Friday, 26 de July de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1298

O declínio da reportagem investigativa


Quem abrir um grande jornal hoje, tanto faz aqui no Brasil como no exterior, vai notar que as grandes reportagens investigativas estão se tornando cada vez mais raras. Quase todo o material classificado como exclusivo, na verdade, foi passado ao jornal, revista ou televisão por alguma fonte que, obviamente, tem algum interesse na divulgação do fato.


É mais uma consequência da decisão da grande maioria dos orgãos da imprensa mundial de cortar despesas sob pressão de acionistas para tentar manter a lucratividade do negócio e consequentemente tranquilizar investidores.


As reportagens investigativas foram responsáveis, no passado, pelo glamour que cercou a atividade jornalística e pela fama conquistada por alguns profissionais, como a dupla Bob Woodward e Carl Bernstein, os repórteres do jornal The Washington Post que desvendaram o escândalo Watergate.


Mas o atual período de vacas magras na imprensa acabou provocando cortes generalizados de gastos porque este tipo de reportagem custa muito mais caro, exige profissionais mais qualificados (maiores salários) e toma muito mais tempo, como resultados muitas vezes imprevisíveis.


O fenômeno acaba de ganhar uma dimensão numérica e estatística no documento State of the Media 2006  onde é feita uma análise do comportamento da imprensa norte-americana no ano passado.


O relatório faz uma afirmação perturbadora ao constatar que aumentou enormemente o número de fontes informativas mas caiu na mesma proporção a diversidade de temas abordados pela imprensa. Ou seja, apesar da fartura de canais de informação, temos uma dieta cada vez mais pobre e menos variada.


Temos cerca de 30 milhões de pessoas com capacidade de publicar informações através de weblogs, mas os jornais cortaram pela metade suas equipes de reportagem para usar o sistema de copie e cole. O relatório sobre a performance da imprensa norte-americana constatou que nada menos que 3.500 jornalistas, quase 2/3 deles repórteres perderam seus empregos nos últimos cinco anos.


Foi uma redução de 7% no efetivo das redações nos Estados Unidos, um percentual, sintomaticamente, quase igual ao da perda de leitores no mesmo período. Na televisão, o corte foi ainda mais radical pois as emissoras tem hoje apenas 1/3 dos repórteres que tinham há 20 anos.


A brusca diminuição no número de reportagens investigativas está mudando o papel que a imprensa tem na formação da opinião pública nacional. Ela está deixando de ser uma fonte de referência para quem deseja obter informação isenta, já que ela não tem mais repórteres capazes de fazer uma investigação autônoma e passa a depender cada vez mais de material fornecido por fontes, cujos objetivos nem sempre são muito claros.


Apanhada no redemoinho dos interesses, a imprensa acabou transferindo para o leitor a confusão e paradoxos dos seus informantes, provocando o descrédito do público e a perda de clientes. Hoje é cada vez maior o número de leitores que se preocupam mais em descobrir porquê uma notícia foi publicada do que em tomar conhecimento do seu conteúdo. Surge a categoria do leitor investigativo para suprir as carências da reportagem.


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