Wednesday, 09 de October de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1308

Jorge Bittar já admite
retirar cotas do PL 29


Leia abaixo os textos de quarta-feira selecionados para a seção Entre Aspas.


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Folha de S. Paulo


Quarta-feira, 13 de agosto de 2008


TELECOMUNICAÇÕES
Elvira Lobato


Relator de projeto de lei admite mudar proposta sobre TV paga


‘O deputado federal Jorge Bittar (PT-RJ), relator do projeto de lei que prevê a entrada das teles no mercado de TV a cabo, admitiu ontem que pode retirar o limite de participação, por grupos de mídias, no pacote de canais de conteúdo nacional obrigatório na TV paga.


O projeto de lei nº 29 prevê a criação de um sistema de cotas para garantir conteúdo nacional na TV por assinatura. Uma das cotas se refere ao número de canais nacionais obrigatórios na grade de programação.


Do pacote previsto de até 12 canais nacionais, no máximo 25% poderiam vir de uma mesma programadora. A Globosat, que tem seis canais próprios, seria diretamente afetada.


A restrição foi proposta pelos grupos Abril, Bandeirantes e Record, com a tese de que é preciso diversificar o mercado de programação para TV paga.


A queda-de-braço entre as empresas de mídia é o maior empecilho para a votação do projeto de lei, admite Bittar.


Em entrevista, ontem, no congresso anual da ABTA (Associação Brasileira de Televisão por Assinatura), Bittar disse que o limite percentual pode ser substituído por uma regra, ‘ainda que seja declaratória’, que garanta a pluralidade.


Conflito de interesses


Os conflitos de interesses em torno do projeto de lei ficaram evidentes, ontem, no congresso da ABTA.


O deputado federal Paulo Bornhausen (DEM-SC), autor do projeto original para liberar a atuação das teles na TV a cabo, defendeu que o PL 29 vá para votação sem os artigos sobre conteúdo nacional, em razão da dificuldade de entendimento entre as partes.


Para ele, é prioritário eliminar a restrição ao capital estrangeiro e à entrada das teles no setor. Hoje, cada tecnologia de TV por assinatura tem regulamentação diferente.


Nas TVs a cabo, existe obrigatoriedade de controle de capital nacional, o que não ocorre nas empresas de TV paga com transmissão via satélite (como a Sky) e via rádio (sistemas MMDS).


Bittar disse que a exclusão do capítulo sobre conteúdo nacional seria inadmissível.


Para o relator, já existe consenso em relação a 90% do texto do projeto de lei.


Ele disse que continuará buscando o acordo e que acha possível a votação do projeto pela Comissão de Comunicação, Ciência e Tecnologia dentro de um mês. Segundo Bittar, as principais pendências são com os radiodifusores.


Os conflitos em torno do PL 29 começaram quando o deputado redigiu o texto inicial, a partir de acordo entre as companhias telefônicas e as empresas de radiodifusão.


As empresas de TV a cabo e os programadores internacionais não foram consultados, e reagiram com uma campanha publicitária na TV contra a criação de cotas de conteúdo nacional na TV paga. O conflito entre a Globo e outros radiodifusores surgiu neste ano.


O diretor-executivo da ABTA, Alexandre Annemberg, comparou o sistema de cotas à política de reserva de mercado da informática praticada no passado e disse que seria ineficaz. Para ele, o interesse das teles pela TV paga estaria em impedir o crescimento da concorrência na banda larga.


O presidente da Abrafix (associação que reúne as concessionárias de telefonia fixa), José Fernandes Pauletti, disse que as teles encaram as cotas de conteúdo nacional como um remédio ruim.’


 


 



Adriano Ceolin e Andreza Matais


Indicação na Anatel acelera aval a nova tele


‘A Comissão de Infra-Estrutura do Senado deve aprovar hoje o nome de Emília Maria Silva Ribeiro para a quinta vaga na diretoria da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) facilitando a conclusão da venda da Brasil Telecom para a Oi. Indicada pela cúpula do PMDB, ela foi escolhida a dedo para reforçar a posição do governo, favorável à negociação, já que, no momento, a diretoria da Anatel (composta por quatro integrantes) está dividida.


Ribeiro não fala sobre o assunto. Mas, em conversas reservadas com senadores do PMDB, já disse que seguirá na Anatel as orientações do governo. Embora a agência seja independente, ela tem afirmado que é o Executivo quem dá as diretrizes do que deve ser feito.


Com trânsito no Congresso, inclusive nos partidos de oposição, Ribeiro conta com o apoio do presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN).


Mas o seu padrinho mais forte é o senador José Sarney (PMDB-AP). Foi ele quem a levou para trabalhar no Senado em 2003, quando era presidente da Casa. Os dois têm relação estreita desde a década de 1980.


O marido dela, Luiz Curi, é reitor da Unieuro (Instituto Euro-Americano de Educação, Ciência e Tecnologia) desde 2004. A instituição, com sede em Brasília, pertence ao empresário Mauro Fecury, primeiro suplente da senadora Roseana Sarney (PMDB-MA), líder do governo no Congresso. Em 1979, Fecury foi nomeado prefeito de São Luís (MA) com o apoio de Sarney. Fecury também assessorou Sarney na Presidência da República.


A Unieuro foi criada em 1998 por Mauro Fecury, confirmou o pró-reitor da instituição, Miguel Fecury. À época, Ribeiro e Curi trabalhavam no MEC (Ministério da Educação e Cultura), mas não eram casados. Ela era assessora especial do então ministro Paulo Renato (PSDB) e Curi comandava a Diretoria de Política de Ensino Superior.


A Folha apurou com parlamentares da bancada da educação que, no ministério, Ribeiro tinha entre suas atribuições avaliar os pedidos de políticos interessados na abertura de faculdades. Assim, se aproximou de vários parlamentares.


Além de Sarney, Ribeiro conquistou a confiança de Renan Calheiros (PMDB-AL), que a manteve no cargo enquanto esteve na Presidência da Casa (2005-2007). Uma de suas tarefas era acompanhar a liberação das emendas do senador e os projetos de interesse dele nos ministérios. Segundo pessoas próximas a Renan, ela o orientava sobre com quem deveria falar nos ministérios para agilizar suas demandas quando o assunto dependia mais de decisões técnicas do que dos ministros. Renan tem trabalhado nos bastidores pela aprovação do nome dela.


Após a renúncia de Renan e a eleição de Garibaldi, Ribeiro foi mantida como assessora da Presidência da Casa. Atualmente, tem como tarefa produzir pareceres para orientar Garibaldi sobre diversos assuntos. Recentemente, elaborou texto sobre a fusão da Oi com a Brasil Telecom. A assessoria do Senado não quis divulgar o conteúdo. Informou apenas que o material não faz juízo de valor.


Perfil


Bacharel em direito desde 1999, Ribeiro chegou a cursar administração, mas acabou não se formando. Na área de telecomunicações, sua experiência restringe-se à participação no Conselho Consultivo da Anatel, cargo para o qual também foi indicada por Sarney, em 2005.


Antes de trabalhar no Senado e no MEC, Ribeiro atuou como assessora no extinto Ministério do Interior, em 1988. Também foi assessora parlamentar do Ibama (1989-1991), da Secretaria de Administração Federal (1991) e do Ministério da Criança (1992). Em seguida, foi assessora parlamentar do Ministério da Educação, que deixou apenas para ser assessora especial de Paulo Renato (1997-2003). Por conta desse vínculo com os tucanos, a relatoria da indicação de Ribeiro caiu nas mãos do senador Sérgio Guerra (PE), presidente do PSDB. O caso, porém, não deixou de causar polêmica no partido.


‘A Emília é uma boa articuladora política, mas não tem o perfil técnico que a agência requer. As agências foram criadas com o conceito de colocar técnicos independentes e autônomos para administrarem os problemas de cada setor. O PT politizou as agências’, disse o deputado tucano Arnaldo Madeira (SP).


Guerra chegou a pensar em entregar a relatoria, mas depois se convenceu de que o melhor seria aproveitar o momento para marcar posição e escrever que o partido é contra politizar as agências. Para que o nome seja aprovado, são necessários 12 votos -em votação secreta.’


 


 


 


OLIMPÍADAS DE PEQUIM
Sérgio Dávila


Troca de hegemonias


‘SE EXAGERO automobilístico fosse uma modalidade olímpica, os EUA teriam 200 milhões de Michael Phelps atrás dos volantes. Os motoristas locais estão sozinhos quando se trata de gastar combustível fóssil -dos outros, diga-se, já que o país importa US$ 700 bilhões de petróleo por ano- para colocar para rodar seus SUVs, aqueles jipões enormes e gastadores que evidenciam algum complexo de inferioridade local.


Mas as coisas começam a mudar. Se a necessidade é a mãe da invenção, o preço alto da gasolina pode ser o pai da redenção ecológica do país. Com o combustível a US$ 4 o galão (R$ 1,4 por litro, uma barganha para os brasileiros, mas um recorde para os norte-americanos), começam a cair as vendas dos carros grandes no país.


Com declínio no número de compradores, a GM pensa em fechar as quatro fábricas da América do Norte que produzem os Humvees, o Schwarzenegger dos jipões, aqueles veículos semi-militares beberrões de combustível que foram moda um dia e que hoje recebem vaias quando passam pelas ruas de Los Angeles e Nova York.


Mas as vendas nos EUA dos jipões e caminhonetes em geral caíram em julho em comparação ao ano anterior nas principais montadoras. Só na Chrysler e só nessa categoria, a queda foi de 30%. É antropologicamente curioso olhar americanos dirigindo constrangidos seus novos ‘carros pequenos’, como o Ford Focus, que viu as vendas saltarem 16%.


Ao mesmo tempo, segundo relatório divulgado ontem pela empresa de consultoria Global Insight, a China vai ultrapassar os Estados Unidos como primeiro país produtor de bens manufaturados do mundo em 2009, quatro antes do que o previsto. Será responsável por 17% da produção mundial, ante 16% dos norte-americanos.


Quebra assim uma hegemonia que já durava cem anos. E retoma a que durou, segundo historiadores, 18 séculos…’


 


 


 


Raul Juste Lores


Loucos por carros


‘NOS PRÓXIMOS dez anos, quase 100 milhões de novos carros devem ser vendidos na China. A motorização empurra a alta do preço do petróleo no mundo e polui ainda mais o país asiático, mas essas preocupações passam longe de qualquer concessionária chinesa.


Condenados a pedalar com velhas bicicletas por décadas, o sonho chinês do carro próprio é recente. Embora a propriedade de automóvel tenha sido permitida em 1978, só em 1994 o governo estimulou a compra.


Em 1990, a China produzia apenas 40 mil veículos por ano. Em 2008, serão 10 milhões – o segundo maior mercado do mundo. Há 50 milhões de veículos no país de 1,3 bilhão de habitantes, o que mostra o quanto ainda dá para crescer.


80% dos compradores são motoristas de primeira corrida. Ninguém na sua família dirigiu antes, com exceção de poucos afortunados. Nota-se. Os motoristas dirigem lentamente e muitos se negam a conversar enquanto estão no volante, colados na direção.


Com exceção das revendedoras de bairros chiques de Pequim, o normal é que o comprador pague à vista e em dinheiro, levando sacolas com centenas de notas. Carros populares são vendidos ao equivalente a R$ 10 mil, mas a venda de carros de luxo é a que mais cresce. Foram vendidos no ano passado 18 mil Mercedes e 50 mil Audis, a marca favorita dos membros do Partido Comunista.


Em uma sociedade louca por status, depois de décadas de igualitarismo e miséria forçados, quem compra um automóvel tem privilégios.


Avenidas de doze faixas são abertas regularmente e pobre de quem tentar atravessar a pé. Lei de trânsito não cola nem em temporada olímpica. Carros e ônibus param em cima da faixa de pedestres, cruzam à esquerda, à direita, fecham cruzamentos, estacionam nas calçadas e, principalmente, empurram ciclistas e pedestres, os perdedores da nova China.’


 


 


 


MEMÓRIA / OCTAVIO FRIAS DE OLIVEIRA
Folha de S. Paulo


CNI homenageia publisher da Folha na festa pelos 70 anos da entidade


‘O publisher da Folha, Octavio Frias de Oliveira, recebeu ontem in memoriam a Medalha do Mérito Euvaldo Lodi, homenagem da CNI (Confederação Nacional da Indústria). Frias morreu aos 94 anos em 29 de abril do ano passado.


Outras 19 pessoas foram agraciadas com a homenagem, que leva o nome do primeiro presidente da confederação e foi instituída para marcar os 70 anos da entidade. São elas: o arquiteto Oscar Niemeyer; os empresários Antônio Ermírio de Moraes, Jorge Gerdau, Norberto Odebrecht e Décio da Silva; a ministra do Supremo Tribunal Federal Ellen Gracie Northfleet; o senador Cristovam Buarque; os ex-ministros Antonio Delfim Netto (Fazenda, Planejamento), Jarbas Passarinho (Educação, Previdência e Justiça), Célio Borja (Justiça) e Luiz Fernando Furlan (Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior); o ex-professor da USP José Pastore; o ex-presidente da Fifa João Havelange; o ex-jogador Pelé; a atriz Fernanda Montenegro.


Além de Frias, também receberam a homenagem in memoriam a primeira-dama Ruth Cardoso (1930-2008), o presidente das Organizações Globo Roberto Marinho (1904-2003), o presidente do Grupo Abril Victor Civita (1907-1990) e o cientista Carlos Chagas Filho (1910-2000). A medalha a Frias foi recebida em seu nome por sua filha Maria Cristina.


‘Esta medalha comemora a criatividade e a originalidade. É um tributo da CNI à sociedade civil’, disse o presidente da CNI, Armando Monteiro Neto.


‘Um país que gera as personalidades aqui agraciadas pode fazer mais e melhor. Temos de nos espelhar no que há de melhor na sociedade brasileira’, afirmou Monteiro Neto.


Também foram lançados um selo e um carimbo comemorativos pelo aniversário de 70 anos da confederação.


Várias autoridades compareceram ao evento na sede da CNI, em Brasília. Estiveram presentes o vice-presidente da República, José Alencar, o presidente do Senado, Garibaldi Alves, e oito ministros: Dilma Rousseff (Casa Civil), Patrus Ananias (Desenvolvimento Social), Miguel Jorge (Desenvolvimento), José Pimentel (Previdência), Edison Lobão (Minas e Energia), Sergio Rezende (Ciência e Tecnologia), Luiz Barreto (Turismo) e José Múcio (Relações Institucionais).’


 


 


 


ELEIÇÕES / EUA
Marcelo Coelho


A mosca que mudará o mundo


‘A TÉ PARA fazer xixi corretamente o ser humano precisa de um empurrãozinho. Li isso numa entrevista publicada anteontem na Folha, com o economista Richard Thaler.


Consideram-no um dos gurus de Barack Obama, e sua teoria do ‘empurrãozinho’, ou ‘nudge’, em inglês, é explicada num livro do mesmo nome, ainda a ser lançado no Brasil.


O exemplo do xixi vem de um aeroporto holandês, que se debatia com o descuido dos usuários do sexo masculino. Tiveram a idéia de estampar a imagem de uma mosca dentro dos urinóis, bem perto do escoadouro.


Desse modo, a urina acaba caindo perto do ralo. Reduziram-se em 80% os casos de sujeira, digamos, no entorno imediato.


A teoria do ‘empurrãozinho’ tem muitas aplicações. Thaler a resume na tese do ‘paternalismo libertário’. Parte de um pressuposto correto.


A saber, o de que os seres humanos não são tão racionais quanto afirma a teoria econômica clássica. Muitas vezes, sabem que suas ações são contrárias a seus interesses, e mesmo assim… conseguem fazer besteira.


Outro exemplo citado por Thaler diz respeito aos planos de previdência de alguns países. Quem se munisse de calculadora e tempo concluiria que são vantajosos. Mas pouca gente faz isso, e não tem paciência para preencher os formulários exigidos. A idéia de Thaler é tornar automática a inscrição do trabalhador: só preencherá formulários, assim, se não quiser aderir.


Das moscas no urinol ao plano de previdência, há uma vasta diferença conceitual. Mas sua base é idêntica: a ‘mão invisível do mercado’ não basta para fazer com que tudo funcione.


E tampouco a ‘mão pesada da lei’ se mostra eficaz. Poderíamos imaginar multas e prisões para quem suja o banheiro; não teriam, com certeza, o mesmo resultado.


O método é ao mesmo tempo fascinante e assustador. Talvez aponte para uma forma de dominação política bastante diversa daquelas que conhecíamos até agora.


Força, repressão: foi este o principal meio de conseguir com que os seres humanos façam o que lhes mandam fazer. O Estado sempre teve como fundamento a ameaça e o exercício da violência.


Ao lado disso, não se negligenciou o papel das crenças, da religião, da propaganda. O indivíduo teme pelo próprio corpo e pela própria alma. E esse temor se dissolve quando imerso no oceano da coletividade, no corpo anônimo da massa, na alma unânime do grupo.


O liberalismo econômico talvez tenha pretendido, no limite, criar um outro sistema para conduzir o rebanho humano. Em vez de cânticos e chicotes, apostou num mecanismo indireto de recompensas e punições, teoricamente restritos à sua forma monetária: lucros, prejuízos, bonificações, multas.


O Estado, e a ideologia, tiveram mais de uma vez seu declínio previsto alegremente, com base nessa perspectiva liberal. A nova teoria do ‘empurrãozinho’ parece admitir o desacerto desse ponto de vista e investe em mecanismos novos de manipulação da sociedade.


Talvez correspondam à mudança tecnológica em curso. Já se disse que o poder de Hitler tinha relação direta com o uso do rádio. O ouvinte isolado, anônimo, e (pior ainda) desempregado, deixava-se mobilizar por aquele meio ‘cego’ de comunicação, entregando-se em seguida à visão espetacular da ordem uniformizada, do rosto do líder, dos desfiles, das olimpíadas e dos pogroms.


A TV trouxe passividade e conformismo. Estava tudo ali dentro de casa; ninguém precisava sair da sala para sentir-se parte do ‘Grande Todo’. Saía, é certo, para trabalhar e consumir. A publicidade foi o ‘empurrão’ por excelência do Ocidente, na segunda metade do século 20.


Nosso mundo, entretanto, é mais interativo e vai diminuindo cada vez mais as diferenças entre trabalho, lazer e consumo. Não que as pessoas deixem de trabalhar: mas um joguinho de computador não deixa de ser parecido com a jornada de um digitador de textos, de um controlador de trânsito, ou de um piloto de bombardeiro.


O segredo da mosquinha holandesa é ‘vender’ como entretenimento uma ação desejável socialmente. O próprio marketing, com a internet, usa cotidianamente de truques para misturar compra e diversão num mesmo clique.


Resumo rápido da história: no futuro ninguém fará xixi fora do penico. Quem estiver do lado das moscas que se cuide.’


 


 


 


TODA MÍDIA
Nelson de Sá


Doha, de novo


‘Mais uma longa entrevista de Celso Amorim, agora ao ‘Le Monde’, e o tema é o mesmo: ‘Resta uma pequena chance de concluir o ciclo de Doha’, no título aspeado. Descreve a chance como ‘intuição’ de Lula. Que não está sozinho, diz o jornal, no artigo ‘Lula e Pascal Lamy movem céu e Terra’.


Os dois tentar mover, em especial, a Índia. O francês presidente da OMC está em Nova Délhi e surgiu ontem no ‘Times of India’ dizendo que ‘a política está impedindo acordo’, enquanto o negociador indiano respondia no ‘Hindu’ prometendo ceder se baixar ‘o preço que os países em desenvolvimento teriam de pagar para os desenvolvidos cortarem subsídios’. No meio, Lula ligou ao primeiro-ministro Manmohan Singh para falar que deve ‘jogar tudo’ para Doha não morrer ‘na praia’. Ecoou por AP, Efe.


MAIS UMA CHANCE


Jorge Castañeda, em novo ensaio na ‘Foreign Affairs’ de setembro/outubro, que chega hoje às bancas, anuncia que é ‘Manhã na América Latina’ e, abaixo do título, alerta para ‘A chance de um novo começo’.


Diz que o futuro presidente dos EUA precisa enfrentar questões ‘críticas’ para se reaproximar: Cuba, imigração, comércio e as ‘duas esquerdas’. E não pode afastar aliados, como fez ao manter a tarifa sobre o etanol brasileiro.


Otimista, afirma que John McCain e Barack Obama têm ‘as melhores qualidades, em uma geração, para lidar com o melhor grupo de líderes progressistas, modernizantes e democráticos da história da América Latina’.


‘HARMONIA E O SONHO’


Sob o título acima, ontem no ‘New York Times’, o colunista conservador David Brooks escreveu o que parecia uma ode ao ‘coletivismo’ da China, expresso na cerimônia de abertura dos Jogos. Citou pesquisas científicas que provam como são diferentes os chineses e os americanos -cuja ‘mentalidade individualista’ garantiu décadas de domínio global. Arriscou que ‘a ascensão da China não é só um acontecimento econômico: é cultural’. E que o ideal de ‘um coletivo harmonioso’ pode agora se mostrar tão atrativo quanto ‘o sonho americano’.


Para encerrar, porém, ‘Com certeza, é uma ideologia útil para aspirantes a autocratas’.


AGORA, CLAQUE


Das pegadas falsas à dublagem por criança mais bonita, a cerimônia de abertura dos Jogos vai de mal a pior. E agora, diz a AP, autoridades chinesas e do Comitê Olímpico Internacional ‘admitem que algumas cadeiras vazias’ nos estádios vêm sendo preenchidas por ‘voluntários’.


CHINA VS. BRASIL


O ‘Diário do Povo’, do PC, apresentou o jogo de hoje ressaltando que a ‘China vai aprender com o Brasil’. Admite que, para os chineses, interessa menos seu país do que ‘ver o time cheio de estrelas’. E o treinador avisa que vai a campo só para ‘desenvolver nossos jogadores’.


CLIENTELA


Em comício via CNN, o presidente georgiano saudou John McCain. E logo o site TPM ligou a menção ao assessor do republicano que -até meses antes- atuava como lobista do governo georgiano em Washington


ONIPRESENÇA


‘NYT’ e outros noticiaram, com ampla repercussão na blogosfera de mídia, que a CNN mudou de ‘estratégia’ e, visando ‘dobrar sua presença nos EUA’, passa a contratar ‘jornalistas flexíveis’ e desvinculados de sucursais. Por flexíveis, entendam-se jornalistas com laptops, câmeras, produzindo para internet, televisão. A CNN quer ‘estar em toda parte e entrar ao vivo de toda parte’.’


 


 


TV PÚBLICA
Folha de S. Paulo


ADIADA A CRIAÇÃO DE CÓDIGO PARA A EBC


‘Sem consenso, o Conselho Curador da TV pública adiou a decisão de se criar um código de conduta para a EBC (Empresa Brasil de Comunicação), que incluía a idéia de vedar que funcionários da empresa fossem casados com integrantes do Poder Executivo. Em duas semanas, um estudo sobre possível código, abarcando questões éticas, deve ficar pronto. Hoje, usa-se o manual de jornalismo da Radiobrás.’


 


 


 


TELEVISÃO
Daniel Castro


Cultura vai cobrar de emissoras públicas


‘A TV Cultura passará a cobrar de emissoras públicas e privadas que retransmitem seus programas. Atualmente, cerca de 180 TVs do país fazem isso, incluindo a TV Brasil (federal), TVs públicas estaduais e TVs educativas privadas.


Essas emissoras retransmitem de graça programas como o ‘Roda Viva’, o ‘Viola Minha Viola’ e ‘Castelo Rá-Tim-Bum’. A cobrança pela cessão de programação, anunciada às parceiras na semana passada, já começa a gerar insatisfação. Confronta com o projeto da associação das TVs públicas de uma rede pública nacional.


Das TVs públicas, a Cultura vai pedir participação no orçamento anual, até o limite de 3%. Das privadas, quer participação na publicidade veiculada nos intervalos de seus programas.


A cobrança pelo conteúdo faz parte do projeto Cultura Canais, lançado anteontem na feira da ABTA. ‘A TV Cultura deixa de ser uma rede pública e passa a ser uma programadora de conteúdo’, afirma Cícero Feltrin, diretor de marketing e captação da Cultura. O executivo acha a cobrança justa. ‘Tem emissora pública com orçamento de R$ 15 milhões por ano que não produz nada, apenas reproduz a Cultura’, diz.


Feltrin ainda não tem estimativa de quanto a medida gerará em receitas. A TV Cultura deve contar com R$ 200 milhões neste ano. Menos da metade (40%) sairá dos cofres do governo do Estado.


DESPERTADOR


Tem muita gente acordando mais cedo para ver a Olimpíada. Ontem, uma transmissão de judô, das 5h08 às 5h19, deu seis pontos à Globo, o triplo do que a rede marca no horário.


DESABOU


As novelas da Record continuam descendo a ladeira do Ibope. ‘Chamas da Vida’, que estreou com 19 pontos em junho, fechou julho com 15,2 e marca 13,2 neste mês. ‘Os Mutantes’ segue a tendência.


RENOVAÇÃO


O conselho curador da Fundação Padre Anchieta aprovou anteontem quatro novos conselheiros e reconduziu outros três. Entre os novos, a jornalista e professora Esther Hamburger. Entre os que saem, a atriz Irene Ravache e o ex-ministro José Carlos Dias.


NOVELA AO VIVO 1


A correria é tanta nos bastidores de ‘A Favorita’, cujas gravações estão atrasadas, que a Globo tem exibido coisas impensáveis para quem se orgulha de ter um ‘Q de qualidade’.


NOVELA AO VIVO 2


No capítulo de anteontem, a colunista social Amelinha (Bel Kutner) foi ao aeroporto (Cumbica, pressupõe-se) receber uma celebridade que desembarcava. Mas apareceu na área de embarque, onde só entra quem vai viajar. E lá reconheceu a fugitiva Donatella (Claudia Raia).


NOVELA AO VIVO 3


Na sexta, Deborah Secco dividia o chuveiro com Cauã Reymond. Na cena seguinte, estava (vestida) com Iran Malfitano e seus pais. Depois, reapareceu aos afagos com Reymond.’


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O Estado de S. Paulo


Quarta-feira, 13 de agosto de 2008


PL 29
Cristina Padiglione


Regulamentação: Deputado questiona setor concentrado


‘Ao fim do painel sobre o Projeto de Lei 29, vulgo PL 29, ontem, na feira da Associação Brasileira de TV por Assinatura (ABTA), a discórdia sobre a imposição de cotas para produção nacional em canais pagos foi superada por outra questão: o empacotamento dos canais. Segundo a proposta, defendida pelo deputado Jorge Bittar (PT-RJ), ali presente, cada pacote terá de abrigar pelo menos 30% de emissoras de conteúdo nacional e, dessas, não mais que 25% poderão ser do mesmo grupo.


‘Entendo as razões do Alexandre Annenberg (presidente do setor), que defende os interesses da ABTA, de um mercado concentrado, de dois grupos (Net e Sky representam 78% do bolo)’, encerrou o deputado Bittar (PT-RJ). ‘Respeito esses dois grupos, mas quero mais’, concluiu.


Ao fim do painel, Annenberg disse que ‘de novo se perdeu muito tempo discutindo cotas’ (tema que ele próprio questionou no início do debate) e que o objetivo do setor ‘não é esse’. ‘Concordo com o Alexandre’, aproveitou Fernando Dias, ali representando as produtoras independentes. E emendou: ‘Então, a questão das cotas está resolvida, fica como está no projeto’.


Provocando Wagner


Ele não é o Pânico, mas tirou Wagner Moura do sério. O ator é o convidado de amanhã do Provocações, de Abujamra, que comemora oito anos no ar. O ator fala sobre sua carreira e da dificuldade de levar aos palcos um texto de Shakespeare. Às 23h40, na TV Cultura.


Entre-linhas


Osmar Prado e Nívea Maria serão Manu e Kochi, pais da protagonista Maya (Juliana Paes) em Caminho das Índias, próxima novela das 9 da Globo.


A Band anunciou na feira da ABTA o lançamento do canal adulto pago SexPrive Brasileirinhas. Entre as estrelas do canal estão Regininha Poltergeist e Leila Lopes.


O grupo Fox vai trazer ao Brasil o canal National Geographic em alta definição.


Já o Discovery anuncia a estréia de quatro produções nacionais para este ano: Soluções para o Trânsito (28 de setembro), Chico Mendes e Viver para Contar – títulos provisórios -, no Discovery Channel; além de Rio Ink, em outubro no People + Arts. Em 2009, Discovery Kids terá a animação Peixonauta.


A TVA terá em seu line-up o canal Playhouse, da Disney, para crianças de até 5 anos. E anuncia a aquisição do canal HBO HD.


A operadora promete para dezembro o lançamento da IPTV, TV digital interativa que permite navegação na web. Testes estão ocorrendo nos Jardins, onde a Telefonica faz o cabeamento em fibra ótica.


O Playhouse também está em negociação na NET, junto com outros canais como o Nick Jr. e o Telecine Pipoca 2.


O Telecine Pipoca 2 está prometido para o mês que vem. Terá a mesma programação do Pipoca, com delay (atraso) de horas a definir.’


 


 


 


OLIMPÍADAS DE PEQUIM
Roberto DaMatta


De novo as Olimpíadas


‘Com os jogos olímpicos chegam as questões que infestam a nossa consciência realista, que acredita em soluções definitivas e, pretendendo não ter recalques, é sempre perseguida pelos seus hóspedes não convidados. No caso o ‘político’, a ‘economia’ e o fato irrefutável que há países mais ricos e poderosos que outros. Num ensaio de 1987 (e retomado no livro A Bola Corre Mais Que os Homens), baseado nos Jogos Olímpicos de Los Angeles, de 1984, discuto essa dialética entre o coletivo e o individual, o mundial e o local que os jogos salientam.


Numa modernidade que ainda acasala mercado com políticos que ‘cuidam’ do povo; odeia a competição e o sucesso e ama a hierarquia, os jogos – como todas as experiências sociais baseadas na proposta de construir um mundo governado pelas normas esportivas – não escapam das acusações reducionistas pelas quais, lá no fundo, tudo (arte, religião e, agora, o esporte) serve a alguma outra coisa. De fato, não é muito fácil num planeta assolado por conflitos encontrar o tal ‘espírito olímpico’. Mas, como diria o Conselheiro Acácio, não é justamente para isso que existe essa metáfora idealizada na guerra, dramatizada pelos jogos?!


O espírito olímpico não fala de abrir mão da vontade de vencer. O seu é o de competir sem ser exclusivamente possuído pela vitória a qualquer preço. Na guerra ou no terrorismo, o único objetivo é destruir o inimigo. No esporte, porém, os adversários não podem ser eliminados. Ao contrário da guerra, o confronto esportivo demanda o respeito pelo outro para que a vitória, advinda da competição, possa se legitimar. Começar e terminar com o outro é o centro do esporte. Na guerra, ocorre justamente o oposto: um lado engloba e destrói o outro.


Esse ideal de preservar o adversário surge com força nos jogos. Neles, a presença explícita de respeitar as regras promove a consciência de um momento ideal a ser construído pelo esporte. Não fosse esse sonho, não estaríamos dizendo que tudo é, no fundo, grana ou poder!


Se as amizades podem ser vistas como ligadas a motivos secretos; se as preces mais lacrimosas estariam de fato seduzindo os deuses; quem foi que disse que o altruísmo esportivo realmente existe num sistema que, por meio do esporte, vende automóveis, bebidas e outras coisas ‘inocentes’ como, por exemplo, movimentos e regimes políticos?


No advento das olimpíadas modernas, em Berlim, em 1936, tentou-se colocar o esporte a serviço do Estado nazista. Ali aconteceu a primeira tentativa de contaminação direta do esportivo pelo político. O discurso de abertura de Adolf Hitler, no qual ele salientava que ‘o esporte alemão tem apenas uma tarefa: o fortalecimento do caráter do povo alemão’, e o filme Olympia, de Leni Riefenstahl são a prova viva da glorificação de uma perspectiva racista, numa competição capaz de revelar cabalmente a superioridade definitiva da ‘raça ariana’.


Mas o esporte, construído pelas improbabilidades da competição, arruinou o projeto totalitário. Jesse Owens, um atleta americano negro, parte de uma equipe de atletismo marcadamente negra para os padrões americanos da época, foi o grande herói olímpico, mostrando como tudo na vida social tem um lado oculto, imprevisto ou não planificado. Ele não somente ganhou quatro medalhas de ouro, mas estabeleceu um extraordinário recorde numa prova central de todos os jogos: a corrida dos 100 metros rasos. Owens era um dos sete filhos pobres de uma família de pretos nascidos no Alabama e criados em Cleveland, Ohio, numa América duramente segregada. Trabalhou como entregador e sapateiro, mas numa escola pública, teve a sorte encontrar um treinador sensível ao seu talento. Dedicado e devidamente treinado, esse menino que não podia entrar nos espaços excluídos para os negros de Ohio, tornou-se campeão nacional e mundial de corrida rasa e salto em distância.


Não fosse a universalidade do sistema escolar americano, ainda que realizada dentro do terrível regime do ‘iguais, mas separados’, Jesse Owens não teria sido descoberto. Não fosse a competição aberta, típica do mercado, sem cotas para negros, índios, marcianos ou brancos, ele não teria sido incluído no time olímpico; e se não fosse o espírito olímpico que manda competir ombro a ombro, igualitariamente, esse campeão não teria posto aquela pulga que até hoje incomoda os racistas e o sectários: o que conta mesmo é a competência; essa história de raça superior – esse papo de pai (e mãe) do povo; não passa de balela…


Mas ainda há uma última reviravolta. Owens, que na sua democrática América vivia confinado por leis raciais, pois só podia freqüentar restaurantes, banheiros, escolas e clubes reservados ‘para negros’, podia, na Berlim das hierárquicas nazistas e onde foi aclamado como herói olímpico, ir a restaurantes e bares durante os jogos! É claro que ele não foi cumprimentado por Hitler, mas tampouco foi recebido por Roosevelt, o presidente democrata do seu país!


Digam-me, caros leitores, onde é que existem coisas puras, a não ser nos nossos valores e ideais? Nas regras (e nos sonhos) que, eventualmente, governam nossas vidas. Essas receitas que, justamente por serem ideais – como o tal ‘espírito olímpico’ – têm que ser perseguidos em toda a disputa? Tanto quanto a sinceridade, o bom senso e a igualdade numa democracia?’


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