Friday, 26 de July de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1298

O papel da imprensa na rebelião contra os impostos

A rebelião contra os impostos já é um fenômeno mundial e, ao que tudo indica, vai ocupar um lugar destacado na pauta da imprensa brasileira durante a cobertura da campanha para as eleições presidenciais de 2010.


 


É um tema muito popular e que mexe no bolso de todos nós, mas cuja discussão deve ser contextualizada sob pena de nos induzir a apoiar soluções ainda mais desastrosas, tanto do ponto de vista econômico como do social.


 


Não há a menor dúvida de que os contribuintes sentem-se enganados e explorados pelos governos federal, estadual e municipal porque não recebem serviços na qualidade e quantidade previstos pela lei, com retribuição pelos impostos pagos.


 


Pobres e ricos estão, paradoxalmente, unidos nesta ofensiva contra o pagamento de impostos. Uns por desespero ou frustração, e outros pela ambição de não dividir suas receitas pessoais ou corporativas com o poder público.


 


Nos Estados Unidos, o movimento Tea Party, ultraconservador, lidera uma campanha nacional contra o pagamento de impostos, invocando, como precedente, a histórica rebelião das antigas colônias britânicas na América do Norte, no século 18. O nome Tea Party, ou rebelião do chá, marcou o início da campanha pela independência dos Estados Unidos, a partir da recusa dos colonos de pagar impostos sobre o chá vindo da Inglaterra.


 


O movimento contra os impostos já tem o seu herói, o engenheiro eletrônico Joe Stack, que se matou em fevereiro de 2010 em Austin, Texas, ao jogar seu avião monomotor contra os escritórios do serviço de imposto de renda dos Estados Unidos. O suicida deixou uma carta responsabilizando o governo por seu desespero financeiro.


 


No Brasil, a campanha contra os impostos, que está sendo liderada por entidades empresariais e partidos conservadores, seguramente vai contaminar a campanha eleitoral, associada à idéia de que o governo, além de taxar em demasia os contribuintes, esbanja os recursos arrecadados.


 


O crescimento da campanha anti-impostos alimenta-se de duas vertentes: uma ideológica e outra  conjuntural, provocada pelo empobrecimento de segmentos da população, como é caso da classe média baixa norte-americana, a mais atingida pela crise no período 2008/2009.


 


A vertente ideológica se baseia na idéia do Estado mínimo, emque o mercado e os interesses privados determinam os rumos da economia e por consequência também o jogo pelo poder político. Esta é tese do movimento Tea Party e da campanha movida por entidades empresariais brasileiras.


 


A exagerada carga impositiva e a sua má utilização pelos governos tornaram-se um lugar comum. Só que reduzir a receita estatal significa reduzir também a massa de recursos disponíveis para saúde, educação, obras de infraestrutura, segurança publica, segurança nacional, só para citar as áreas mais críticas.


 


Além disso, quando a vaca foi para o brejo na crise financeira nos Estados Unidos, foi o governo que salvou os bancos, empreiteiras e as indústrias automobilísticas em falência por conta do estímulo ao endividamento. 


 


Não é uma questão fácil e a tentação de reduzi-la a uma campanha dos contribuintes explorados contra o Estado todo poderoso e perdulário esconde uma série de armadilhas que a imprensa não pode deixar de lado. O papel da mídia, numa conjuntura como esta, é o de oferecer fatos e propor a discussão de processos sem partidarismos ou pressupostos ideológicos.


 


É uma situação demasiado séria para ser tratada levianamente. Mais ainda num contexto onde os interesses partidários e ideológicos polarizam a discussão entre os contra e os a favor, sem levar em conta que um encaminhamento equivocado da redução de impostos pode criar um situação potencialmente catastrófica, no caso de uma nova turbulência econômica como a que afetou principalmente a Europa e Estados Unidos.


 


Como a imprensa se diz prestadora de serviços de informação para que o cidadão possa tomar decisões capazes de resolver seus problemas, ela tem o dever de contextualizar a questão dos impostos — uma tarefa complicada, mas que pode reaproximá-la dos seus leitores.