Thursday, 03 de October de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1308

As notícias condenadas ao esquecimento

Dezembro e janeiro são meses em que as atividades profissionais normalmente caminham mais lentamente, seja pelo início do período de festas, seja pelo grande número de pessoas que aproveitam as férias escolares para viajar. Na imprensa a prática não é diferente, daí o emagrecimento de jornais e revistas, reprises de programas em rádios e TVs e proliferação das chamadas ‘matérias de gaveta’ ou ‘pautas frias’, aquelas que cabem em qualquer momento.

Quando freqüentamos o curso de Jornalismo aprendemos lá no começo das aulas os critérios de noticiabilidade, isto é, os ingredientes necessários para que um acontecimento vire notícia na imprensa. Mário Erbolato, autor de Técnicas de codificação em jornalismo (Vozes, 1994), elenca 24 motivos para que os leitores busquem as notícias.

São eles: proximidade (divulgação que fatos que acontecem perto do leitor), marco geográfico (notícia que, mesmo acontecendo em local geograficamente distante, possa influenciar a vida do leitor), impacto (abalo moral, chocante ou impressionante), proeminência (ou celebridade), aventura e conflito (notícias sobre assassinatos, rixas etc.), conseqüências (por exemplo, o aumento do preço do petróleo e seu impacto no Brasil), humor (fatos pitorescos, principalmente na política), raridade (fato que foge da rotina), progresso (melhorias na comunidade), sexo e idade, interesse pessoal (por exemplo, prazos de entrega do Imposto de Renda), interesse humano (drama de pessoas envolvidas em acontecimentos impactantes, como enchentes, terremotos etc), importância (relevante no prisma do editor), rivalidade (principalmente esportiva), utilidade (o que abre e que fecha no feriado, horário de cinemas etc), política editorial do jornal, oportunidade (matérias ‘frias’), dinheiro, expectativa ou suspense (quem matou aquele político famoso?), originalidade (esse critério confunde-se com raridade), culto de heróis (por exemplo, homenagem a ex-pracinhas ou ex-campeões de futebol), descobertas e invenções, repercussão e confidências.

Para o autor, a notícia precisa ser ainda recente, inédita, verdadeira, objetiva e de interesse público.

O sétimo ingrediente

Ao que parece, a grande maioria dos veículos de comunicação leva ao pé da letra o quesito ‘recente’ e, após a publicação de determinado acontecimento, limita-se a dedicar algumas suítes (seqüência de uma matéria, por desdobramento do fato, novos detalhes ou acompanhamento de um personagem) e depois condenar a notícia ao esquecimento (com exceção, é claro, dos cadernos especiais de fim de ano com a retrospectiva dos fatos mais interessantes) e o leitor à eterna curiosidade.

Alguns exemplos: acharam o(s) culpado(s) pelas mortes dos animais do Zoológico de São Paulo? O que faz Severino Cavalcanti após entregar o cargo? Solucionaram o crime da Rua Cuba? E o acerto da tabela do Imposto de Renda, só volta à pauta em março?

Além desse déficit de memória da imprensa, uma verdadeira amnésia coletiva, por vários motivos as notícias chegam cada vez mais superficiais. Nada contra o jornalismo declaratório em que, para fazer a matéria, respondemos às seis perguntas do lide (quem? quando? como? onde? o quê? por quê?) e colocamos a fala de cada um dos atores envolvidos. Faz parte do bom jornalismo ouvir os lados citados. O que, talvez, os colegas de redação deveriam fazer seria acrescentar mais um ingrediente aos seis já existentes do lide: o ‘e daí?’. Acredito que esse item já ajudaria o leitor a entender melhor a história, o que ela representa na vida de cada um e, mais tarde, ao cair no umbral do esquecimento da redação, cobrar desdobramentos das notícias publicadas e arquivadas temporariamente.

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Jornalista, professor universitário, doutor em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, SP