Tuesday, 30 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Como a emissora deve dialogar com a sociedade

A TV Brasil deve voltar ao centro dos debates no Congresso Nacional nos próximos dias. Publicada em 10 de outubro do ano passado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a Medida Provisória 398 que criou a EBC – Empresa Brasil de Comunicação (mantenedora da TV Brasil) passará em breve a trancar a pauta do legislativo federal, tornando necessária a sua apreciação pelos parlamentares.


Ainda não é possível afirmar se a tramitação da MP será tranqüila. Caso a oposição escolha a TV Brasil como alvo prioritário, como fez com a CPMF, o governo pode ter problemas em obter os votos necessários para a sua aprovação, especialmente no Senado, onde possui frágil maioria. Não está claro também qual será o texto final da MP, hoje nas mãos do deputado Walter Pinheiro (PT-BA), relator da matéria na Câmara. A depender do teor da proposta do parlamentar, a aprovação da MP pode se tornar mais simples ou complexa.


Para acalmar os ânimos da oposição, municiada pela Abert – Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e TV, Pinheiro deve incorporar ao relatório a proibição de publicidade, evitando assim a perda de receitas pelos radiodifusores comerciais. Mas há também a possibilidade do parlamentar propor mudanças no modelo de gestão da empresa, criticada por organizações que defendem a democratização das comunicações, que reivindicam que o conselho curador da EBC conte com membros indicados pela sociedade civil. Pela MP, tanto o conselho quanto a diretoria executiva da empresa devem ser indicados diretamente pelo presidente da República.


Gestão, avaliação e transparência


Mesmo sem a confirmação do deputado Walter Pinheiro sobre a incorporação de suas propostas ao relatório da MP, organizações da sociedade civil se mobilizam para que a EBC desenvolva mecanismos auxiliares de diálogo com a população. Entre o final de dezembro e o início de janeiro, o Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, entregou aos membros do Conselho Curador e à presidente da EBC, Tereza Cruvinel, documento com propostas para dar transparência à gestão e introduzir formas de participação da sociedade na empresa.


‘É importante garantir que a população possa incidir no funcionamento do sistema público de comunicação brasileiro. É a sociedade quem deve exercer o necessário controle das atividades da EBC’, afirma Bráulio Ribeiro, da coordenação do Intervozes. ‘Além disso, é fundamental promover a transparência de suas atividades, inclusive para que os veículos desse sistema mantenham sua credibilidade.’ O documento da organização propõe o estabelecimento de instrumentos que permitam ao Conselho Curador manter diálogo permanente com a sociedade civil, tanto com os setores organizados como com a sociedade como um todo. Por isso, sugere que as principais questões e recomendações do Conselho sejam obrigatoriamente colocadas em consulta pública e que sejam promovidas audiências e debates periódicos.


‘Se o Conselho não abrir canais de interlocução com a sociedade, ele se isolará, e assim não terá condições de cumprir com os seus objetivos, que é justamente ser o elo de ligação entre a população e a empresa’, diz Ribeiro, do Intervozes. A organização propõe o estabelecimento de conselhos de programação, nacional e regionalmente, que discutam e sistematizem olhares sobre a programação, em relação aos formatos, em relação à diversidade demográfica (regional, étnico-racial, de gênero etc.) e de pontos de vista. ‘Estes conselhos teriam a função de fazer avaliações periódicas dos objetos, dialogando diretamente com o Conselho Curador.’


Independente dos mecanismos que possam vir a ser adotados pelo Conselho Curador, a presidente da EBC, Tereza Cruvinel, afirma que a empresa também está estudando formas de estimular o diálogo com a população. ‘Vamos lançar mão de recursos de interatividade, inclusive pela internet, abrindo portas para os telespectadores se comunicarem com a TV Brasil’, afirma Cruvinel.


Ouvidoria


Outra proposta defendida pelas organizações e atualmente em debate pela EBC é o estabelecimento de uma ouvidoria. Paulo Machado, ex-ouvidor da Radiobrás, entregou na última semana à diretoria da empresa um projeto para o funcionamento do órgão. ‘A ouvidoria deve ser a representante dos interesses do cidadão junto à empresa, com uma série de mecanismos de participação’, afirma Machado. ‘Procurei reunir o que há de mais atual nessa questão.’


A proposta do ex-ouvidor tem a simpatia da presidente da EBC. ‘A Radiobrás, que será incorporada pela EBC, é a única televisão brasileira que já tem esse serviço. Vamos ampliar e fortalecer esse mecanismo de interação com a sociedade.’ Segundo Cruvinel, neste momento a EBC trabalha na elaboração das normas da ouvidoria. ‘O segundo passo será a escolha do ouvidor’, diz.


Segundo o ex-ouvidor da Radiobrás, o projeto enviado à diretoria da EBC propõe a formação de comitês de usuários, que seriam convidados a opinar sobre a linha editorial da empresa e a programação em geral, como em um fórum permanente. ‘A ouvidoria teria a tarefa de implantar um comitê por veículo e ficaria encarregada de receber as contribuições e encaminhar à presidência da empresa e ao conselho curador’, conta Machado, que afirma que também propôs à diretoria da EBC que a destituição do responsável pelo órgão tenha que ser aprovada pelo Conselho Curador. ‘Assim daremos mais estabilidade e independência ao ouvidor.’


Machado ainda defende que seja reservado um espaço ao ouvidor em todos os veículos da empresa, proposta que também agrada Cruvinel. ‘Na grade de programação, será criado o espaço para o ouvidor receber as críticas e sugestões dos telespectadores. Para nós, esse espaço é de grande importância porque será um dos retornos sobre o nosso trabalho’, afirma a presidente da EBC.

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Do Observatório do Direito à Comunicação