Saturday, 11 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1287

Daniel Castro e Elvira Lobato

‘Decreto assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva na última quinta-feira permite que quase todos os prefeitos do país requeiram um canal de televisão local em que poderão usar até uma hora e 12 minutos por dia para ‘a divulgação das atividades do Poder Executivo do Município’.

O decreto, publicado na sexta, está causando reações contrárias de Assembléias Legislativas e das redes comerciais de TV. As redes dizem que ele é ilegal e que cria uma moeda de troca política. Dizem também que esses canais serão usados para propaganda.

O ato de Lula criou a figura da retransmissora de TV institucional (RTVI). Serão canais outorgados a prefeituras municipais. Para tanto, bastarão aos prefeitos fazerem pedido ao Ministério das Comunicações e comprovarem a existência de canal vago na cidade -apenas São Paulo e Rio de Janeiro, segundo as redes, não têm mais espaço para novos canais.

Esses canais terão que retransmitir as TVs Câmara e Senado e da Radiobrás, hoje só no cabo. Mas poderão usar até 15% do tempo que ficarem no ar para a geração de programação local, sendo um terço para o Executivo, um terço para a Câmara e outro terço para ‘entidades representativas da comunidade’.

Isso significa que, para um canal que ficar 24 horas no ar, as prefeituras, câmaras e ‘comunidades’ poderão gerar até três horas e 36 minutos de programações locais.

De acordo com o decreto, o material das comunidades poderá ter patrocínio, na forma de apoio institucional. Um conselho, formado por representantes da prefeitura, da Câmara (‘assegurada a representação das diversas correntes partidárias’) e de moradores irá gerir a programação local.

Implantar um retransmissor custa cerca de R$ 100 mil, fora os gastos com produção e estúdios.

‘A televisão vai ser um instrumento político. Está se criando satrapias [o equivalente a capitanias hereditárias no Império Persa] para os prefeitos usarem como bem quiserem’, afirma Antonio Teles, vice-presidente da Band.

Teles diz que a criação desses canais é ilegal porque teria de ser feita por lei, não por decreto.

Assembléias

As Assembléias Legislativas que montaram canais de TV ficaram de fora do decreto. O presidente da Associação Brasileira de Televisões e Rádios Legislativas, Rodrigo Lucena, de Minas Gerais, disse que a medida só contempla o poder central e mistura interesses comerciais e institucionais. ‘Produziu-se uma lambança.’

Segundo Lucena, como o horário de retransmissão terá de ser compartilhado entre Senado, Câmara dos Deputados e Radiobrás, pelo menos parte da programação terá de ser editada antes de ir ao ar. ‘Com a edição, surge o risco de manipulação’, declarou.

Assembléias Legislativas de 17 Estados já criaram suas TVs legislativas e há outras cinco em fase de implantação. A programação gerada por elas é distribuída pelas redes de TV a cabo, em um canal compartilhado com as Câmaras Municipais. A TV da Assembléia Legislativa de São Paulo movimenta 60 funcionários e tem orçamento anual de R$ 6 milhões.

Segundo Lucena, a idéia do decreto nasceu de uma proposta do Senado e da Câmara, que queriam divulgar seus programas nacionalmente, sem arcar com o ônus da implantação das retransmissoras. ‘Esse decreto é um arranjo mal-feito’, declarou.

As assembléias querem a transformação das TVs em concessionárias do serviço televisão, para que a programação seja transmitida em sinal aberto. ‘Se o objetivo é dar transparência, a programação deve ser transmitida para o povão, e não apenas para os têm dinheiro para TV a cabo’, diz ele.’

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‘Conselho vai gerir conteúdo, diz ministério’, copyright Folha de S. Paulo, 24/02/05

‘O Ministério das Comunicações disse em nota que o serviço de retransmissão de TV institucional foi criado a partir de pedido expresso do Senado e que a minuta do decreto foi redigida por uma comissão formada com representantes das TVs Senado e Câmara e da Radiobrás.

A nota diz que a TV institucional não vai interferir no modelo de radiodifusão comercial nem propiciará o estabelecimento de novas redes privadas. O ministério enfatiza que um conselho representativo irá administrar o conteúdo do serviço.

O ministério afirma que serão baixadas normas complementares ao decreto, disciplinando a geração de programas e requisitos técnicos.

Procurada às 20h30, a assessoria de comunicação do Palácio do Planalto não se pronunciou sobre as acusações das TVs comerciais.’



Cristiana Nepomuceno

‘Eunício nega que decreto sobre repetidoras institucionais cria moeda política’, copyright Telecom Online, 24/02/05

‘O ministro das Comunicações, Eunício Oliveira, negou hoje, 24, que o decreto publicado na semana passada pela Presidência da República aprovando o Regulamento do Serviço de Retransmissão de Televisão (RTV) e do Serviço de Repetição de Televisão (RpTV), vá criar uma moeda de troca política entre o governo federal e as prefeituras. O decreto cria a figura da retransmissora de televisão institucional (RTVI) que irá transmitir a programação das TVs Câmara e Senado e da Radiobrás. Os canais de RTVI serão outorgados pelo Minicom, a partir de um pedido dos prefeitos. Se houver canal vago na cidade, o Minicom outorgará o canal sem licitação. Segundo Eunício, a elaboração do decreto foi um pedido do ex-presidente do Congresso senador José Sarney (PMDB-MA). O ministro explicou que ele apenas consolidou a legislação de radiodifusão existente. ‘Não será moeda de troca política. Foi uma discussão ampla com o Senado, Câmara e com a Radiobrás e a intenção era fazer a consolidação da legislação de forma a permitir que as prefeituras possam fazer a repetição. Acho que estão querendo colocar uma interpretação diferenciada’, afirmou. Hoje, o jornal Folha de São Paulo publicou matéria na qual emissoras de TV comerciais afirmam que o decreto vai abrir espaço para negociatas políticas entre os prefeitos e o governo federal. Eunício afirmou que as RTVIs não serão emissoras comerciais e nem disputarão mercado com as TVs abertas, mas explicou que as atividades dos municípios, como as sessões das Câmaras de Vereadores, também poderão ser transmitidas pelas RTVIs. ‘É legítimo que a comunidade local possa repetir as atividades da Câmara Legislativa, por exemplo, e transmita o conteúdo gerado localmente’, argumentou o ministro.’



Mônica Tavares

‘Decreto que dá espaço na TV para prefeitos é criticado’, copyright O Globo, 27/02/05

‘Um decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva publicado no último dia 17 com as novas normas do Serviço de Retransmissão e Repetição de Televisão (RTV) está sendo questionado pelo setor. O decreto cria a Retransmissora de TV Institucional, que além de distribuir a programação da TV Senado, da TV Câmara e da Radiobrás, permitirá que as prefeituras de todo o país também tenham a produção institucional veiculada nesses canais. Isto representará 5% da programação total transmitida por estes canais.

Para Abert, razão do decreto parece subjetiva

Para o presidente da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), José Inácio Pizani, o decreto cria um novo tipo de televisão. Até agora, a radiodifusão contava com TVs comerciais e educativas (fundações). Ele disse que este é um novo formato agregado ao poder público municipal. Na próxima semana, os associados da Abert deverão se reunir para discutir os efeitos do novo serviço para o setor e qual atitude deverão tomar.

– Não fomos consultados, pegou de surpresa o setor. A nova TV terá influência no modelo da radiodifusão brasileira. Abre campo para todo tipo de especulação. Estamos tentando entender a quem interessa o novo modelo do setor. A razão do decreto parece subjetiva – afirmou Pizani.

O entendimento inicial do setor é de que o novo tipo de TV não pode ser criado por decreto, só por lei. Pizani tem dúvidas de como será feita a fiscalização das emissoras em um país com mais de 5 mil municípios. Ele afirmou que hoje o governo não consegue nem fiscalizar as rádios comunitárias e piratas.

Uma das preocupações é de que a nova TV tire anunciantes das emissoras de TV, que são 240 em todo o Brasil, e que concorra com as mais de 2 mil rádios locais. E terá uma implicação financeira nas emissoras. Pizani citou como exemplo as cidades pequenas, com 20 a 30 mil habitantes. Para ele, se a prefeitura chamar o comércio local para financiar a programação, as emissoras comerciais perderão seus anunciantes.

O ministro das Comunicações, Eunício Oliveira, disse que o decreto, proposto pelo ministério sobre as novas normas de RTV, apenas consolidou a legislação existente. Ele afirmou que as retransmissoras institucionais não são comerciais e não podem vender espaços:

– Acho que estão querendo dar uma interpretação diferenciada. O decreto apenas consolida a legislação existente.

‘Não será moeda de troca política’, diz ministro

A inovação do decreto, segundo nota da assessoria do ministério, é que foi criada a RTV Institucional, a partir de um pedido do Senado, por seu então presidente senador José Sarney (PMDB-AP). Também discutiram os termos do decreto a Câmara e a Radiobrás, que poderão retransmitir o conteúdo pela RTV.

– Não será moeda de troca política porque não houve modificação na forma como é feita (a autorização) no ministério – disse o ministro.’