Saturday, 27 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Nada é tão ruim que não possa piorar

E é exatamente sob essa perspectiva que algumas emissoras começam a anunciar suas ‘novidades’ para a grade de programação do próximo ano. No que diz respeito à cobertura do universo de celebridades – esta doença que contaminou toda a mídia – mudanças anunciadas para o programa Vídeo Show e Fantástico (ambos da Rede Globo), antecipam que 2009 será mais um bom ano para celebridades no Brasil. E tudo o que já foi visto até agora será pouco, quando a maior emissora do país entrar na briga por uma fatia de um mercado que não conhece crise, ética ou bom senso.


Há muito tempo, astros e estrelas do cinema, teatro e televisão eram figuras quase míticas, de cuja vida particular pouco se sabia e quando algo escapava era um alvoroço que alimentava a imaginação e alma daqueles que viam em seus ídolos a possibilidade de fugir da realidade e sonhar com algo tão distante quanto a fama. Contudo, em tempos de glamorização da realidade, do estrelato instantâneo, há uma necessidade insaciável por mais e mais informações sobre a intimidade daqueles que cruzaram a fronteira do anonimato. As razões da fama, que iam do talento a um trabalho bem feito, bem estruturado, não mais importam. E muitas vezes o famoso quem? ganha mais espaço do que muita gente com lastro para ostentar o título de celebridade?


Sem nenhuma novidade


Existir acreditando não existir vida além de suas dimensões é uma das mais antigas estratégias da Rede Globo, que se propõe a entrar em um mercado que leva o significado de democracia ao limite: a mídia de celebridades não poupa nem exclui ninguém. Se for muito famoso ou pouco famoso, tem espaço. Se estiver tentando ser famoso ou achando que é, também. A idéia de recriar no Vídeo Show o que é feito pelo canal americano E!, mas centrado em seus contratados ou não contratados – aqueles globais prisioneiros de sua falta de coragem de buscar trabalho em outra emissora, eternamente à disposição da Rede Globo – significa que a emissora ainda não entendeu bem do que é feito este mercado. A Rede Globo, que monopolizou, além de outras coisas, o cinema e a divulgação de cinema no Brasil, agora pretende monopolizar também a fofoca.


Atualmente, a fofoca por si só é chata. Existe uma série de programas de televisão que vai, ao longo do dia, reproduzindo, incessantemente, as mesmas ‘notícias’. Foi-se o tempo da notícia em primeira mão, do furo de reportagem. Tempo em que ser celebridade era muito mais do que dar um passeio na praia, ir ao supermercado, jantar com amigos, estar no shopping, ter filhos – e como têm filhos – e toda a sorte de irrelevâncias que compõem este universo. Tudo feito por hábeis ‘assessores de impressa/empresários’ que recheiam as redações com as mais diversas notícias sobre seus contratados, vendendo-os como produtos em prateleiras, deixando clara a dependência que ambos têm um do outro – a mídia e a celebridade.


Mas como a Rede Globo, pretendendo fazer algo diferente do que vem sendo feito – em função de seu padrão de qualidade e centrada somente em seu elenco – vai conseguir reinventar a fofoca no Brasil? O certo é que será mais uma vez a Rede Globo falando do que mais a interessa: a Rede Globo. Sem nenhuma novidade!

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Crítica de TV, Brasília, DF