Sunday, 28 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Novas tecnologias dividem redações e universidades

Uma pesquisa feita nos Estados Unidos envolvendo professores de Jornalismo  jornalismo e profissionais de redações apontou algumas questões que podem ajudar a entender porque a academia e as empresas jornalísticas têm pontos de vista tão diferentes sobre o futuro da imprensa, em especial sobre o papel da internet na produção, edição e publicação de notícias.

A pesquisa Core Skills for the Future of Journalism (Habilidades Fundamentais para o Jornalismo do Futuro) organizada pelo Instituto Poynter, de São Petersburgo, Flórida, revela que, nos Estados Unidos, os profissionais das redações são mais resistentes às novas tecnologias do que os professores de Jornalismo  em universidades quando perguntados sobre o papel da internet no jornalismo atual e futuro.

O pomo de discórdia entre acadêmicos e profissionais é a questão das novas tecnologias. Os professores acham que as empresas deveriam dar mais importância à narrativa jornalística multimídia e ao relacionamento com os leitores. Já os profissionais afirmam que os novos jornalistas só deveriam trabalhar com novas tecnologias depois de se familiarizarem com os valores tradicionais do jornalismo – como objetividade, independência, exatidão e verificação.

A pesquisa entrevistou professores, executivos da imprensa e jornalistas profissionais para identificar as habilidades e competências necessárias para o exercício do jornalismo. As redações chegaram até mesmo a superar os executivos em matéria de resistência a inovações como narrativa usando recursos multimídia. Os profissionais foram os que menos valorizaram habilidades como edição de fotos, vídeos e áudios.

A pesquisa não procura explicar esta discrepância de percepções, mas é possível apontar algumas razões. A principal delas se refere às competências. Um profissional para se adaptar às novas tecnologias digitais e à convergência de plataformas de comunicação necessita sair de uma zona de conforto criada pela acomodação às rotinas determinadas pelo ritmo industrial na produção de notícias impressas ou audiovisuais.

Os executivos da imprensa valorizam as inovações porque elas oferecem a possibilidade de reduzir despesas e se mostram pouco inclinados a investir na recapacitação de profissionais quando o mercado está cheio de jovens cuja intimidade com as novas tecnologias é total. Já os educadores tendem a valorizar a digitalização e a internet pelos desafios teóricos que ambas geram e pelo seu potencial de mudança de paradigmas na comunicação.

A divulgação da pesquisa norte-americana aumenta a curiosidade sobre como reagiriam aqui no Brasil os profissionais, executivos e professores de Jornalismo se defrontados com as mesmas questões colocadas pelos pesquisadores Howard Finberg e Lauren Klinger, coordenadores do informe que procura orientar as faculdades sobre o que ensinar a seus alunos.

Não é difícil perceber que os profissionais do jornalismo nos Estados Unidos usam a defesa dos valores tradicionais da profissão para retardar o avanço frenético das inovações digitais e, assim, preservar o pouco de estabilidade no emprego. É também uma forma de barganhar mínimas condições de adaptação às mudanças provocadas pelo contexto digital. Nas respostas ao questionário da pesquisa norte-americana, os profissionais mais experientes afirmam que os novos jornalistas devem primeiro absorver os valores éticos e comportamentais da profissão e só depois entrar em contato com as novas tecnologias de informação e comunicação (TICs).

No Brasil, os professores de Jornalismo também apostam na inovação, mas seu entusiasmo pelas novas tecnologias talvez não seja tão grande quanto o de seus colegas norte-americanos devido às diferenças de apoio financeiro por parte das indústrias de base tecnológica. Na verdade, apenas uma pesquisa do mesmo porte da realizada pelo Instituto Poynter pode identificar o estado das relações entre as empresas brasileiras e a nossa universidade no que se refere ao futuro do jornalismo.

Até agora, as nossas empresas e o governo exercem uma verdadeira tutela sobre o jornalismo tupiniquim, porque ele depende estruturalmente de patrocínios e privilégios políticos. Com as novas tecnologias, a publicidade deixou de ser a base de apoio principal da imprensa nacional e os governos perderam força diante do maior protagonismo das redes sociais na formação da agenda noticiosa da mídia. 

O jornalismo do futuro tende a depender mais da tecnologia do que do poder político e econômico. Isto muda consideravelmente a relação dos profissionais, dos executivos e dos educadores em relação ao exercício da profissão.