Monday, 29 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

As perspectivas do mercado de games

Durante a década de 2000, os setores envolvidos discutiram se a realização de jogos de computador deveria ou não ser tratada como um tópico inerente ao campo da comunicação. A conclusão foi que, por diversas razões, o assunto faz parte do rol de temas já associados ao audiovisual. Hoje, o debate é ultrapassado e o resultado parece óbvio: nesta Fase da Multiplicidade da Oferta, toda a criação de conteúdo simbólico-cultural é um problema relevante ao campo da comunicação, sejam as narrativas fechadas ou abertas, independentemente da rede de distribuição ou da plataforma de viabilização de consumo.

De fato, o Brasil produz games, conformando-os da mesma forma que desenvolve software em geral: ocupando uma posição secundária e claramente subdesenvolvida em relação aos grandes players do mercado global. Mais que isso: os jogos são criados de forma semelhante à da realização de filmes. A relativa competência na produção une-se a intensas dificuldades na distribuição. Esta discussão revela novas facetas de um velho problema. A receptividade do mercado interno é maior para os produtos importados e os custos de lançamento e distribuição no Brasil possuem taxas tributárias que excedem 100%.

Qualidade cada vez maior

Buscando sobrevivência neste insípido mercado brasileiro, as empresas têm associado-se a grandes grupos e produzido games, completos ou não, para publicadoras internacionais. Outros estúdios ainda procuram nos jogospara telefonia, de produção mais rápida e com menos custo, uma fonte rentável e mais acessível às organizações brasileiras, em geral pequenas. Há também os que investem na criação de produtos voltados para a educação e a publicidade. Em todos os caminhos, os empreendimentos deparam com a falta de fomento para o mercado nacional. A formação de profissionais especializados é recente e os cursos de Comunicação que atendem às produções digitais têm um número reduzido de formados.

Apesar das dificuldades, o momento pelo qual o mercado está passando não é dos piores. Segundo pesquisa da Associação Brasileira das Desenvolvedoras de Jogos Eletrônicos (Abragames), a partir de 2007 o setor retomou o crescimento no país. Parte desse avanço deve-se ao fato do Brasil, finalmente, ter a presença das principais corporações de consoles, Microsoft, Sony e Nintendo. A chegada destas gigantes movimentou o varejo e estimulou o crescimento das vendas. Enquanto a completa reestruturação do setor deva levar em torno de três anos, as companhias brasileiras seguem exportando parte significativa de suas produções.

As mudanças do setor também têm atingido os usuários: dados da holandesa Newzoo apontam que hoje o Brasil soma aproximadamente 35 milhões de jogadores. Estes usuários já não se interessam pelos games simples e pixelados de antigamente, na medida em que têm à disposição lançamentos com qualidade cada vez maior, em tempo cada vez menor. Os novos formatos estão crescentemente próximos dos audiovisuais conhecidos de longa data, seguem roteiros, possuem personagens com perfil elaborado e estão visualmente cada vez mais parecidos com cinema e televisão, contando até com o recurso da terceira dimensão (3D).

Desenvolver expertise

Hoje, o país contabiliza cerca de 40 iniciativas de desenvolvimento que, mesmo com os altos números da pirataria, tentam acompanhar as exigências ascendentes dos players e payers brasileiros. O resultado tem sido a aplicação da criatividade nacional em produções originais e bem conceituadas. A pernambucana Musigames teve seu jogo Drum´s Challenge entre os cinco mais vendidos na App Store norte-americana, em 2008. A Overplay, de São Paulo, negociou a criação de advergames com a InterActive Vision e, desde 2006, produz para a TV 2 dinamarquesa. No segmento de games educacionais, a Operação Cosmos, da paulista Redalgo, é usada para ensinar Física aos alunos da sexta série do ensino fundamental.

Com o mercado aquecido, inclusive pelo grande número de firmas trabalhando para a consolidação desta indústria no Brasil – e com os games assumindo uma posição dentro dos estudos comunicacionais –, o país encaminha-se para uma segunda etapa de questionamentos: sendo os jogos digitais realizações audiovisuais, quais as contribuições destes produtos para a comunicação contemporânea? É imprescindível entender como funciona esta comunicação de duas vias, que é relativamente nova. Ampliar as pesquisas próprias ao tema, para desenvolver uma expertise maior no assunto, é hoje um caminho necessário a ser trilhado.]

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[Valério Cruz Brittos e Jóice Geisiane Müller Oliveirasão, respectivamente, professor titular no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Unisinos e graduanda em Comunicação Social – Publicidade e Propaganda na mesma instituição]