Saturday, 27 de July de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1298

“Nuvem” de documentos muda valores e rotinas no jornalismo investigativo

O sonho de todo o repórter está começando a se tornar realidade. Nesta semana, os organizadores do DocumentCloud anunciaram que mais 20 jornais, universidades, centros de pesquisa e blogs jornalísticos aderiram ao projeto lançado no ano passado e que pretende ser a referência obrigatória para o trabalho investigativo online.


 


O DocumentCloud é uma espécie de megabanco de dados baseado na internet e de livre acesso aos participantes do projeto, não importa se jornais concorrentes ou não. Facsimile documento no DocumentcloudTodos os associados se comprometem a abrir seus arquivos permitindo o livre acesso a  reportagens, entrevistas, documentos e material gráfico, incluindo observações e anotações não publicadas.


 


Trata-se de uma idéia que pode revolucionar o jornalismo porque ela amplia o conceito de produção coletiva e colaborativa de informações, já que todo o material incluído no banco de dados do projeto é fornecido pelos seus usuários e associados. Mostra também em que medida os valores da profissão estão sendo mudados a partir do impacto das novas tecnologias.


 


Para se ter uma ideia do alcance do projeto, bastaria imaginar que O Globo, Estado de S.Paulo, Folha de S.Paulo e Valor Econômico pudessem bisbilhotar nos arquivos de cada um destes jornais. Parece utópico, mas é o que já estão fazendo os jornais The New York Times e The Washington Post, dois entre os maiores dos Estados Unidos e velhos concorrentes em matéria jornalistica.


 


Mas o DocumentCloud não é apenas um repositório de documentos. Ele funciona também como uma caixa de ferramentas para o jornalismo investigativo ao disponibilizar para seus usuários softwares de digitalização de documentos impressos, sistemas de classificação e cruzamento de arquivos, programas de extração de dados relevantes, de análise de arquivos e visualização imediata do material sem necessidade de sair da página visitada (sistema embed).


 


Por enquanto, o projeto está na fase beta e limitado a jornalistas experientes e de reconhecida credibilidade. Só eles podem adicionar documentos ao banco de dados, mas quando o DocumentCloud entrar em fase operacional, qualquer pessoa ou entidade associada poderá incorporar material à “nuvem” de arquivos. Na fase beta um programa já pode ser utilizado, mas ainda apresenta muitos problemas, ou bugs, que são corrigidos com a ajuda dos usuários.


 


Os criadores do projeto são jornalistas vinculados ao The New York Times e ao site ProPublica, uma entidade sem fins lucrativos que produz reportagens investigativas de caráter social. Tanto o jornal como o site não participam da diretoria do DocumentCloud, mas são associados ao projeto junto com os jornais Chicago Tribune, Dallas Morning, Voice of San Diego, San Petersburg Times, mais o telejornal PBS NewsHour, o portal de noticias MSNBC, as revistas New Yorker, Atlantic e Mother Jones, bem como o Centro de Jornalismo Investigativo da City University London e o Centro da Reportagens Investigativas/ California Watch, da Universidade do Sul da Califórnia.


 


Mais importante do que a inovadora tecnologia empregada para desenvolver o projeto é a mudança de rotinas, comportamentos e valores que ele sinaliza na atividade jornalística. Ele mostra que apesar da lentidão, mudanças estão acontecendo na área da publicação de notícias e quase todas elas são impulsionadas por profissionais que resolveram apostar na criatividade.


 


O DocumentCloud tem ainda um longo caminho pela frente para provar a eficiência de sua tecnologia, sua capacidade de atrair parceiros na imprensa e principalmente sua sustentabilidade financeira no médio prazo. 


 

Mas ficou claro que os jornalistas resolveram não esperar mais pelas empresas para reinventar sua profissão e seus valores. Também parecem dispostos a abrir mão do individualismo e do espírito de competição que marcaram a rotina das redações durante mais de um século.