Tuesday, 30 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Pela abertura dos arquivos da repressão

Em janeiro de 1976, três meses depois da morte de Vladimir Herzog, sob tortura, em dependências do DOI-Codi do II Exército, a diretoria do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo encaminhou à Justiça Militar documento em que eram contestadas as conclusões do Inquérito Policial-Militar (IPM), de que Herzog se suicidara, e reclamava o ‘completo esclarecimento do caso’.


Intitulado ‘Em nome da verdade’, o documento encaminhado à Auditoria Militar, acompanhado de ofício assinado por todos os integrantes da diretoria executiva do sindicato, continha as assinaturas de 467 jornalistas de São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Porto Alegre, enquanto o abaixo-assinado continuava a receber adesões em outras capitais, totalizando 1.004 assinaturas.


Em função da urgência exigida para a entrega do documento, os nomes dos jornalistas de Natal e Curitiba não chegaram a constar da relação publicada pelo Sindicato dos Jornalistas.


A denúncia da farsa do IPM sobre a morte de Herzog não teve a divulgação correspondente à sua importância. Nenhum jornal publicou o texto integral, no qual eram apontadas as dúvidas sobre as conclusões do IPM, ou a lista dos signatários. Isso era previsto, pois se já não havia censores nas redações, vários veículos continuavam sob censura de fato, enquanto a maioria se acomodava na autocensura. Por isso, os próprios signatários, no ato da adesão ao documento, contribuíam com dinheiro para a sua publicação como matéria paga. O valor arrecadado, no entanto, foi suficiente para apenas uma publicação – em seção livre, no jornal O Estado de S. Paulo.


Verdade histórica


Pouco mais de dois anos depois, em outubro de 1978, às dúvidas levantadas pelos jornalistas foram acrescentadas outras, formuladas pelos advogados da família do jornalista no processo que levaria a Justiça a declarar a União responsável pela prisão, tortura e morte de Vladimir Herzog.


A decisão da Justiça encerrou o caso Herzog, um marco na luta pela reconquista da democracia no Brasil. Mas inúmeros outros casos ocorridos durante a ditadura militar permanecem sem esclarecimento. Os arquivos que contêm os documentos relativos à repressão política durante aquele período precisam ser abertos, não só porque isso é um direito das famílias de mortos e desaparecidos, mas para que a nação tenha pleno conhecimento da verdade histórica.


O recente episódio da divulgação de fotos tidas como de Vladimir Herzog demonstra a importância dessa busca da verdade. E o documento que 1.004 jornalistas subscreveram há 28 anos, deve ter, hoje, a sua continuação. Mais uma vez, em nome da verdade.

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Jornalista, presidente do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo à época da morte de Vladimir Herzog