Tuesday, 07 de May de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1286

Folha de S. Paulo

REGULAÇÃO
Ranier Bragon e Maria Clara Cabral

Congresso vai reativar conselho de comunicação

Enquanto alguns Estados estudam implantar conselhos para monitorar a mídia, o Congresso Nacional se prepara para reativar o Conselho de Comunicação Social, órgão previsto desde 1988, mas que só funcionou por pouco tempo, de 2002 a 2006.

No recesso de julho, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), despachou cartas a dezenas de entidades anunciando a medida, e 21 delas já indicaram nomes para compor o órgão.

A função do conselho é auxiliar o Congresso em assuntos relativos à comunicação -como liberdade de expressão, outorga e renovação de concessões, programação da televisão e propaganda de cigarros e bebidas.

Diferentemente dos conselhos em gestação em Estados como o Ceará, o do Congresso não traz entre suas atribuições a tarefa de monitoramento ou de fiscalização dos meios de comunicação. Trata-se de um órgão consultivo, e não deliberativo, e está previsto na Constituição.

ENTIDADES

As iniciativas estaduais (estimuladas pela Conferência Nacional de Comunicação, realizada em 2009 por convocação do governo Lula) foram criticadas pelas associações das empresas de comunicação e pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), sob o argumento de que há tentativa de restrição da liberdade de imprensa.

Já em relação ao conselho do Congresso, entidades ouvidas pela Folha se manifestaram favoravelmente.

‘O Conselho de Comunicação Social previsto constitucional e legalmente é o federal. Os eventuais conselhos estaduais são criações de natureza eminentemente política e não terão eficácia’, diz Paulo Tonet Camargo, diretor de Relações Governamentais da ANJ (Associação Nacional de Jornais).

O diretor-geral da Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão), Luís Roberto Antonik, diz que a iniciativa do Congresso serve ‘para colocar as coisas nos devidos lugares’ em relação às iniciativas estaduais, que classifica de um ‘tremendo retrocesso’.

‘A nossa expectativa é que ele [conselho] possa ajudar com propostas e colaborações significativas, sendo um órgão democrático. No caso das Assembleias é diferente. Eles podem tomar providências que não sabemos aonde vão parar’, disse Roberto Muylaert, presidente da Aner (Associação Nacional dos Editores de Revistas).

COMPOSIÇÃO

O Conselho de Comunicação Social do Congresso será composto por 13 pessoas eleitas pelos congressistas a partir da lista de indicados: quatro serão ligadas às entidades empresariais da mídia, quatro a órgãos sindicais como a Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas), e cinco para representantes da sociedade civil.

O Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação diz que o conselho do Congresso é uma oportunidade de a sociedade participar do debate sobre a comunicação, que estaria ‘muito monopolizada’ no Brasil.

 

ELEIÇÃO 2010
Fernanda Torres

Propaganda e marketing

JAMAIS COMPREENDI o direcionamento populista do marketing de José Serra.

No primeiro turno, levei um choque quando assisti a uma cena em que o candidato do PSDB se sentava no sofá de uma senhora singela para ouvi-la falar a respeito de um problema de saúde no olho.

‘Depois desse olho, a senhora perdeu o outro olho?’ Perguntava ele. A enferma, então, ameaçava chorar e Serra abraçava-a com dó, pedindo que não se emocionasse porque, senão, ele se emocionaria junto.

Só faltou o violino cigano.

Um especialista em linguagem do corpo afirmou, logo no início do primeiro turno, que o tucano passava a ideia de que sabia do que estava falando, mas não se importava com o próximo.

Talvez opiniões como essas tenham-no levado a gravar cenas tão lacrimosas.

Quando Marina deu o segundo turno de presente para a oposição, achei que o populismo seria deixado de lado em prol de uma mensagem mais adulta e objetiva.

Ledo engano.

Serra continuou exalando bondade enquanto abria seu programa de forma sensacionalista, demonizando Dilma e rebatendo com o mesmo dólar furado as acusações de entreguismo feitas ao governo FHC pelo PT.

O público percebe quando está sendo tratado como criança.

Há duas semanas, recebi por e-mail um depoimento contundente postado por Hélio Bicudo via internet. Nele, o bacharel em direito e fundador do PT chamava a atenção para os exageros partidários de Lula, para a ameaça à liberdade de expressão e pedia que a população, por meio de seu voto, se posicionasse contra um partido que coloca seus interesses acima dos da nação.

O time de Serra devia ter poupado o trabalho e transmitido as palavras de Bicudo no ar, em looping, no horário eleitoral.

A equipe de Dilma também fez a caveira dos tucanos, mostrou sua candidata visitando casebres, brincando com o cachorro e conversando com desamparados, mas sempre como pano de fundo.

O grande trunfo do programa do PT -além da luz caprichada, do custo superior e do auxílio luxuoso de Lula- foi uma entrevista extremamente bem produzida em que a candidata petista se dirigia a um arguidor oculto.

Editada de Dilma para a própria Dilma, a peça publicitária lhe dava tempo de exprimir suas ideias sem sofrer com o que parece ser uma dislexia verbal que apresenta em público, de pausar sem que parecesse branco, de não ser agressiva como exigem os debates nem sorridente ‘pede voto’.

A impressão de intimidade, criada com a longa conversa e os silêncios para reflexão, destacava a personalidade grave de Dilma e a ajudava a formar uma imagem de serenidade digna de um presidente.

Em um ano, a ex-ministra foi maternal, severa, irritável, boa, beata, vítima, algoz, seguiu o norte das pesquisas e, perseverante, enfrentou a via crucis eleitoral como poucas vezes se viu na história deste país.

Se as previsões se confirmarem nesta noite de domingo, depois de tantas metamorfoses ambulantes, talvez a própria Dilma descubra com o eleitorado quem é a mulher que hoje se torna presidente.

 

INTERNET
Grazielle Schneider

Empresas espiam rivais com rede social

O foco principal ainda é o relacionamento com seus clientes. Mas as empresas brasileiras já descobriram outros usos para as redes sociais -como a possibilidade de monitorar a concorrência.

O LinkedIn é uma das redes com o maior potencial nesse sentido, segundo Alessandro Barbosa Lima, presidente da consultoria E.Life, de mídias sociais. Isso porque a ferramenta registra as contratações e a movimentação das empresas.

‘Se o concorrente contratou um grande número de pessoas na América Latina, por exemplo, provavelmente ele está com uma estratégia para aquele mercado’, diz.

Maurício Bichara, gerente de divisão de internet do Banco do Brasil, afirma que o ‘benchmarking’ (identificação de referenciais de excelência) feito antes nos canais presenciais alcançará também as redes sociais.

‘Temos ferramentas [de monitoração] e pesquisamos as ‘hash tags’ [símbolo do jogo da velha que indica um assunto no Twitter] que têm a ver, como nomes dos bancos, até para ver o que é que está acontecendo’, explica.

Outro uso das redes sociais valioso para as empresas é a prospecção de clientes. Em junho, o Banco do Brasil realizou a primeira venda no Brasil via web 2.0.

A equipe do banco que monitora a rede captou um usuário no microblog, não correntista, com interesse em contratar um seguro de viagem. Após entrar em contato, o banco fechou a venda.

‘O @BBSeguros deu um show. Contratei um seguro para minha viagem através do Twitter sem sair de casa, com um atendimento espetacular. Parabéns’, tuitou o cliente à época.

Já o Santander tem um canal de educação financeira no YouTube e uma página no Formspring (de perguntas e respostas), que usa para verificar as demandas dos consumidores e adequar os seus produtos a elas.

‘Esses canais servem para tirarmos as dúvidas e compartilharmos o que achamos que é melhor para esse cliente naquele momento’, afirma Fernando Martins, vice-presidente-executivo de marca, marketing e comunicação corporativa do banco.

INTELIGÊNCIA

Para Lima, a inteligência das multidões é outro ponto a ser considerado, mas que as empresas ainda não aprenderam a utilizar.

‘É preciso capturar um pouquinho da inteligência que os clientes trazem quando interagem para melhorar os produtos’, afirma Fábio Cipriani, consultor em mídias sociais da Deloitte.

A Camiseteria, que confecciona camisetas, é um exemplo de uso da interação. O site da empresa tem um concurso permanente em que os próprios usuários enviam sugestões de estampas e votam nas melhores. As mais votadas são premiadas e depois vendidas.

‘Há cerca de três lançamentos semanais e não temos uma equipe de criação, temos usuários muito criativos, isso sim’, diz Fábio Seixas, um dos sócios.

 

Medo de crítica trava marketing na rede

As empresas ainda estão muito mais ‘gritando’ nas mídias sociais do que trazendo algo significativo de volta para os consumidores.

A afirmação é de Fábio Cipriani, gerente responsável pela consultoria em mídias sociais da Deloitte.

‘Eles gritam, a gente reage, e eles não reagem de volta’, diz. E completa: ‘Se vai fazer o diálogo, faça bem-feito, traga valor para o cliente. Quando ele acha uma porta aberta, ele vai reclamar, ele vai perguntar, e, se a empresa estiver ali só fazendo marketing, não vai estar preparada para responder’.

Joyce Jane, presidente do iDigo, Núcleo de Inteligência Digital, usa a analogia de um casamento para explicar o diálogo entre empresas e consumidores nas redes.

‘Se uma das pessoas quer conversar, e a outra não quer, a chance de que a quer conversar encontrar outra pessoa disposta é grande. Se o seu consumidor quer falar com você, e você não quer falar com ele, provavelmente uma outra empresa vai estar aberta, vai receber melhor esse consumidor e tem uma grande chance de ele trocar você’, diz.

JOGO DOS ERROS

Para Jane, as empresas cometem dois grandes erros nas redes sociais. O primeiro deles é não entrar por temer que as reclamações tenham mais visibilidade.

‘Se a empresa não está na rede porque acha que tem problemas, provavelmente as pessoas já estão falando dela. E estão falando mal’, aponta Jane, que destaca ainda que, se a companhia não está monitorando, não sabe o que é falado sobre ela.

‘Por não saber, ela não está tentando reverter esse quadro e não está tentando melhorar o relacionamento com as pessoas. Logo, provavelmente, ela está perdendo clientes’, conclui.

O segundo erro é entrar somente porque está na moda.

‘[Uma rede social] exige dedicação, alimentação em tempo real, investimento. Não adianta entrar porque está se sentindo pressionada por outras empresas que estão lá. Vai ser só um canal para gastar dinheiro e desgastar sua imagem’, afirma.

Quando decide de fato que é hora de investir nesses canais de relacionamento, a companhia deve definir estratégias. Jane diz que é preciso entender o formato, a linguagem e o público-alvo de cada uma das redes.

COM QUE ROUPA?

O não conhecimento de uma rede pode levar a experiências desagradáveis para a empresa.

‘Cada canal tem uma característica e é frequentado por um tipo de pessoa, é preciso entender o ecossistema de onde a empresa está para que possa se enquadrar na forma mais eficaz de se comunicar’, diz.

‘Não adianta você usar a mesma roupa pra ir a todos os lugares. Você troca de roupa de acordo com o ambiente em que você está, na internet é a mesma coisa.’

Alessandro Barbosa Lima, presidente da consultoria E.Life, de mídias sociais, compara as redes sociais a uma avenida movimentada em que todos querem pôr um outdoor.

‘A ação não pode ser monodirecional: ‘Isso aqui é uma avenida movimentada, deixa eu fazer um barulhinho aqui para ver se espalha’. Precisa ter o sentido de ‘deixa eu conversar com as pessoas, me relacionar e me conectar com elas’ por relação de confiança mútua.’

 

TELEVISÃO
Keila Jimenez

Quem se arrisca a substituir a patroa do ‘Superpop’?

A dois meses de sair em férias e emendar com uma licença-maternidade, Luciana Gimenez não conta quem indicará para substituí-la no ‘Superpop’, da RedeTV! Grávida de cinco meses de outro menino -ela já é mãe de Lucas, filho do cantor Mick Jagger-, a apresentadora acompanha de perto a escolha da interina, já morta de ciúmes de quem vai tomar conta do seu ‘filhote’ na TV.

Folha – Quem vai substituí-la no programa? Luciana Gimenez – Não sei ainda, vamos fazer testes.

Quando sairá de licença?

Em dezembro, saio de férias, e o meu filho nasce no início de março. Aí emendo mais uns meses. Eu não aguento muito tempo fora. Acho que volto três meses depois de o bebê nascer.

Isso é ciúme do ‘Superpop?’

(risos) Ah, eu tenho ciúmes sim. E o ‘Superpop’ parece um programa fácil, mas é difícil. Vai tudo bem até cair um holofote… (risos)

Tem medo de que a substituta dê certo?

(risos) Quero mais é que dê certo, não posso torcer contra. Se derrubar a audiência, fica difícil depois para mim.

Vai aguentar ver na TV outra gritando: ‘Boa Noiteee’!

Ah não, ela vai ter de inventar outra coisa.

Vão te substituir ao lado do Marcelo (Carvalho, vice-presidente da Rede TV! e marido de Luciana) no ‘Mega Senha’?

Não…O programa é por temporada, dá para esperar.

É verdade que seu marido apresenta o programa em cima de um banquinho?

(risos) Sou mesmo mais alta, mas combinamos de eu fazer o programa sem salto nenhum. Ele fica em cima de um degrauzinho. Coisa pouca, de uns três centímetros. Não tem banquinho não (risos).

Por que você demorou para anunciar a gravidez?

Já tínhamos desencanado. Até onde eu sabia, o Marcelo era estéril, os outros filhos dele foram por inseminação. Nem acreditei quando descobri que estava grávida.

Você está mais magra nessa gravidez do que na outra?

Só eu sei o tamanho que estou. O pior é o inchaço. Hoje fiquei em pé duas horas gravando sem meia-calça e agora não sei o que é tornozelo e o que é joelho (risos). Há dois tipos de grávidas: as que engordam e as magrinhas, só com a barriga. Eu sou do primeiro tipo. É genético, minha filha. Não tem tratamento, regime… É a vida. (risos).

AVESSO

Acostumados a fugir de vilãs, anunciantes fazem fila atrás de Mariana Ximenes, a Clara, de ‘Passione’, que emplacou nova campanha de esmaltes

Parece, mas… Sem turistas suíços de plantão com suas câmeras, várias emissoras de TV passaram a semana enganando o telespectador. Para retratar o recente tsunami que causou destruição na Indonésia, usaram, à exaustão, imagens das ondas gigantes que atingiram várias países da Ásia em 2004. Detalhe: não avisaram que se tratava de imagens antigas e, muitas vezes, narraram a notícia atual com as cenas da tragédia passada ao fundo. Só faltou o logo de ‘ao vivo’ no alto da tela para completar o vale-tudo pela audiência.

Contagem Faltam seis anos. Mas a Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão) promete intervir por um prazo maior caso empresários e consumidores não consigam entrar na era da TV digital até 2016, prazo em que se encerram as transmissões analógicas no Brasil. ‘A TV digital tem crescido rápido e creio que as emissoras estarão prontas quando 2016 chegar’, disse Luís Roberto Antonik, diretor da Abert. ‘Minha preocupação é com os consumidores. Esses sim, como foi nos EUA, devem exigir uma extensão do prazo.’

 

Laura Mattos

Odete Não Morreu

Odete Roitman marcou a sua passagem de volta ao Brasil para 10 de novembro.

Nesta data será exibido o 29º capítulo da reprise de ‘Vale Tudo’, em que a grande vilã aparece na história.

Transmitida de maio de 1988 a janeiro de 1989, a novela foi um marco da TV ao denunciar a corrupção no Brasil e mobilizar telespectadores com a pergunta ‘Quem matou Odete Roitman?’.

A reapresentação vai ar no Viva, canal pago da Globosat que faz sucesso com programas antigos da TV Globo.

A volta de Odete Roitman, 22 anos depois, será comemorada com festa, na vida real, por André Fischer, diretor do portal GLS Mix Brasil.

Desde que ‘Vale Tudo’ entrou no ar, no início do mês, ele está ‘enlouquecido’. Deixa baladas para chegar em casa antes da 0h45, quando o capítulo começa. ‘Se vou dormir cedo, coloco o despertador para esse horário.’

Na primeira semana, a reprise levou o Viva à liderança do Ibope da TV paga. No horário alternativo, ao meio-dia, só perde para os infantis.

O número de seguidores do Twitter do canal triplicou, e a novela se tornou um dos assuntos mais comentados na internet. Telespectadores-internautas, gays em especial, falam de tudo em tempo real, de ombreira e cabelos repicados a gírias como ‘eu transo bem um fogão’.

Tanto sucesso surpreendeu até Letícia Muhana, diretora do Viva. ‘Tínhamos pesquisas apontando que o público queria programas da década de 80 para trás. Escolhemos ‘Vale Tudo’ porque foi marcante, mas nos espantamos com esse tsunami.’

Às pressas, dois departamentos se mobilizaram. O comercial criou cotas de patrocínio para a novela, a pedido de anunciantes. E o jurídico se arma contra a pirataria dos capítulos na internet.

Essa é a segunda vez que ‘Vale Tudo’ é reprisada. A primeira foi em 92, no ‘Vale a Pena Ver de Novo’. Mas dois fatores tornam a reapresentação atual mais badalada.

‘Quatro anos foi um tempo curto, havia uma ressaca da novela, que foi avassaladora. E hoje há as redes sociais da internet, fundamentais para esse sucesso.’

O momento político do Brasil de hoje também faz de ‘Vale Tudo’, produzida antes do impeachment de Collor, uma novela atual, para Renato Janine Ribeiro, professor de ética e filosofia política da USP. ‘É lamentável constatar que, após 22 anos, a discussão política não evoluiu. Nessa campanha eleitoral, em vez de propostas, só se falou de corrupção’, diz.

Outra diferença crucial é que, na primeira reprise, a novela sofreu cortes, e nesta está integral. ‘Respeitamos até os blocos e não vamos tirar nem merchandisings’, afirma a diretora do Viva.

Isso acaba com o bafafá de internautas de que Odete Roitman, na reprise, poderia ser morta por outra pessoa, uma vez que, na época, a Globo fez cinco finais diferentes.

Gilberto Braga, autor da novela em parceria com Aguinaldo Silva e Leonor Bassères, também sepulta a hipótese. ‘Nem me lembro quais foram os outros finais. E, com toda a certeza, as fitas foram apagadas’, afirmou.

Odete pode até ter ressuscitado. Mas a mesma personagem de 1989 vai mandá-la de volta para o inferno.

 

Cristina Grillo

‘Novela é feita para vender sabonete’

Às vésperas de completar 65 anos -seu aniversário é amanhã- Gilberto Braga se prepara para entrar, mais uma vez, em período quase monástico.

O autor de obras que se tornaram ícones da dramaturgia nacional, como o megassucesso ‘Vale Tudo’ (1988) -que, reprisado pelo canal pago Viva, vem batendo recordes de audiência-, estreia nova trama em janeiro.

‘Insensato Coração’ vai substituir ‘Passione’ na Globo, às 21h. Por enquanto, Braga consegue manter a rotina, com sessões de musculação e passeios de bicicleta pela zona sul carioca, onde mora, mas, em janeiro, entrará em isolamento total. ‘Não vivo, só trabalho.’

Enquanto isso, ele revê trechos de ‘Vale Tudo’, que paralisou o país há 22 anos em torno da pergunta: ‘Quem matou Odete Roitman?’.

O sucesso da reapresentação não o surpreende. ‘É natural. A novela é boa’, diz. O fato de ser a maior audiência da TV paga no momento, sim. ‘Há excelentes programas na TV paga e, afinal de contas, é uma reprise.’

O escritor não gosta de falar sobre temas políticos. ‘O fato de meu trabalho me dar tanta visibilidade não faz com que minha opinião tenha relevância. Sou um escritor de ficção’, afirma.

Mas dá sua avaliação sobre o Brasil. ‘Acho tudo caótico. Desde que nasci, só não senti isso no governo Juscelino [Kubitschek, presidente entre 1956 e 1961]. O país é realmente complicado.’

MACHISMO

‘Vale Tudo’ não é, no entanto, seu trabalho favorito. Da carreira iniciada em 1973 e que inclui obras como ‘Escrava Isaura’ (1976) e ‘Dancin’ Days’ (1978), ele prefere as minisséries ‘Anos Dourados’ (1986) e ‘Anos Rebeldes’ (1992).

Nem tampouco seu vilão favorito é Maria de Fátima Accioli, a carreirista interpretada por Glória Pires, ou a milionária Odete Roitman (Beatriz Segall), autora de frases como ‘O Brasil é um país de jecas. Ninguém aqui sabe usar talher de peixe’.

Braga prefere Felipe Barreto (Antonio Fagundes), o inescrupuloso cirurgião de ‘O Dono do Mundo’ (1991), que, por conta de uma aposta, tira a virgindade da noiva de um de seus empregados.

‘Achei que estava criando um monstro repugnante, mas o público ficou do lado dele’, relembra. Grupos de discussão, recurso usado pela TV Globo para avaliar programas entre telespectadores, apontavam a mocinha, a professora Márcia (Malu Mader), como ‘uma galinha’, enquanto Felipe Barreto estava ‘cumprindo seu papel’.

‘Foi a reação de uma sociedade machista’, avalia o autor. Por ironia do destino, outra professorinha, a Helena da novela ‘Carrossel’, exibida pelo SBT, começou a arrancar nacos da audiência de ‘O Dono do Mundo’.

A trama foi mudada. Arrependido, o vilão se transformou em um médico bondoso. ‘Corrigir foi muito complicado. Escrevi quase toda a novela deprimido’, diz. ‘Novela é feita para vender sabonete. A ação é interrompida a cada dez minutos para os comerciais. É diferente de um romance.’

Braga, no entanto, defende que os trabalhos escritos para a TV são obras literárias -apresentou esse ponto de vista na Academia Brasileira de Letras e foi aplaudido. O autor diz não se sentir incomodado com alguns setores intelectuais que os consideram um subproduto cultural.

‘Todos têm o direito de pensar o que quiserem. Se alguns intelectuais soubessem o que eu penso das obras deles acho que iam ficar aborrecidos’, afirma.

NOVO VILÃO

Felipe Barreto pode perder o posto de vilão favorito para um personagem, em fase de criação. ‘É possível que o de Fábio Assunção, em ‘Insensato Coração’ o supere’, diz.

A trama, escrita com Ricardo Linhares, já trouxe uma dor de cabeça para o autor.

Escalada para um dos principais papéis da trama, a atriz Ana Paula Arósio foi afastada por faltar às gravações, e substituída por Paola Oliveira. Braga não quer falar sobre o assunto.

 

Tales A. M. AB’Sáber

De monstro, Maria de Fátima vira símbolo positivo

Gilberto Braga se inscreveu profundamente na tradição narrativa brasileira sobre a estranheza a ser nomeada de nossa sociedade incivil e incompleta, se nos basearmos por parâmetros modernos para as coisas públicas.

Trabalhando com formas populares de cultura média clássicas, como o folhetim e o melodrama, de fato explorou as possibilidades do gênero da telenovela, do qual é o grande inventor moderno.

Discípulo de Janete Clair, seus primeiros trabalhos foram adaptações de ‘A Escrava Isaura’, de Bernardo Guimarães; ‘Helena’, de Machado de Assis; e ‘Senhora’, de José de Alencar.

Pode-se intuir aí uma espécie de formação. A matéria social brasileira e sua possibilidade de formatação ficcional está sendo perscrutada em profundidade. Saberá operar de modo raro o grande poder adquirido no sistema da indústria televisiva a partir de ‘A Escrava Isaura’.

Não será por acaso que ele dará o próprio salto mortal -mais ou menos como ocorreu com Machado de Assis-, na esfera da cultura de massas de ‘Vale Tudo’ vai passar a olhar o Brasil do ponto de vista radical da elite beneficiária da vida nacional então estagnada, que operava com liberdade cínica e violência sistemática a sua relação com uma classe média ambígua sobre a ordem de exploração e descompromisso do grande dinheiro por aqui.

PERSONAGEM

A novela brasileira finalmente estava à altura da história. Apanhou no ar, no fim dos anos, como o país e os seus senhores se preparavam para substituir o poder autoritário da ditadura militar, de formatação antiga, pelo neopoder desrecalcado do dinheiro, operando nova clivagem entre espertos e perdedores, agora de roupagem neoliberal, que só confirmava o Brasil como para-nação, inconsistente como projeto, para não dizer inviável.

Gilberto Braga é o único dramaturgo da TV brasileira que pode ter no Brasil o seu personagem, e conseguiu se sair bem na empreitada limite, ao observar a vida do ponto de vista do todo, e não do fragmento mítico ou jocoso, como a ideologia pós-moderna de então propunha.

A sua enésima redescoberta atual, que confirma o poder de fogo de uma forma que se aproxima da arte, porta novas surpresas: hoje, em um contexto histórico muito diferente, são jovens gays que se interessam pelo caráter a-moral, politicamente incorreto e de tintas fortes das divas trashs e más, mas socialmente muito bem determinadas de ‘Vale Tudo’.

Se, quando vimos a novela pela primeira vez, Maria de Fátima era um monstro de arrivismo, cinismo e maquiavelismo pragmático, que rompia com o circuito melodramático e decoroso de sua mãe e classe para ter acesso ao grand monde do dinheiro, hoje é um símbolo positivo para jovens que, na ausência de esperança maior na cultura e na política, e de modo irônico, em um novo humor maledicente e camp, simplesmente assumem, de modo fantástico, como certa vez ouvi de um amigo: ‘Eu quero ser a Maria de Fátima’.

Ainda nos resta aguardar a redescoberta da segunda obra prima de Braga, ‘O Dono do Mundo’.

TALES A. M. AB’SÁBER é professor de filosofia da psicanálise na Unifesp

 

Fernanda Ezabella

Série retrata mundo tomado por zumbis

Vampiros, cuidado! Os zumbis chegaram à TV. Estreia hoje, Dia das Bruxas nos EUA, uma das séries mais aguardadas do ano, ‘The Walking Dead’ (Os mortos-vivos), baseada numa popular história em quadrinhos publicada desde 2003.

O seriado tem estreia mundial em outros países, incluindo Brasil, na terça-feira.

A história segue a vida de sobreviventes após o mundo ser invadido por zumbis. O protagonista, o policial Rick Grimes (Andrew Lincoln), tenta manter o grupo unido e cuidar de sua família.

‘Quando as pessoas comprarem a caixa de DVDs da primeira temporada, vai ser como um filme de seis horas’, disse à Folha o criador da HQ e roteirista da série, Robert Kirkman.

Frank Darabont, produtor-executivo da série, a ser transmitida nos EUA pelo mesmo canal de ‘Mad Men’, diz que a principal influência é George Romero, papa dos zumbis, diretor de ‘A Noite dos Mortos-Vivos’ (1968).

Apesar das influências e do terror, os atores comentam que os zumbis são apenas um detalhe da trama.

‘Não é uma coisa de gênero. Fazemos cenas de amor e outras mais políticas sobre como gerir o acampamento [de sobreviventes]’, disse Andrew Lincoln, para jornalistas em San Diego.

Ele é britânico e disfarça bem sotaque. Também conta que perdeu mais de quatro quilos em duas semanas gravando cenas de ação em Atlanta, onde ruas foram fechadas para as filmagens no primeiro semestre, que teve até tanque de guerra.

‘Os zumbis, para mim, podem representar qualquer coisa, a paranoia, o consumismo, medos internos’, diz Lincoln. ‘Fica a pergunta sobre quem é mais perigoso: zumbi ou humano.’

MAQUIAGEM

Como na HQ, não há explicação para o fim do mundo. Ambos começam com Grimes acordando sozinho num hospital abandonado para partir em busca da família, enquanto se dá conta do apocalipse pelas ruas. Mas nem tudo é como no gibi.

‘Haverá momentos importantes dos quadrinhos, mas não quero que seja tudo igual, tem surpresa’, disse Kirkman, premiado neste ano na Comic-Con.

Por episódio, aparecem entre 30 e 40 zumbis. São necessários oito maquiadores e uma hora para cada um preparar toda a turma, conta Greg Nicotero, supervisor de efeitos de maquiagem, que trabalhou com Romero em alguns filmes do gênero.

O resultado final é retocado no computador, como as mosquinhas que voam em volta dos monstrengos, um detalhe dos quadrinhos.

‘Romero criou as regras. Se entrar um zumbi agora nesta sala, você sabe como matá-lo’, disse Nicotero à Folha. ‘Se um dia eles conseguirem fazer um zumbi sexy [como fizeram com os vampiros], eu me mato!’

 

Lúcia Valentim Rodrigues

‘Law & Order’ lança versão em Los Angeles

A nave-mãe naufragou.

Após 20 anos no ar, ‘Law & Order’ foi cancelada pela emissora NBC, deixando para ‘Os Simpsons’ o recorde de série mais longeva da TV.

Os fãs não tiveram motivos para abstinência. A franquia ‘Law & Order: Criminal Intent’ está no nono ano. ‘Special Victims Unit’, sobre crimes sexuais, estreia a 12ª temporada em 9 de novembro, no Universal Channel.

Mas, em 23 de novembro, o canal pago lança a primeira versão que vai sair de Nova York com trama própria.

O derivado do Reino Unido, já na segunda temporada, apenas refaz episódios do original. ‘Lá é o mesmo roteiro. Só adicionam gírias e perucas’, se diverte René Balcer, produtor-executivo de ‘Law & Order: Los Angeles’.

‘Muita gente vai ser atraída pela marca. Depois de superarem a raiva de terem cancelado o original, vão se interessar pelas histórias fortes, pelas atuações e pela própria repetição da série’, conta, por telefone.

Balcer também foi pego de surpresa com o fim do original. Mas diz que ainda tinha histórias para contar.

‘Essa franquia não existiria se a ‘mãe de todos’ estivesse aí. Há uma capacidade máxima de quantas repetições os americanos podem aguentar de ‘Law & Order’.

Acho que três é o máximo.’

O seriado aborda, na primeira parte, uma investigação de assassinato. Com provas para montar um processo e um ou mais suspeitos em custódia, começa a segunda metade, com o julgamento.

Na nova série, os episódios vão ter o nome da região de Los Angeles em que o crime vai se passar. O criador, Dick Wolf, disse à imprensa americana, que ‘o primeiro episódio foi deliberado’.

‘Não vamos falar de Hollywood toda semana, mas era o melhor jeito de apresentar o programa e mostrar que era bem diferente do anterior.’

Não foi o capítulo que mais agradou. O segundo episódio teve 26% mais audiência do que a estreia e mais de 8 milhões de espectadores.

As tramas podem revisitar discussões. ‘Há, por exemplo, o julgamento de um terrorista e uma polêmica sobre a construção de uma mesquita, que também funcionam bem aqui. Já um episódio envolvendo um pedestre não rolaria em Los Angeles.’

NA TV

Law & Order: Los Angeles

Estreia da primeira temporada

QUANDO dia 23 de novembro, às 22h, no Universal Channel

CLASSIFICAÇÃO 14 anos

 

Cristina Fibe

Esquadrão da Moda’ ri dos malvestidos

Eles comentam a roupa da repórter, completam as frases um do outro, riem de suas ‘vítimas’ ao mesmo tempo em que se preocupam com a ‘mudança efetiva’ dos ‘sem estilo’ que andam por aí.

Stacy London e Clinton Kelly, apresentadores da edição americana do ‘Esquadrão da Moda’, receberam a Folha em seu estúdio, em Nova York, para falar sobre o programa que transforma o visual de quem é ‘denunciado’ por amigos e familiares.

Até a oitava temporada, que está sendo filmada agora, apenas quatro malvestidas se recusaram a se submeter aos conselhos mordazes de Stacy e Clinton.

Uma fugiu da cidade quando soube que havia sido filmada às escondidas.

‘Ela começou a xingar, saiu correndo pela casa…’, conta Clinton. ‘…trancou-se no armário…’, completa Stacy. ‘…ameaçou ligar para a polícia…’, diz ele. ‘…e falar que estava sendo sequestrada.

Amamos ela! E aí saiu da cidade. Nunca mais ouvimos falar dela. Esse foi o pior ‘não’, conclui Stacy.

Uma outra pediu permissão do terapeuta para participar. ‘Ele disse que não seria produtivo’, lembra a apresentadora, aos risos.

Mas a maioria concorda em receber US$ 5 mil (cerca de R$ 8,5 mil) para trocar o guarda-roupa seguindo os conselhos deles. Nem sempre a ‘intervenção’ funciona, porém. Em alguns casos, a mudança não é ‘duradoura’ como gostariam.

‘Não é que falhamos quando alguém entra no nosso estúdio, porque aqui temos muito mais controle do que elas vestem. Quando vão embora, é outra história’, afirma Stacy.

‘E elas não estão vindo atrás da gente para dizer: ‘Quero mudar’. São os amigos e a família que estão dizendo que ela precisa’, pondera Clinton. ‘Elas estão dizendo: ‘Que diabos aconteceu?’, diverte-se Stacy.

‘As pessoas afirmam o tempo todo: ‘Não deveríamos ser julgados pelo que vestimos’. Num mundo mágico, talvez não, mas há estudos que mostram que nos aproximamos das pessoas com base no visual’, afirma o consultor. ‘Somos julgadores, e você precisa controlar a mensagem que transmite.’

NA TV

Esquadrão da Moda

Novos episódios da 5ª temporada

QUANDO a partir de quarta (3/11), às 23h, no Discovery Home & Health

CLASSIFICAÇÃO 12 anos

 

Vanessa Barbara

TV Chimpanzé

NO ÚLTIMO dia 18, às 23h, o canal Animal Planet exibiu com exclusividade o primeiro filme rodado por chimpanzés (‘TV Chimpanzé’).

A estreia dos bonobos na indústria cinematográfica foi patrocinada pela BBC e viabilizada pela cientista comportamental Betsy Herrelko, que, na tentativa de descobrir o que se passa na mente dos chimpanzés, decidiu fornecer-lhes o material e o embasamento tecnológico para produzirem seus próprios vídeos caseiros.

Betsy escolheu 11 chimpanzés residentes no zoológico de Edimburgo, no Reino Unido. Passou 18 meses ensinando-os a mexer em telas touchscreen e a assistir à TV sem esperar recompensa -tarefa difícil, pois os macacos não só possuem maior inteligência do que nós, que aceitamos qualquer porcaria, como preferem interagir com a tela e dar socos raivosos em franca manifestação de desagrado à programação.

Ainda assim, os primatas abraçaram a carreira de cineastas.

Sem terem recebido noções prévias de foco, enquadramento, contra-plongée, iluminação e roteiro, os membros da equipe ganharam uma caixa vermelha resistente (à prova de chimpanzés) com uma câmera digital dentro. No topo da caixa havia uma tela para que eles pudessem acompanhar o que estava sendo filmado.

O resultado foi um curta experimental claramente influenciado pelo Dogma 95, em que predominam os closes de narinas, a exibição de gengivas, os gritos simiescos e alguns ‘travellings’ arriscados. Nenhum ser humano foi maltratado durante as filmagens.

Assistir à promissora TV Chimpanzé foi como acompanhar o trabalho da genial tartaruga cineasta do Caribe, que estreou na direção quando um mergulhador perdeu sua câmera subaquática em Aruba, em novembro de 2009. Dois meses depois, a tartaruga marinha encontrou o objeto em Honduras, tentou comê-lo e acidentalmente apertou o botão de gravar.

Ela nadou enroscada ao aparelho e produziu um belíssimo curta oceânico, em que suas próprias nadadeiras são vistas de relance, junto a cardumes de peixes, raios de sol e uma cor de água absurdamente azul. (YouTube: ‘Sea turtle finds lost camera’).

Nos minutos finais, ela enjoa da atividade, larga a câmera e sai boiando em sua majestosa queloneidade, decerto rumo a Hollywood.

 

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