Sunday, 28 de April de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1285

Ivan Claudio

‘Com seu nome enfeixado num letreiro idêntico àquele que exibe a palavra Hollywood em letras monumentais, o Reino de Tão Tão Distante é uma réplica medieval da meca do cinema. Pelas ruas de seu bairro chique sucedem-se lojas de grifes famosas, devidamente parodiadas, e mansões nababescas semelhantes às dos grandes astros do cinema. Só que agora, em vez de Nicole Kidman ou Catherine Zeta-Jones, os moradores famosos se chamam Cinderela, Branca de Neve, Rapunzel. É para lá que, a contragosto, se dirige Shrek e sua mulher, a princesa Fiona, levando a tiracolo o Burro falador. Eles são personagens de Shrek 2 (Shrek 2, Estados Unidos, 2004), novo episódio do imbatível desenho animado da DreamWorks SKG, em cartaz nacional na sexta-feira 18.

Agora, o adorável ogro – voz de Mike Myers na versão americana e de Bussunda, na brasileira – sai do seu pântano favorito com a missão de conhecer os pais da noiva. Mas o Rei Harold e a Rainha Lillian obviamente não esperavam encontrar, no lugar do imaginado nobre valente, uma figura verde, desprovida de boas maneiras e dada a crises de flatulência. Para piorar a vida de Shrek, a neurótica Fada Madrinha, uma viciada em fast-food, não se revela exatamente boazinha. Mãe do almofadinha Príncipe Encantado, que está de olho no dote da princesa, ela recorre a todas as suas poções mágicas para tirar o ogro da jogada.

Seguindo o mesmo estilo das divertidas paródias dos tradicionais contos de fada, Shrek 2 tem tudo para satisfazer os fãs ao redor do mundo, mesmo sem os recursos tão imaginativos do primeiro desenho. Nos Estados Unidos, em apenas 18 dias em cartaz atingiu a marca dos US$ 300 milhões, quebrando o recorde anterior de Homem-aranha, que levou 22 dias para atingir a mesma cifra. Em entrevista por telefone a ISTOÉ, o produtor Jeffrey Katzenberg – que divide com Steven Spielberg e David Geffen as iniciais do estúdio Dreamworks SKG – minimizou os esforços da companhia de emplacar Shrek 2 como o mais bem-sucedido desenho animado desde O Rei Leão. ‘Fazemos os filmes apostando no melhor e procurando fazer o melhor que pudermos. Mas o surpreendente na produção de filmes é que a gente nunca sabe no que vai dar.’

Além das 72 cenas individuais a mais, este novo Shrek vem recheado de atrativos. A começar pela presença do personagem Gato de Botas – dublagem de Antonio Banderas -, um felino de cor laranja e charme de mosqueteiro, cujo sotaque espanholado não esconde as lições de esgrima com o mexicano Zorro. ‘Ele foi pensado para ser francês, uma espécie de D’Artagnan, mas se transformou quando cheguei com o meu sotaque’, disse Banderas. O charme do personagem vai além. Toda vez que Gato de Botas se vê em dificuldades, ele abaixa as orelhinhas e umedece os olhos negros e arredondados, desarmando qualquer mortal. Por estas qualidades, foi contratado pelo Rei Howard para dar cabo em Shrek. Mas o bichano acaba virando escudeiro do ogro, não sem enfrentar os ciúmes de Burro (dublado por Eddie Murphy), que o recebe com uma patada. ‘A vaga de animal falante já foi ocupada.’ Ao final, já amigos, os dois fazem um impagável dueto de Livin’ la vida loca, de Ricky Martin.

Shrek 2 também melhorou na parte técnica. Por um sistema inédito desenvolvido pela DreamWorks SKG, chamado bounce shader, a luz do filme se distribui com incrível realismo, especialmente nas cenas interiores. Katzenberg, que anuncia para o fim de 2006 Shrek 3, ainda chama a atenção para outras conquistas da animação digital. ‘É incrível quando você observa a textura da pele dos personagens e como eles atuam. Se considerarmos que Shrek 2 foi feito com apenas três anos de diferença do primeiro, temos a medida de como as ferramentas estão se tornando cada vez mais poderosas.’

Trilha sonora – O melhor do desenho animado, contudo, é o humor repleto de citações pop, mais endereçado ao público adulto que ao infantil. Quando Rei Harold, por exemplo, encapuzado vai contratar os serviços do Gato de Botas na Taverna da Maçã Envenenada, é recebido pela masculinizada barwoman Irmã Feia, que na versão original tem a voz do apresentador Larry King e na brasileira, de Pedro Bial. Ao piano, Capitão Gancho toca Little drop of poison, de Tom Waits. A trilha sonora, aliás, também é cheia de referências, como quando Shrek, Burro e Gato de Botas escolhem a taverna para curtir uma fossa e são brindados com People ain’t no good, de Nick Cave, outro partidário do som deprê. ‘Odeio segundas-feiras’, desabafa Gato de Botas com seu copo de bebida ao balcão.

O que dizer então de Pinóquio, que, depois de aparecer usando roupa íntima feminina e de realizar o sonho de ser uma criança de verdade, dança no melhor estilo Michael Jackson? Divertidíssimo.’



Beatriz Velloso

‘O ogro ri por último’, copyright Época, 14/06/04

‘O ogro Shrek tem fama de mal-humorado, mas no fundo é uma simpatia. Seu melhor amigo é o Burro, que de burro não tem (quase) nada. E a DreamWorks é a produtora de animação gráfica responsável pelos dois personagens virtuais. A empresa tem um sonho no nome, mas está mais concreta e real do que nunca. O novo lançamento da companhia fundada em 1994 por Steven Spielberg, Jeffrey Katzenberg e David Geffen, Shrek 2, estréia no Brasil na sexta-feira 18, em 300 salas – quase um terço do circuito nacional. É um dos maiores recordistas de bilheteria da História: foi o filme a atingir mais rapidamente a mítica marca dos US$ 300 milhões e, há menos de um mês em cartaz, já ultrapassa os US$ 320 milhões. Vai superar com facilidade o primeiro filme da série, lançado em 2001 e que garantiu US$ 455 milhões à DreamWorks. Não é à toa que os executivos planejam abrir o capital da empresa na bolsa de valores de Nova York, prevêem mais lucro pela frente. E não é à toa que o personagem faz sucesso. O primeiro filme era ótimo, e o segundo não perde o rebolado.

Shrek 2 não tem, é certo, o gosto de novidade do longa-metragem anterior. Mas o roteirista J. David Stem e os diretores Andrew Adamson e Kelly Asbury compensam a desvantagem ampliando o foco das piadas. Se no filme original o alvo foi a Disney e seus desenhos fofos pontuados por musiquinhas meigas, desta vez a vítima é Hollywood como um todo. Shrek e a princesa Fiona, agora casados, estão felizes em seu pântano quando chega a notícia de que os pais dela, um rei e uma rainha normais (e não ogros), querem conhecer o marido da filha. Muito a contragosto, Shrek parte com a mulher para o Reino Tão Tão Distante – uma troça escrachada a Beverly Hills, com suas lojas caras e festas badaladas freqüentadas por estrelas que chegam sob os flashes das câmeras. Shrek é mal recebido pelo sogro, os dois batem boca e Fiona recorre a Fada Madrinha para resolver o imbróglio familiar. Mas a fada revela-se uma interesseira, cujo verdadeiro objetivo é empurrar seu filho (o Príncipe Encantado) para a princesa e garantir o domínio do reino.

Uma das melhores novidades de Shrek 2 é o Gato de Botas, novo amigo do ogro que vai ajudá-lo a driblar as tramóias da Fada Madrinha. Dublado por Antonio Banderas na versão em inglês, o bichano é uma divertida paródia dos personagens latinos e galantes que o ator espanhol costuma fazer no cinema. Além de Banderas, a versão original continua com as vozes de Mike Myers (Shrek), Eddie Murphy (Burro) e Cameron Diaz (Fiona). E ganhou ainda John Cleese e Julie Andrews, como o rei e a rainha, Rupert Everett, como o Príncipe Encantado, e até o jornalista Larry King, como a Irmã Feia – uma espécie de travesti (isso mesmo) que faz uma ‘ponta’ no filme. Na versão dublada, Bussunda permanece no posto de Shrek e Pedro Bial faz a Irmã Feia.

Além das brincadeiras com Hollywood e do tal travesti, há citações a filmes como Homem-Aranha, O Senhor dos Anéis e até clássicos como A Um Passo da Eternidade ou A Primeira Noite de um Homem. Muitas dessas piadas são humor para adultos – o que pode suscitar dúvidas sobre o apelo que o filme tem entre as crianças. O produtor Jeffrey Katzenberg garante que todo o mundo gosta e ri, não importa a idade. Os números monstruosos fazem crer que ele está certo.’