Friday, 26 de July de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1298

Americanos no Paraguai

A permanência de 400 homens do Exército americano no Paraguai foi noticiada de forma relativamente discreta na imprensa brasileira. No início de julho, Mauro Santayana abriu em sua coluna no Jornal do Brasil baterias nacionalistas contra a incômoda presença ianque. Santayana lamentou que a usina de Itaipu tenha sido compartilhada com os vizinhos guaranis. Seja qual for a opinião que se tenha sobre o assunto, agora é tarde.


No final de julho foi a vez de Fidel Castro alertar os brasileiros. Segundo o comandante-em-chefe de Cuba, os Estados Unidos estão criando um ‘dispositivo militar’ para ‘deter’ o movimento político na América Latina. Castro afirmou que Washington tem ‘uma mentalidade intervencionista’ e planeja ‘entrar na Bolívia quando for preciso, e intervir inclusive no Brasil’.


Já houve bate-boca entre o presidente do Paraguai, Nicanor Duarte Frutos, e o chanceler brasileiro, Celso Amorim. Duarte Frutos chegou a relembrar que o Paraguai “ficou independente em 1811”.


A revista trimestral Política Externa, informa o jornalista Carlos Eduardo Lins da Silva, decidiu dedicar ao assunto seu próximo número. O comitê de redação da revista identificou na eleição de Tabaré Vazquez para a presidência do Uruguai o fator que fez os americanos promoverem o entendimento com o Paraguai.

De modo geral, identifica-se na ação americana o objetivo de pressionar o Brasil. Mas a mídia brasileira ainda está devendo uma abordagem mais completa da questão.


Para o coronel da reserva e pesquisador da Unicamp Geraldo Cavagnari, a preocupação dos americanos é com a Bolívia – mencionada de passagem por Fidel –, que seria hoje o principal foco de instabilidade na América do Sul. “Os americanos não precisam fazer treinamento em terreno como o do Paraguai”, diz Cavagnari. “Para eles, o problema é a Bolívia. Uma Bolívia de Evo Morales [líder dos cocaleiros] seria um problema potencialmente mais explosivo do que o da Venezuela de Hugo Chávez. Eles têm uma base no Equador, em Manta, e disporiam agora de um outro ponto de apoio para pressionar a Bolívia”.


Na análise de Cavagnari, o Brasil é que deveria ter feito algum tipo de pressão junto à Bolívia, embora o gás natural boliviano não tenha uma participação muito expressiva na matriz energética brasileira. “Se fosse outra a política externa, manobras militares brasileiras na região de fronteira serviriam como elemento dissuasório de qualquer iniciativa com repercussão nos interesses nacionais”, disse o coronel. Cavagnari está convencido de que o Brasil não pode prescindir da componente militar na sua estratégia diplomática.


Na mídia brasileira não se discute a sério a doutrina militar brasileira. Para começar, não há uma, mas três, uma de cada Força, desarticuladas, como se não tivesse sido criado um Ministério da Defesa. No ano passado, um embate com o comandante do Exército provocou a queda do ministro da Defesa, José Viegas. Mas foi uma polêmica em torno da abertura dos arquivos da repressão durante a ditadura militar. De política militar praticamente não se fala, como se um país do tamanho do Brasil pudesse ignorar essa componente de suas relações internacionais.