Monday, 29 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Direito humano à comunicação: um mundo, muitas vozes

A Câmara dos Deputados realizou nos dias 17 e 18 de agosto o Encontro Nacional de Direitos Humanos 2005, com o tema central ‘Direito humano à comunicação: um mundo, muitas vozes’. O evento foi promovido pelo Fórum de Entidades Nacionais de Direitos Humanos e pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados. O encontro foi encerrado após a aprovação da Carta de Brasília, reproduzida abaixo, produzida a partir dos debates e propostas que surgiram durante o evento.

Após dois dias de Encontro, em que nós, militantes, defensoras e defensores de direitos humanos, parlamentares comprometidas(os) com as causas populares, servidoras e servidores públicos de instituições federais, estaduais e municipais, compartilhamos experiências e produzimos subsídios para a formulação de políticas públicas destinadas a consagrar o direito à comunicação como direito humano fundamental e de fazer avançar a implementação do conjunto de direitos humanos; avaliamos o Encontro como um valioso momento de convergência e projeção de idéias para o planejamento e a construção de um sistema de comunicação livre e plural, que assegure a difusão das muitas vozes deste País.

Declaramos que:

1. A Comunicação é um direito humano que deve ser tratado no mesmo nível e grau de importância que os demais direitos humanos. O direito humano à comunicação incorpora a inalienável e fundamental liberdade de expressão e o direito à informação, ao acesso pleno e às condições de sua produção, e avança para compreender a garantia de diversidade e pluralidade de meios e conteúdos, a garantia de acesso eqüitativo às tecnologias da informação e da comunicação, a socialização do conhecimento a partir de um regime equilibrado que expresse a diversidade cultural, racial e sexual; além da participação da sociedade na definição de políticas públicas, tais como conselhos de comunicação, conferências nacionais e regionais e locais. A importância do direito humano à comunicação está ligada ao papel da comunicação na construção de identidades, subjetividades e do imaginário da população, bem como na conformação das relações de poder.

2. O direito de ter voz e de se fazer ouvir vincula-se à necessária existência de um sistema que viabilize o exercício da liberdade de expressão mediante o acesso à uma mídia livre e pluralista que faça distinção entre opinião e relato dos fatos; respeite e incorpore as diversidades étnicas, raciais, sexuais, culturais, regionais e das pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida; que atue na educação em direitos humanos e na difusão de informações sobre as questões políticas, sociais, econômicas e culturais de maneira veraz e ética, em processos institucionais que tenham efetiva participação da sociedade e controle social. O monopólio e o oligopólio em todas e em quaisquer partes dos ramos institucional e empresarial das comunicações é impedimento e barreira para o exercício desse direito humano.

3. É necessário o reconhecimento do racismo, sexismo, xenofobia, homofobia e lesbofobia, preconceito religioso e as outras formas de intolerância existentes na cultura brasileira, que se reproduz na mídia e nas instituições educacionais, para exigir mudanças radicais no estatuto das comunicações, na publicidade e nos instrumentos de difusão e educação. É imperiosa a presença efetiva, global e representativa da diversidade cultural e da riqueza intelectual e simbólica dos homens e das mulheres afrodescendentes e indígenas.

4. Verificamos que os direitos humanos ainda não estão considerados como base para a formulação das prioridades governamentais. E um conjunto significativo de atividades, ações e programas de direitos humanos essenciais para a sociedade não tem recebido prioridade na formulação do orçamento da União, nem estão incorporados na preocupação dos dirigentes governamentais.

5. Consideramos atentados aos direitos humanos e à dignidade humana os atos de corrupção, desvio de recursos públicos, má aplicação do orçamento e a alocação de 70% dos recursos da União para o pagamento do serviço da dívida pública. A corrupção retira recursos que poderiam estar salvando vidas, garantindo futuro melhor a crianças e adolescentes, alimentação saudável, segurança pública, educação universal, saúde, empregos e as reformas urbana e rural. O controle e a participação social, o acesso à comunicação, à informação e aos documentos, bem como o Estado laico são fundamentais para a construção de políticas públicas que efetivem direitos. A superação desse quadro requer a construção de um novo modelo econômico e político, pautado na promoção dos direitos humanos.

6. A sociedade brasileira terá em outubro a grande oportunidade para reafirmar o direito à vida, sinalizando, com o voto a favor do desarmamento, que o Brasil pode ter políticas públicas que privilegiem a paz e uma cultura de não-violência. São jovens, na maioria negros, que estão perdendo as vidas, assassinados com armas de fogo e pelo acesso fácil a armamentos e munições. Votamos Sim e conclamamos todos e todas a votarem em favor da vida.

7. O rebaixamento da condição institucional da Secretaria Especial de Direitos Humanos representa simbolicamente a falta de prioridade dos direitos humanos na agenda governamental e dificulta a articulação programática do órgão dentro do Poder Executivo. Apelamos ao presidente da República que reveja sua posição neste sentido e faça retornar a Subsecretaria de Direitos Humanos à sua condição política anterior.

8. Reafirmamos que é imprescindível a construção do Sistema Nacional de Direitos Humanos conforme deliberação da IX Conferência Nacional de Direitos Humanos, realizada em 2004. [Brasília, Câmara dos Deputados, 18 de agosto de 2005]