade estão alagadas” (….).

E o que melhor atualizou sua página,

O Globo – 22h42, “Defesa Civil aconselha a quem está em área de risco buscar abrigo em repartições públicas”; 22h32, “Saques e assaltos se multiplicam na cidade inundada”; 22h24, “Rio Cidade da Zona Sul não passa no teste das águas”; 21h30, “Meteorologia prevê mais chuva por todo o fim de semana”; 21h09, “Conde pede verbas para obras contra enchentes e diz que é preciso rezar”; 20h24; “Temporal atrapalha investida da Prefeitura contra pichadores”; 19h58, “Transporte por trens para Belford Roxo e Gramacho está paralisado”.

Faltam braços

O Globo se saiu relativamente bem (bem melhor do que os outros, em todo caso), mas há uma história que merece ser contada. Em agosto de 97, o jornal mandou 14 jornalistas de seu meritório Projeto Calandra, coordenado por Luiz Paulo Horta, para um curso no Centro de Novas Mídias da Faculdade de Jornalismo da Universidade de Colúmbia, Nova York. Na volta, alguns deles fizeram uma edição extra do jornal interno chamado Planeta Globo (23/09/97).

A bonita edição apresenta com bastante lucidez os recursos jornalísticos das edições on-line. Exemplos: “A experiência do New York Times prova que as versões on-line e impressas se completam”; “Neste momento, o que todos os canais de informações on-line têm procurado fazer é conquistar a credibilidade do leitor”.

E com a mesma lucidez se explica por que a migração para o ambiente on-line de informações já apuradas e redigidas não é tão óbvia:

“Para disponibilizar o conteúdo do Globo, tanto na redação do Globo On quanto na do NYT on-line existe uma equipe de plantão para jogar as notícias na Web. Como não poderia deixar de ser, lá também eles se queixam muito de virar a noite para pôr o jornal na rede. Ossos do ofício.

Mas é claro que as diferenças existem. E elas são grandes. A principal diz respeito ao número de pessoas que trabalham no site: 35 no NYT on-line, contra 13 no Globo On.

Diferentemente do Globo, o New York Times optou por formar uma outra empresa para cuidar de seus negócios on-line: a New York Times Electronic Media Company.”

Tempo irreal

Quando o temporal seguinte caiu no Rio, em 16 de janeiro, o torpor já havia sido sacudido. Quer dizer: tinha sido sacudido no Rio, onde os jornais deram notícias rápida e repetidamente.

Felizmente, essa segunda chuva não causou tantos estragos quanto a anterior. Mas a Ponte Aérea, por exemplo, chegou a ser interrompida. Isso não impediu que as empresas de São Paulo continuassem sonolentas.

Embora os dois grandes jornais paulistas tenham dado notícia do temporal na capa em suas versões impressas de 17 de janeiro (foi a foto principal da Folha e um dos títulos acima da dobra do Estadão, mas ambos com informações imprecisas sobre a hora em que começou a chover), os serviços on-line não se entusiasmaram.

Segundo a Meteorologia carioca, a chuva começou, já muito forte, às três e quinze da tarde. O JB deu a primeira notícia às 15h44, O Globo às 15h48 e O Dia às 16 horas. Às 16h40, o Brasil Online ainda não tinha tocado no assunto. A Agência Estado só acordou depois das sete da noite.

Jornalismo em tempo irreal.

Chuvas melhores virão.

 

(1) JB Online, às 11h20 (inalterado até a manhã do dia 9); ZAZ, 23h40; O Globo, 23h42 (idêntico ao de 23h07 e inalterado até a manhã seguinte); Brasil Online, 23h45; O Dia, 23h46; CNN, 23h52: Yahoo World headlines, 0h02; Correio Braziliense, 0h25; Miami Herald, 0h25.

LEIA TAMBÉM

Pesquisa Cadê/Ibope (http://www.ibope.com.br/cade97/welcome.htm)