Tuesday, 30 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Carlos Chaparro

‘O XIS DA QUESTÃO – Nas entrevistas publicadas, o que o jornalista assina não são as revelações do entrevistado, mas o texto, do qual é autor, em que essas revelações ganham evidência, para os efeitos da socialização. Entretanto, o poder de autor não dá ao jornalista o direito de fraudar a conversa. O jornalista não é dono das falas, menos ainda das idéias e intenções dos seus entrevistados. Além disso, o conteúdo gerado na conversa com a fonte não pertence ao jornalista, mas à sociedade.

1. Caso inesquecível

Certa vez, já lá se vão quase vinte anos, fui entrevistado por uma repórter do Jornal da Tarde. Criativa, dona de texto gostoso, era profissional afeita a liberdades estilísticas, que então caíam bem no perfil do jornal. Por telefone, ela pediu a minha opinião sobre Chico Buarque, para uma reportagem que tentaria entender e explicar subjetividades nas relações entre a arte do grande compositor e seus admiradores. Me lembro bem do miolo da resposta. Para mim, a qualidade poética e musical de Chico se manifestava no fato de, quanto mais ouvia as suas músicas, mais elas me seduziam. A música e a poesia de Chico Buarque eram, para mim, artes de inesgotáveis revelações. A cada nova audição, sempre descobria, nas melhores músicas do Chico, novos e sutis encantos. Foi o que disse.

No dia seguinte, ao ler a reportagem, fiquei perplexo. Nada do que pensara e dissera estava no texto. Ao contrário: nas falas a mim atribuídas, a repórter inventara um monte de coisas que eu não dissera nem pensara. Liguei para ela. Em tom cordial (nos dávamos bem), perguntei o que acontecera. E ela me explicou que decidira fazer uma interpretação livre, na corrente de algumas idéias que a minha fala lhe sugerira. Viajara na fantasia e me levou junto.

Felizmente, não era assunto para gerar crises nem dissabores. E acabei achando graça do episódio. Decidi, até, tirar proveito dele, usando-o freqüentemente em sala de aula, como exemplo do que não deve nem pode ser feito pelo jornalista entrevistador, em sua relação com o entrevistado.

Jornalista não é dono das falas, menos ainda das idéias e intenções dos seus entrevistados. Até porque sobre o entrevistado recai o ônus das declarações publicadas, há que ser fiel ao que ele diz e, principalmente, ao que ele pensa – pois nem todos os entrevistados conseguem expressar com clareza e precisão o que pensam.

2. Trabalho de autor

O que se deu comigo, naquela entrevista dada ao Jornal da Tarde, acontece com um número surpreendente de pessoas entrevistadas. Parece, até, que a prática jornalística brasileira cultiva a crença de que o que se diz ao jornalista passa a ser propriedade sua, sobre a qual pode fazer o que quiser. Falam por isso os freqüentes desmentidos publicados, as queixas que rotineiramente ouvimos de fontes entrevistadas ou de seus assessores, e até o crescente número de ações judiciais que assolam as redações.

No seu dia-a-dia, o que o jornalista mais faz é conversar com outros. Faz perguntas, ouve, entende e registra respostas. Caça conteúdos, que não estão nas redações, mas nos espaços e fatos da vida, com os protagonistas da atualidade, construtores do presente. Depois, combina as revelações obtidas, para a arquitetura do texto, ação em que o jornalista tem de se assumir como autor.

Há por aí, em certas discussões intelectuais, quem considere que entrevistado e entrevistador dividem a autoria da entrevista publicada. Não concordo com esse entendimento. O que o jornalista assina não são as revelações do entrevistado, mas o texto, do qual é autor, em que essas revelações ganham evidência, para os efeitos da socialização.

Raros são os textos jornalísticos, quer em forma de relato ou de comentário, que não resultem de diálogos cúmplices com fontes. Às vezes – acredito que na maioria das vezes – isso se dá por acordo e cumplicidade; outras vezes, a conversa corre movida a conflito entre as duas partes. Em qualquer das situações, a construção das idéias é obra partilhada.

Mas, em especial na espécie ‘Entrevista’, uma coisa é o diálogo entre entrevistado e entrevistador, na conversa que se desdobra em jogos de cumplicidade; outra, o texto que reconstrói literariamente a conversa e que raramente a reproduz tal como ocorreu. No texto, há que excluir falas, incluir descrições, articular combinações que alteram a ordem da conversa. Há que decidir a que partes do conteúdo atribuir maior importância. E há que impor ritmo, beleza, intensidade e vigor literário ao texto – sem fraudar a conversa havida.

Tudo, tendo em vista um novo e preferencial interlocutor: o leitor.

3. O crime da fraude

Claro, há entrevistas em que convém respeitar a ordem e a forma em que as coisas foram ditas. Em alguns casos, devido à natureza política, científica, ética ou moral do conteúdo; em outros, pelo potencial de conseqüências do conteúdo a divulgar; às vezes, também, pelas significações que a notoriedade do entrevistado agrega às revelações. Porém, para a esmagadora maioria das entrevistas, a transcrição literal da conversa levaria ao fracasso, atingindo igualmente entrevistado e entrevistador. Quem grava entrevistas e encara o tormento de as transcrever sabe muito bem do que estou falando.

Entretanto, o poder de autor não dá ao jornalista o direito de fraudar a conversa. Por três motivos principais:

1) Fraudar no texto a conversa havida é enganar o leitor – efeito lamentável, se for por incompetência, pior ainda, se por motivos escusos.

2) No texto socializado, a fraude da conversa é a fraude do próprio jornalismo e o aviltamento da linguagem jornalística, que tem como essência de natureza o pressuposto da veracidade..

3) O conteúdo gerado na conversa não pertence ao jornalista, mas à sociedade.’



MÍDIA & MEIO AMBIENTE
Carlos Tautz

‘Tem cheiro e cor de jornalismo. Mas, é lobby

‘, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 3/03/05

‘‘É o domínio completo do ciclo da notícia.

O CIB [Conselho de Informações sobre Biotecnologia], financiado pelas gigantes Monsanto, Dupont do Brasil, Syngenta Seeds e Dow Agrosciences, bancou o livro que cantou o amor à transgenia, bancou a presença no lançamento em Curitiba do repórter da Gazeta Mercantil, e reproduziu a seguinte ‘notícia’ resultante, em seu próprio site.

Quem pode, pode’.

Recebi essa mensagem há pouco mais de uma semana de uma velha fonte de minhas matérias: o economista e tradutor David Hathaway, que nos anos 1980 produziu um aprofundado estudo sobre agrotóxicos no Brasil e desde aquela época vem se dedicando também a outros dois temas associados aos venenos agrícolas: patentes e commodities agrícolas modificadas geneticamente, os transgênicos.

Hoje um militante anti-transgênicos, David, em seu email, alertava para a matéria produzida pela Gazeta Mercantil (leia abaixo) e posteriormente distribuída pelo CIB, uma entidade mantida por indústrias de agrotóxicos e dos transgênicos a eles associados. O auto-declarado objetivo do CIB é disseminar informações sobre biotecnologia, mas essa organização nunca dá voz a cientistas que pedem mais pesquisas sobre eventuais impactos da engenharia genética na agricultura.

Pois, foi essa organização que financiou a realização da reportagem e a distribuiu. Ela é uma agência de lobby que atua sobre dois tipos de instituições estratégicas para qualquer nação, empresas de comunicação e universidade.

O lobby dos produtores de organismos genticamente modificados (OGMs) é particularmente perigoso nesse momento em que o Congresso aprovou à moda Severino Cavacalcanti uma nova lei de biossegurança que coloca no mesmo balaio assuntos tão díspares quanto células-tronco e OGMs. E, de outro lado, agrava-se uma crise financeira das empresas de comunicação que praticamente levou à morte da reportagem no Brasil, em especial na mídia impressa, e criou enormes dificuldades para o exercício minimamente independente do jornalismo, inclusive nessa área tão complexa como é a da engenharia genética.

Esse é um ambiente fértil para a repetição no Brasil de uma estratégia que vem dando muito certo na Argentina, Índia, Canadá, países africanos e Estados Unidos, onde a liberação da comercialização de produtos que contêm OGMs não passou por avaliações oficiais de impacto ambiental e de saúde dos consumidores. E esse detalhe é bom lembrar: não houve estudo de impacto de OGMs no meio ambiente nem mesmo nos EUA, a terra da Environmental Protection Agency, cuja imagem é vendida mundo afora como o paradigma de agência de regulação ambiental.

A estratégia do CIB combina financiamento do trabalho de cientistas que não encontram no meio universitário recursos para suas pesquisas com o provimento das informações produzidas por esses pesquisadores a jornalistas acessados pelas estratégias de lobby. Esses pesquisadores tornam-se então fontes em que o jornalista acessado deposita sua confiança acrítica.

Já no lado das empresas de comunicação, a falta de recursos materiais de pagamento de deslocamentos e diárias, por exemplo, facilita a aproximação de entidades como o CIB, que financiam viagens e fornecem informações a jornalistas, estritamente sob o viés que se adeqüe aos seus interesses estratégicos.

Ao cabo de tais operações, tem-se um texto que é produzido por um jornalista, com técnicas jornalísticas, publicado em veículo jornalístico, mas que não pode ser qualificado como uma notícia, um artigo, uma reportagem, uma crônica ou qualquer outro gênero jornalístico porque a ele faltam atributos elementares da produção e do compromisso social do jornalismo: equilíbrio entre pontos de vista divergentes e credibilidade.

Sai, no fim, um texto que tem cor e cheiro de jornalismo, mas que não é um texto jornalístico: é lobby, apenas.

Agora, a matéria publicada na Gazeta Mercantil:

Gazeta Mercantil, 24/02/2005, via CIB

Após 10 anos, sai cartilha sobre OGMs

Depois de quase dez anos cultivando soja transgênica, o Brasil finalmente terá um guia que explicará para o consumidor final o que são e para que servem os organismos geneticamente modificados (OGMs). Ontem, em Curitiba (PR), o Conselho de Informações sobre Biotecnologia (CIB) lançou o primeiro guia sobre transgênicos, com objetivo de esclarecer e organizar em um único material os principais temas sobre o assunto. Até agora, a entidade havia se concentrado apenas em publicações mais técnicas, direcionadas a especialistas no tema. Quando o CIB começou efetivamente a funcionar no Brasil, em 2002, o foco da entidade era falar para médicos, advogados, cientistas e nutricionistas.

A partir deste ano, decidimos direcionar as informações para o consumidor final e produtores finais para esclarecer qualquer dúvida e desmistificar idéias erradas que possam existir sobre o assunto transgenia, afirma Antonio Celso Villari, gerente de comunicação da entidade. A partir de sexta-feira, os primeiros 300 mil exemplares do guia começam a ser distribuídos para os consumidores, encartados nos principais jornais do País. O primeiro alvo, e não por acaso, será o estado do Paraná, principal foco de resistência ao plantio de transgênicos no Brasil.

A partir da próxima semana, o CIB passará a distribuir o guia em São Paulo, Mato Grosso e outros estados. Ainda estamos estruturando a estratégia logística de distribuição. Além dos consumidores, iremos encaminhar o material para médicos.

Esse é o primeiro guia que reúne tudo o que existe sobre transgênicos, com apoio e aval de cientistas, afirma Vinícius Carvalho, gerente técnico de biotecnologia do CIB. A estratégia da entidade é tentar não cometer o erro que a multinacional americana Monsanto teve ao imaginar que os transgênicos seriam discutidos apenas nos cenários acadêmico e agronômico. A própria empresa já reconheceu o erro e iniciou no ano passado uma campanha de marketing nos principais veículos de comunicação do Brasil, direcionada a consumidores, relacionando a imagem dos OGMs a um mundo ecologicamente melhor.

A Federação da Agricultura do Paraná (Faep), tem se mostrado favorável ao cultivo dos transgênicos no estado. Defendemos a posição de deixar o agricultor decidir o que ele julga ser mais interessante para ele. O que queremos, é levar a ele a informação mais precisa sobre o assunto, diz Livaldo Gemin, diretor-secretário da Faep.

No Paraná, dos 100 mil produtores rurais existentes, apenas 2,2 mil assinaram o termo de responsabilidade pelo cultivo de soja transgênica na atual safra. O número é duas vezes maior do que o registrado no ano anterior, mas permanece pequeno, segundo a Faep, pelo medo que os produtores têm de represálias do governo estadual.

Do ponto de vista legal, o estado não pode proibir que seus agricultores cultivem lavouras transgênicas, diz Patrícia Fukuma, advogada especialista em relações de consumo do CIB. Em sua opinião, existe uma lei federal que libera o cultivo da soja transgênica e uma medida estadual não pode desacatar uma lei federal. O Brasil é uma república federativa e os estados não podem ter suas próprias leis, diz a advogada.

Do ponto de vista econômico, os representantes dos agricultores que estiveram presentes no lançamento do guia, questionaram os especialistas sobre a viabilidade econômica da soja transgênica. Se o produtor está em uma região em que não há incidência de lagartas, por exemplo, não há necessidade de se pagar mais por uma semente de milho transgênica. Essa seria uma estratégia errada, afirma José Maria da Silveira, do Núcleo de Estudos Agrícolas (NEA), da Universidade de Campinas (Unicamp). (Alexandre Inacio – O repórter viajou a convite do Conselho de Informações sobre Biotecnologia (CIB)’.

(*) Jornalista’



DIRETÓRIO ACADÊMICO
Antonio Brasil

‘A crise no ensino de jornalismo’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 4/03/05

‘O ideograma chinês para ‘crise’ é a combinação de dois símbolos. Um significando ‘perigo’, o outro pode ser traduzido como ‘oportunidade’. Ou seja, apesar da crise, riscos e ameaças, podemos estar diante de uma grande oportunidade para melhorarmos o jornalismo e o ensino de jornalismo. Em vez da ênfase excessiva em teorias medíocres, no excesso de autocrítica ou autoflagelação, talvez pudéssemos aproveitar a oportunidade para buscarmos uma identidade para o jornalismo e para as escolas de jornalismo em nosso país.

Há alguns dias, participei de um dos encontros da AEJMC, Association for Education in Journalism and Mass Communication, (Associação para a Educação em Jornalismo e Comunicação) em Atlanta, na Geórgia. Guardadas as proporções, a AEJMC equivale ao nosso Fórum de Professores de Jornalismo. No entanto, a congênere americana foi fundada há 75 anos, possui cerca de 3.500 membros e participa de forma privilegiada nos debates sobre o futuro do jornalismo e do ensino de jornalismo nos EUA. Com certeza, um dia, o nosso Fórum de Professores de Jornalismo também terá uma representatividade e atuação semelhantes ou melhores do que a associação americana.

Há males…

Em um desses infindáveis seminários sobre a ‘crise’ que assola o jornalismo, ouvi um comentário que me deixou pensativo e, de certa forma, otimista. Em meio a intensas acusações e sinceros mea-culpas, um dos profissionais convidados perdeu a paciência e desafiou o público presente: ‘Tudo bem. Estamos em crise. Estamos no fundo do poço. Mas a verdade é que nenhuma outra indústria ou setor da sociedade tem se dedicado de forma tão aberta e profunda a apontar seus próprios defeitos, denunciar seus próprios pares e a buscar soluções transparentes para seus próprios problemas. Se nos compararmos com outros setores importantes da sociedade com os escândalos na indústria automobilística, farmacêutica ou nas grandes corporações, até que não estamos tão mal. Essas indústrias provocaram a morte de milhares de pessoas em todo o mundo e, nem por isso, conduziram auto-investigações de forma tão abertas e sistemáticas como o jornalismo. Erramos. Mas não ocultamos nossos erros. Apontamos os culpados e estamos buscando soluções.’

Pode ser que o colega americano tenha razão! E como dizia o meu velho pai em um misto de sabedoria e resignação: ‘É meu filho, mas há males que vêm para o bem!’

Crise no jornalismo. Crise no ensino

Mas se o jornalismo enfrenta uma de suas maiores crises de identidade e credibilidade, imaginem o reflexo dessa crise nas salas de aula. Como convencer os alunos da importância e relevância do jornalismo em meio a tantas denúncias de corrupção, fraudes e principalmente de tanta ‘incompetência’? A situação é difícil. Mas, talvez, também seja uma ótima oportunidade para reavaliarmos os nossos objetivos e repensarmos nosso futuro. O ensino de jornalismo pode e deve contribuir para a solução dessa crise com menos teoria e mais soluções.

Segundo o Prof. John Pavlik, uma das maiores autoridades no estudo de novas tecnologias, ‘o ensino de jornalismo ainda se baseia em modelos do final do século XIX e a maioria dos currículos das escolas de jornalismo segue as linhas tecnológicas do século XX .’ O problema é que já estamos no século XXI e o alunos de jornalismo, que não são bobos, percebem essa defasagem. A crise se torna inevitável.

Em minha opinião, a principal discussão sobre o ensino de jornalismo costuma estar centrado em premissas equivocadas. Ao invés de insistirmos em velhas armadilhas como a prioridade da teoria sobre a prática ou parâmetros subjetivos de qualidade, deveríamos desenvolver conceitos de ‘competência e criatividade.’ Ou seja, precisamos definir a identidade das escolas de jornalismo, seus objetivos e partir para soluções viáveis.

Nada contra discussões intermináveis ou sonhos irrealizáveis. Mas, é chegada a hora de enfrentarmos nossos problemas e experimentarmos novas idéias. Não temos problemas para ensinar ‘teoria’. A nossa dificuldade é ensinar essa tal prática jornalística nas universidades. Nossos laboratórios são precários e os professores não são preparados para ensinar a prática. Há um paradoxo persistente no ensino de jornalismo: afinal, como ensinar a prática? Por outro lado, as empresas de comunicação brasileiras não contribuem para o ensino. Ignoram seus problemas, criticam seus professores e desprezam seus projetos pedagógicos. Mas na hora de contratar seus profissionais não hesitam em privilegiar as boas instituições de ensino superior, principalmente as instituições públicas.

Jornalismo e ensino de guerrilha

Mas em vez de aceitarmos nossos males, deveríamos desenvolver soluções como conceito de ‘jornalismo ou ensino de guerrilha’. A idéia é enfrentar os perigos em busca da oportunidade. O conceito implica a possibilidade de experimentar e errar. O objetivo, no entanto, é ensinar jornalismo com o que temos e não com o que gostaríamos de ter. Um realismo pragmático voltado a um ensino mais competente de jornalismo.

Durante anos, conduzimos pesquisas experimentais sobre o ensino de jornalismo de TV utilizando o que tínhamos à nossa disposição na Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Se não tínhamos TVs universitárias de verdade, criávamos uma TVs universitária na Internet. As experiências pioneiras do projeto pedagógico da TV Uerj Online, a primeira TV universitária brasileira na Internet, garantiram prêmios e reconhecimento tanto no Brasil como no exterior. Essas pesquisas de natureza ‘prática’ contribuíram para o aprimoramento do ensino de jornalismo em nosso país. Ao invés de importarmos teorias ou práticas estrangeiras, criamos e exportamos soluções de ensino de jornalismo.

No mesmo encontro da Associação Americana dos Professores de Jornalismo e Comunicação, um dos avaliadores de projetos educacionais, Prof. Gordon Daniels, da Universidade do Alabama, destacou a importância do telejornalismo online brasileiro em seu relatório: ‘Wow! This idea of using Internet television as a teaching tool seems like a great idea. Looks like you’re on the bleeding edge of technology down at UERJ.’ (Uau! Essa idéia de utilizar a TV na Internet como uma ferramenta de ensino parece ser uma grande idéia. Parece que vocês na UERJ estão nos limites da tecnologia). TV na Internet é jornalismo e ensino de guerrilha, ou seja, lutamos com o que temos. Com um mínimo de recursos e um máximo de boa vontade podemos criar soluções criativas e viáveis para reinventarmos o jornalismo e o seu ensino.

A mediocridade dos cortes e recortes

Entre discussões tão desgastadas entre a predominância da teoria ou da prática ou conceitos subjetivos de qualidade, deveríamos desenvolver um conceito mais modesto de competência e honestidade tanto para o jornalismo quanto para o ensino da nossa profissão. Ou seja, deveríamos ter a humildade de avaliarmos os nossos processos e convocarmos a participação do público e dos alunos para alcançarmos soluções mais realistas para os nossos verdadeiros problemas. O futuro do jornalismo depende essencialmente do público e das futuras gerações de jornalistas. Tem professor de jornalismo que adora ‘recortes’. Para mim, a discussão da crise está totalmente fora de foco. Deveríamos nos concentrar menos nos ‘cortes e recortes’ e buscar soluções mais concretas para os nossos verdadeiros problemas.

Em termos de identidade, deveríamos aprimorar o modelo de ‘escolas de jornalismo’ no Brasil. A comunicação é campo importante e relevante. No entanto, é por demais amplo e indefinido. Em uma sociedade com ‘excesso’ de informação, o que ‘não’ é comunicação? O jornalismo e o ensino de jornalismo buscam identidade e autonomia.

Ensinar teoria é sempre mais fácil e econômico. Nada contra. Mas em nossas escolas de jornalismo, deveríamos dedicar menos tempo em teorias abstratas e mais tempo na busca de nossa identidade e mais recursos na pesquisa e no ensino do jornalismo.

Por outro lado, se os chineses confirmarem sua milenar sabedoria, essa ‘maldita’ crise, para nós jornalistas e professores, pode ser uma boa notícia. Apesar dos perigos, talvez estejamos diante de uma boa oportunidade para resolver nossos problemas.’