Tuesday, 30 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Virando a folha

“Cara Renata, ombudsman da Folha de S.Paulo, volto a escrever-lhe, motivado agora pela notícia na Ilustrada de hoje, 13/3/1999, p. 4-3, sob o título Giannetti e Dines saem da Ilustrada, e na qual se diz que ‘O jornalista Alberto Dines foi afastado após assinar texto no site OBSERVATÓRIO DA IMPRESA, que mantém na Internet, contendo informações inverídicas sobre o Grupo Folha’. Continua dizendo: ‘Dines vinha alimentando divergências com o jornal, que ele sistematicamente atacava no próprio espaço que lhe era assegurado’.

Há aqui dois aspectos que gostaria de levantar:

1. O jornal não diz que “informações inverídicas” eram estas a respeito do grupo Folha. Paira no ar uma questão: o jornal não oferece ao leitor nenhuma explicação. Que informações são estas? Só a referência ao site da Internet é que possibilita ao leitor tomar conhecimento do teor das mesmas, no caso, uma série de informações sobre problemas econômicos que o grupo Folha estaria enfrentando e uma crítica às empresas de comunicação, incluindo o grupo Folha, no que tange quer à gestão financeira das mesmas quer como repassam o ônus de sua administração ao leitor/consumidor.

Não seria mais honesto, por parte da Folha, publicar a matéria de Dines e, em seguida, posicionar-se desmentindo e, até, informando do afastamento do articulista? (sobre o autoritarismo e o arcaísmo desta atitude, segundo minha opinião, vide a seguir). Será que o jornal tem tanto medo daquilo que Dines escreveu para esconder de seus leitores e remete-los à Internet, no caso daqueles que disponham deste recurso e tenham interesse em acompanhar o caso?

Isto parece-me um caso de prepotência patronal, bem típica do capitalismo tardio brasileiro. Dines escreve contra a empresa do Nhô, o Nhô vai lá e demite Dines. O leitor que se dane, que tenha apenas um lado da história. E que seja embrulhado com manuais de redação e com colunas e editorias nos quais o Nhô fala (conversa para boi dormir, como se diz) sobre “transparência”, “cidadania”, “modernidade” e contra os “arcaísmos”, estes últimos, só o dos outros, porque o Nhô é o dono do jornal e, já que o tronco foi abolido e a Lei Áurea continua em vigor, demite-se quem critica. Ponto final e passe bem. O leitor que mantém o Nhô, porque se não comprarmos o jornal e não lermos os anúncios contidos nele o Nhô deixará de sê-lo, pois irá à falência, que se lasque, como se diz.

2. Numa leitura atenta do referido artigo de Dines (afinal eu não sou Nhô, mas tenho acesso à Internet e sei ler e escrever até que de maneira razoável), não se encontra, na minha opinião, nenhum elemento que justifique qualquer medida de retaliação. O artigo não é difamatório, não viola as regras elementares de nenhum debate crítico ou de livre expressão de idéias. De novo, se contém inverdades, que as verdades fossem publicadas e desmentidas em seguida, na mesma página.

Mas o que é importante aqui, além da desproporção do “castigo” face ao “crime” (ambos, claro, entre aspas e como metáforas), é que diversos jornalistas e articulistas da Folha cometeram e cometam faltas bem mais graves com os leitores, e não só continuam escrevendo como parecem até ser premiados pela direção do jornal. Relembremos alguns casos:

Arnaldo Jabor: você mesma, como ombudsman, já atendeu a reclamações comprovadas de leitores de que o dito articulista costuma oferecer “comida requentada” aos leitores. Por pelo menos duas vezes, Jabor escreveu artigos que continham grandes colagens de artigos anteriores de sua autoria, num dos casos com uma certa maquiagem. O caso veio à baila, mas Jabor continua escrevendo. Parece que anda trazendo só comida nova para os leitores e não mais requentada, mas nada soubemos sobre nenhuma advertência ao articulista. Pois é, o consumidor que coma comida requentada, o dono da empresa que não seja posto em xeque.

Marilene Felinto: esta madame brindou a imprensa brasileira, no ano passado, com um dos mais virulentos artigos de cunho anti-semita desde os tempos de Gustavo Barroso et caterva. Foi quando escreveu sobre o filme Amistad, de Spilberg. Diversas pessoas protestaram, eu inclusive (a carta que mandei ao Painel dos leitores nem foi publicada), entidades como a Federação Israelita posicionaram-se e nada aconteceu. Nenhum pedido de desculpas, nenhum posicionamento de ninguém. Pelo visto, isto dá lucros ao Nhô, que acabou mandando esta madame passear na França, durante a Copa do Mundo, para escrever o quanto o futebol é “alienante” e outras filosofias de botequim, quiçá ainda em moda entre adolescentes tardios que leiam o jornal.

Bárbara Gancia: costuma rotineiramente atacar os católicos que se aglutinam em torno do movimento carismático. Não tenho nada a favor do dito movimento (mesmo porque, eles que são católicos que se entendam) mas, desde que respeitem os outros, não tenho nada contra. Contudo, a dita articulista os critica com pretensões a um certo tipo de “humor” cujo mau gosto beira o chulo e vulgar. Isto sem contarmos a vulgaridade de sua seção de resposta a cartas na Revista da Folha.

Ricardo Bonalume Neto: sobre este já lhe escrevi. Embora não seja articulista, tem coluna cativa na Revista da Folha. Ano passado, escrevi-lhe sobre erros crassos, inverdades, que escreveu sobre a crítica bíblica, sobre as pesquisas científicas a respeito das origens e evoluções do texto bíblico. Recebi de sua parte a informação de que as críticas “foram levadas adiante”, mas nada melhorou.

Um caso diferente, mas que merece menção:

Otavio Frias Filho: escreve direto na segunda página, destinada a pessoas de expressiva representação política e cultural. Ele, por ser o Nhô, ou filho do dito cujo, arroga-se o direito de ser enquadrado nesta categoria. Eu, como leitor, mereço mesmo ter Otavio Frias Filho “no original” toda semana. O concorrente, o Estadão (aliás, en passant, apesar do blecaute, a distribuição do Estadão não furou como a da Folha, parece mesmo que “o Estadão funciona”…), apesar de empresa familiar, nunca colocou uma coluna fixa do dono ou do filho do dito cujo no jornal da família. Quem quiser ler o que os donos pensam que leia a página 3 (eu sempre pulo esta página na minha leitura do Estadão), sem precisar engolir ninguém da família Mesquita posando de intelectual.

Bom, pois é, depois de tudo isso, o problema mesmo, quem tem que ser “afastado” é Alberto Dines…

Só para finalizar: como leitor, gostaria de dizer que Alberto Dines é que engrandecia a Folha, e não o contrário. Com o afastamento dele, o jornal perde, ainda mais, sua qualidade já combalida. Sem mais, atenciosamente,”

Francisco Moreno de Carvalho

“À Folha de S. Paulo. Senhores, lamento a demissão de Alberto Dines. Os senhores ficaram menores e me provocaram duas emoções conflitantes num mesmo dia: alegria e tristeza. Havia acabado de ler o artigo de Marilena Chauí e inundado a minha alma de orgulho por ela ser mulher e brasileira e ter uma visão precisa de como precisamos lidar com a violência. De repente, leio através do site da ABI que os senhores demitiram o Dines. Uma onda de vergonha inundou a minha alma, além da indignação. Nem mesmo lerem o seu jornal os senhores lêem, ou então publicam aquilo em que não acreditam, apenas porque é moderno e politicamente correto:

1) Ao cometerem esta violência contra o Dines e a liberdade de expressão utilizaram “a ética como ideologia”, “confundindo ética e organização administrativa”, exatamente como Marilena Chauí discute no artigo que o os senhores publicaram hoje. 2) Mostraram que o artigo de sua “ombudsman” de hoje é letra morta, está lá apenas para fingir que os senhores dão importância à ética, porque na verdade, não foram capazes de lidar com a independência de seu articulista e com as pressões recebidas em função de seus artigos.

Não lhes atribuo intenções, descrevo apenas aquilo que sua ação nos faz sentir, pois a ação política, como escrevia o Dines naquele artigo censurado, é currículo e fala sobre o autor mais do que suas palavras. O que se pode sentir sobre os donos da Folha é que quando falam sobre a ética não o fazem como “agente ético”, porque “sua ação não se dá pela autonomia da vontade do agente ético” (M. C.). De hoje em diante, para mim, a Folha deixará de ser um organismo. Será um jornal que lerei com a reserva dos desconfiados.”

Vera Silva, psicóloga, Brasília, DF

A notícia da demissão do Alberto Dines só confirma minha opinião de que a Folha de S.Paulo é um jornal altamente tendencioso e que circula apenas com o intuito de atender aos interesses de quem paga melhor, não admitindo ser contrariado.

José Aguinaldo Ivo Salinas

Prezada Ombudsman,

Acabo de ler no BlueBus, na Internet, e estou horrorizado caso seja verdade, que o jornalista Alberto Dines acaba de ser demitido por expressar a sua opinião não concordante com os donos do jornal Folha de S.Paulo. Exijo, como leitor de mais de 25 anos da Folha, uma explicação clara e convincente do jornal e da Sra.. Caso seja confirmada esta noticia, riscarei definitivamente a Folha da minha leitura diária.

Rodolfo Felipe Neder

Prezado Rodolfo:

Suponho que você, a esta altura, já tenha ciência dos argumentos presentados pela Folha para afastar Alberto Dines do quadro de colunistas do jornal. Eles constam de nota publicada na Ilustrada de 13 de março. Como imagino que você não concorde com a posição do jornal, estou levando seu protesto ao conhecimento da Direção de Redação.

Atenciosamente,

Renata Lo Prete – Ombudsman

Meu caro Dines, é com grande tristeza que recebo a notícia da sua saída da Folha. Eu e, com certeza, todos os leitores do conceituado veículo estamos nos sentindo órfãos na privação da leitura dos seus artigos. Sorte minha poder vê-lo e lê-lo no OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA. Continue sendo o homem e o profissional corajoso que você é, o que fez de mim sua sempre tiete. Abraço carinhoso da amiga

Marilene Lopes

Caro Dines, antes de mais nada, solidarizo-me com você na despedida do Folhão. O que, na verdade, não me surpreende. Tentaram a forçada convivência com a crítica muito tempo, aliás. Não há mais lugar para gente acima dos 40 nas redações. Pensando bem, cada vez menos gente lê (e suja as mãos com) jornal de papel. Tá virando coisa de moleque. Os maduros estão nos jornais, revistas e sites on line. Isso tudo mereceria um estudo. Com um grande abraço,

Orlando Tambosi

Os que se consideram poderosos não admitem ser criticados, infelizmente. Um abraço.

Gibson Antunes, ombudsman de O Povo

Que maravilha de artigo!!! [o que motivou a demissão de Alberto Dines] Que lucidez, que capacidade analítica, que clareza, que coragem!!!!

Simone Lima

 

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