Sunday, 28 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

A visita da blogueira

A blogueira cubana Yoani Sánchez ganhou fama internacional ao publicar na internet denúncias sobre violações de direitos humanos e críticas ao governo de seu país, que passou a lhe negar permissão para viagens ao exterior. A visita de Sánchez ao Brasil, enfim autorizada, despertou a fúria de setores da esquerda local. Os mais sectários chegam a ver nela uma ameaça ao que resta do regime cubano, a ponto de se sentirem compelidos a tentar calá-la com manifestações de truculência.

A revolução cubana incendiou a imaginação de intelectuais de esquerda na América Latina, a partir dos anos 1960, com suas conquistas sociais e seu antiamericanismo. Caiu nos braços da antiga União Soviética e se tornou uma ditadura, capitaneada durante meio século por Fidel Castro. Com a débâcle soviética, duas décadas depois, a ilha, submetida a bloqueio comercial dos EUA, perdeu os subsídios que a sustentavam. Mergulhou em grave crise. Yoani Sánchez chegou à idade adulta nesse período do regime castrista, que passou a conjugar a penúria material com o tradicional cardápio de repressão às liberdades, controle estatal da imprensa e perseguição a dissidentes.

Depois do declínio físico de Fidel e da transferência de poder para seu irmão Raúl Castro, Cuba se viu forçada a iniciar um processo de abertura política e econômica, que ora avança de forma lenta. Foi nesse contexto que a viagem de Sánchez – aliás, quase desconhecida em seu próprio país – atraiu tantas atenções. Ao reconhecer-lhe, enfim, o direito de ir e vir, a ditadura castrista parece agora engajada num esforço frenético de contrapropaganda. Estranha que o governo brasileiro – como sugere a presença de um funcionário da Presidência em reunião na embaixada de Cuba – se preste a ser associado com uma patética operação para atacar a imagem da visitante e intimidá-la.

Já houve, porém, precedente. Em 2007, o Brasil entregou ao regime dos irmãos Castro dois atletas que desertaram da delegação cubana nos Jogos Pan-Americanos do Rio. Aqui, ao contrário de Cuba, vive-se numa democracia. Todos são livres para viajar e opinar. Ninguém é obrigado a gostar de Yoani Sánchez nem de Fidel Castro.

Tais liberdades, no entanto, não autorizam o show de intolerância encenado em Feira de Santana (BA). Militantes do PT e do PCdoB têm o direito de protestar contra aquela que erigiram em esbirro do imperialismo, mas não de impedir a blogueira de falar nem de pôr em risco sua integridade física.